Como serão as relações do Trabalho pós COVID 19?
* Frederico Melo é membro do Grupo Relações Trabalhistas Brasil . O presente artigo reflete a sua opinião pessoal

Como serão as relações do Trabalho pós COVID 19?

Por Frederico Toledo Melo em junho 2020

Desde que a internet passou a ser usual no mundo do trabalho, as mudanças ocorrem em ritmo frenético, em especial neste momento de pandemia. A área de relações do trabalho passa por um período singular, temos que aproveitar para vivencia-lo, aprender e crescer, visto que mar manso nunca fez bom marinheiro. 

A mudança de comportamento, competências e experiência dos empregados e gestores são impressionantes. Atualmente, empresas lidam com três ou quatro gerações de empregados dentro do mesmo time, o que dificulta a criação de padrões, uma vez que cada geração tem incutida sua forma mais eficaz de assimilação.

Nesse sentido, o desafio tem sido provocar os empregados a entender a metodologia dos outros funcionários e criar linguagem que seja não só acessível, mas de fácil absorção a todos. 

Antes mesmo do COVID 19, havia no mundo uma discussão sobre as mudanças, quais seriam as habilidades do futuro, como o homem interagiria com máquinas cada vez mais independente.

Perguntas como: quais habilidades a máquina não será capaz de imitar ou superar o ser humano? Por quanto tempo? Que empregos desaparecerão? Quais surgiram? O modelo de aprendizagem é eficaz? O que fazer com a população ativa que não conseguirá acompanhar o futuro do trabalho? O distanciamento socioeconômico aumentará? A que nível? Quais competências devo aprender ou aperfeiçoar para estar preparado para o futuro? Como faço para que a transição seja remansosa? Que mudanças legislativas precisam ser realizadas para que o Brasil continue sendo um mercado atrativo e que a população goze de seus direitos? O emprego perderá a territorialidade? A métrica das horas dará lugar ao da quantidade e qualidade de entrega das demandas?

As variáveis de perguntas eram enormes, mas as respostas não. A forma de resolução de problemas do ser humano é averiguar se reconhece aquele problema e aplicar uma solução já utilizada. O novo traz consigo mudança insegura, porquanto é impossível antever o resultado com base histórica. Nesse momento, a sociedade foi compelida a vivenciar o novo. Ao buscar um referencial, dificilmente se encontra algo próximo que pode ser aplicado ou repelido a vistas do resultado anterior.

Assim, todos estão tendo de se reinventar. As empresas refratárias às mudanças sofrem mais, pois tiveram que fazer movimentos mais bruscos para se adequar a nova realidade ou, ainda, pagar o preço da inércia.

Podemos perceber que os países inovadores, principalmente com maior adaptabilidade a robótica e tecnologia, tiveram ganhos de produtividade exponenciais. A dificuldade de inovar está intrinsicamente ligado ao medo de errar. A frase “aprender, desaprender para reaprender” é contemporânea de uma maneira tão sagaz que permite a quem compreende-la sair na frente e errar a quantidade de vezes que for necessária para alcançar o acerto.

O problema do errar é o seu custo, pois pode representar uma demissão, problemas com sindicatos, fiscalização do trabalho, Ministério Público do Trabalho ou até mesmo o fechamento de uma empresa. Mas não há erro maior que a inércia. Quantas empresas fecharam por não conseguirem se adaptar ao novo momento? Logo, arrisque-se, ainda que seja dentro de limites técnicos sociais pré-estabelecidos.

O case clássico da KODAK deve ser lembrando nesse momento; o negócio deixou de existir e não conseguiram reagir de forma diferente que pudessem lhe permitir prosseguir. A líder de mercado no seu seguimento simplesmente fechou. Imagine se a APPLE tivesse parado nos desktops. Hoje provavelmente não existiria ou seria uma empresa inexpressiva ante as soluções tecnológicas nos tablets, notebooks e smartphones, ao contrário, como sempre se permitiu inovar, atualmente está entre as empresas mais valiosas do mundo.

Quando discorremos sobre inovação, boa parte do senso comum, em especial os mais experientes, tem arraigado que não há motivo para fazer diferente se o que é feito há anos funciona. O problema nessa circunstância é que o mundo muda, tudo muda e, se ficarmos agindo sempre da mesma forma, as mudanças potencializados pelo tempo podem se tornar tão distintas a ponto de aquela empresa ou empregado deixar de ser interessante para a sociedade.

A inovação não necessita ser um giro de 360 graus. Ao contrário, é fazer movimentos necessários a fim de contingenciar danos e auferir melhorias. Não precisa ser algo necessariamente novo no mundo, apenas novo em sua empresa. Algumas mudanças serão transitórias, outras perenes.

Ademais, a melhor forma de fazer as novas implementações é com diálogo, visto que permite receber sugestão de melhorias antes da implementação. Trocar experiência com outros colegas, buscar opinião de outras áreas, dialogar com as lideranças dentro da empresa, além de tatear o terreno. Com essa base de dados é possível seguir em frente expondo menos a empresa e seus colaboradores. Por conseguinte, pratique a mente mestra: “Coordenação de conhecimento e esforço, em um espírito de harmonia, entre duas ou mais pessoas, para realização de um propósito específico” (Napoleon Hill).

Soluções incríveis tendem a aparecer. A criatividade não é um dom ou uma habilidade exclusiva do meio artístico, é natural do ser humano, uns com mais que os outros, é verdade, mas é uma habilidade treinável. A criatividade nasce com todos, é, inclusive, o que mais difere o ser humano dos demais animais. O poder da criatividade é a possibilidade que o ser humano tem de unir soluções segregadas de forma única. Murilo Gum chama a criatividade de combinatividade, visto que, na maioria das vezes, o resultado é a combinação de elementos antes separados.

Quando se vai ao hospital, é normal que classifiquem sua urgência após uma triagem rápida, em que o medem sua temperatura, pressão e indagam o que está sentindo. Isso permite que o hospital faça atendimentos rápidos quando os problemas são graves.

Muitas empresas adotaram a medição de temperatura e de oxímetro para evitar que funcionários com suspeita de COVID entrem em contato com os demais colaboradores. Ou seja, uma triagem que foi pensada para classificar o estado de emergência do paciente é utilizado na empresa para evitar o contágio dos funcionários no ambiente de trabalho, ainda que o coronavírus não seja uma doença ocupacional.

Outro ponto que tem mudado muito nas empresas é a forma de dialogar com os funcionários. Ao invés de enviar informações lineares sobre o que ele precisa saber para exercer sua função, os empregadores tem tido um diálogo social maior, expondo quais as medidas que a empresa tem tomado em relação ao COVID para que o funcionário sinta-se seguro, ou com menos medo, de exercer as atividades. Tem gerado materiais lúdicos para que ultrapassem a barreira do funcionário e leve o conhecimento a sua família a fim de evitar que contaminação ocorra em casa. A quarentena tem trazido a reflexão da importância de cuidar não apenas da parte física e biológica, mas também sobre as questões vinculadas aos transtornos psíquicos.

Por parte dos funcionários, é visível o aumento da auto responsabilidade, em que os colaboradores tem sido diligentes com seus afazeres e em muitos casos até melhorando sua performance. Outro ponto é a questão do medo, funcionários estão muitas vezes com medos antagônicos, de contrair o vírus e de perder o empregado. Questões subjacentes também ganharam destaque, como o valor de estar em contato por mais tempo com os familiares. Outrossim, ficou nítido a necessidade de se atualizar e aperfeiçoar para estar melhor preparado em períodos de adversidade.    

Por fim, o Estado tem implementado políticas eficazes com o escopo de conter o desemprego e permitir que as empresas prossigam respirando. As Medidas Provisórias nºs 927 e 936 foram comumente utilizadas por boa parte dos empregadores, independente do seguimento ou do tamanho da empresa. O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, por exemplo, preservou aproximadamente 10 milhões de empregos.

A par de tantas mudanças, é impensável imaginar que o mundo do trabalho pós coronavírus será como antes da pandemia, uma vez que (i) o mundo já estava em transformação, tendo sido acelerado nesse período; (ii) boas soluções foram criadas e permanecerão incorporadas nas empresas; (iii) os colaboradores estão mais diligentes e as exigências possivelmente mudarão; e (iv) mudança de conceitos trabalhistas arcaicos devem passar por revisão legislativa.

Com tantas mudanças, não há dúvida de que ingressaremos no novo normal. Acredito que encontraremos um cenário de maior engajamento e mais colaborativo pelos funcionários, aumentando, por conseguinte, a capacidade de criar. As empresas provavelmente irão revisar seu modus operandi adicionando atrativos como home office parcial, jornadas condensadas e preocupações psicossociais dos colaboradores, propiciando maior ganha-ganha entre empresa e empregado. Na esfera legislativa, desejo que o período sirva de aprendizado para erradicar a burocracia e recepcionar as novas exigências da sociedade.


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