Como tratar Planos de ILP durante a Crise – Programas vigentes (parte 1)
Recentemente publicamos o artigo Planos de Incentivos de Longo Prazo em Tempos de Crise, no qual falamos sobre a preocupação das empresas em relação aos planos de ILP na crise gerada pela pandemia da COVID-19. Essa preocupação está ligada à queda brusca sofrida pelas ações da maior parte das empresas e, consequentemente, à perda de valor dos planos de ILP.
Em virtude da importância do tema, do aprofundamento da crise ao redor do mundo e no Brasil, e da expertise da Pris na área de Incentivos de Longo Prazo, decidimos desenvolver uma análise mais robusta e profunda sobre a relação entre a crise da COVID-19 e Planos de ILP.
Nesse material discutimos sobre os objetivos do plano, como a retenção e o alinhamento de interesses, e como esses objetivos são impactados pela crise.
O propósito do conteúdo é, portanto, complementar a discussão iniciada na nossa última publicação e, para tanto, ele será dividido nas seguintes partes:
- Programas Vigentes
- 1ª parte: Sugestão de um framework de análise dos planos para ILP vigentes
- 2ª parte: Avaliação das possíveis ações a serem tomadas pelas empresas no momento
- Novos Programas
- 3ª parte: Explicação sobre como analisar os impactos da crise em novas outorgas
- 4ª parte: Análise das Estratégias de resposta aos desafios da crise
No primeiro post trataremos das possibilidade de análise dos planos vigentes. Fique atento aos próximos 3 posts, com os conteúdos complementares.
Framework de análise de planos vigentes de ILP
Dado o contexto atual, a primeira atitude a ser tomada pelo RH das empresas que têm planos de ILP vigentes deve ser a compreensão da situação. Algumas perguntas deveriam ser feitas, como: Temos realmente um problema? Se sim, quais os programas mais afetados? Para esses programas, qual foi a queda do ganho esperado?
Para ajudar nessa avaliação, sugerimos três passos de análise:
- Refletir sobre o objetivo de cada plano de ILP (por exemplo, o foco principal do plano está ligado à retenção ou ao compartilhamento de riscos/resultados com os beneficiários?)
- Avaliar quais são os programas mais afetados (por exemplo, quais planos têm o seu final de carência/mediação de performance próximos?)
- Calcular o tamanho do problema (qual é a diferença entre o target e a expectativa de ganho atual de cada programa?)
Explicaremos o racional de cada um desse passos a seguir.
1. Refletir sobre o objetivo de cada plano de ILP
Os planos de ILP normalmente estão associados a determinados objetivos da empresa, sendo os mais comuns deles a atração e a retenção de talentos, o alinhamento do interesse dos colaboradores e dos acionistas e compartilhamento de riscos e resultados positivos com a equipe.
Esses objetivos devem estar refletidos no desenho do plano, já que diferentes tipos de plano de ILP têm diferentes efeitos esperados no comportamento dos colaboradores. Por exemplo, planos baseados em ações normalmente têm um efeito maior de retenção, já que o beneficiário tem ganho mesmo que haja desvalorização do preço da ação. Por outro lado, planos de opções têm um caráter mais forte de compartilhamento de riscos e resultados, já que proporcionam ganhos mais alavancados em cenários de mais positivos, enquanto não há nenhum ganho em cenários de desvalorização.
Da mesma forma que devemos considerar os objetivos do plano no momento do desenho, eles também devem ser levados em consideração em possíveis ações a serem tomadas durante a crise. Caso o objetivo do plano seja primordialmente a retenção de talentos, a diminuição do ganho esperado pode ter grande efeito na capacidade de retenção da empresa, especialmente no caso de colaboradores que têm uma grande parcela do seu total compensation em ILP.
Por outro lado, caso o plano seja focado no atingimento de metas e compartilhamento de resultados, é natural que, em uma situação em que os acionistas da companhia tiveram grandes perdas e o atingimento dos objetivos da companhia não foram alcançados (mesmo que devido a fatores macroeconômicos), o beneficiário também não tenha os ganhos esperados.
É comum inclusive que empresas tenham mais de um plano de ILP, com a intenção balancear aspectos de retenção e objetivos de alinhamento. Assim, para cada tipo de plano, é preciso fazer uma análise individualizada sobre seu objetivo e como ele será afetado pela crise atual.
2. Avaliar quais são os programas mais afetados
Empresas que têm outorgas frequentes de ILP provavelmente terão planos vigentes com diferentes datas de final de carência e vencimento. Assim, é possível que nem todos os programas/lotes sejam afetados pela crise atual.
Os programas mais afetados são aqueles que se tornarão exercíveis ou terão a sua condição de performance medida ainda em 2020 ou no início de 2021, considerando as expectativas dos estudos sobre a retomada.
Programas que se tornarão exercíveis nos próximos anos podem ser ainda impactados pela crise. Mas, diante da incerteza do cenário futuro, recomendamos que as reflexões e ações sejam focadas naqueles planos em situação mais crítica, que estão exercíveis ou se tornarão exercíveis/expirados no curto prazo.
3. Calcular o tamanho do problema
Como último passo, recomendamos a análise quantitativa do problema. Para isso, é preciso avaliar o delta entre o target outorgado e o atual valor dos planos. Por exemplo, imagine o seguinte cenário para um Diretor da empresa que tem um plano de Stock Options e um Plano de Ações Restritas. Considere que o valor da ação na data de outorga era R$10 e o valor atual da ação é R$5,00.
Stock Options
Data de outorga – 01/04/2017
Final da carência – 01/04/2020
Vencimento – 01/04/2021
Target outorgado em 2017: R$100.000,00 (considerando o valor justo na data de outorga)
Valor atual do plano: R$ 0 (underwater)
Ações Restritas
Data de outorga – 01/04/2017
Final da carência – 01/04/2020
Target outorgado em 2017: R$200.000,00 (considerando o valor justo na data de outorga)
Valor atual do plano: R$ 100.000,00
Resumo
Total outorgado: R$ 300.000,00
Valor atual: R$ 100.000,00
Queda no ganho esperado: R$ 200.000,00 (66%)
Nesse exemplo, houve uma queda de R$ 200.000,00 no valor do ILP, o que representa 66% do ganho esperado do Diretor. Com esse valor em mãos, a empresa conseguirá avaliar melhor o impacto que esse montante terá dentro do total compensation do beneficiário em questão e como a queda pode prejudicar a retenção desse colaborador.
Também será possível avaliar o impacto financeiro da compensação por essas perdas, caso a empresa siga por esse caminho com uma nova outorga, por exemplo (discutiremos as possíveis ações na próxima seção).
Essa análise deve ser feita para cada um dos beneficiários ou, ao menos, para grupos com outorgas e valores de total compensation semelhantes. Para os top performers, a análise deve ser ainda mais cuidadosa, já que a perda de um colaborador crucial em um momento de crise pode agravar a situação.
PRÓXIMO CONTEÚDO
Cumpridos esses 3 passos, conseguimos ter um bom diagnóstico da situação e inclusive identificando programas e beneficiários que estão em uma situação mais crítica. Com isso, fica mais clara a avaliação das possíveis ações a serem tomadas e o impacto de cada uma delas. Esse será o tema do próximo material.
Conselheiro consultivo, especialista em projetos de EVP, remuneração do capital e do trabalho. Entusiasta em apreender e ensinar, mentor intelectual da primeira pós graduação de remuneração Américas e pai do Robertinho
4 aDaniel Eloi parabéns pelo artigo. Muito bom e bem explicativo. Uma inquietação minha e que vários clientes e amigos tem com relação a planos de ILP está na volatilidade dos papéis no mercado brasileiro e que algumas vezes o ILP não está diretamente vinculado ao papel e entregas dos executivos. Já vi vários programas que os executivos estavam crescendo double digito nos indicadores retrospectivos de lucro, EBITDA, Fluxo de Caixa e Faturamento contudo o valor das ações tinham caído e os programas estavam "underwater" ou com um retorno muito baixo. A reciproca também pode acontecer onde o valor das ações estão nas alturas só que os indicadores centrais de curto prazo estão muito ruins. Este descompasso gera enormes ruídos em conselhos e comitês de pessoas. Porque programas de ILP vinculados a ações pode ter este descompasso em virtude da precificação e a volatilidade das ações na bolsa. Mas sem dúvida nenhum programa de remuneração executiva pode deixar de ter programas de curto e longo prazo bem azeitados. O ICP é o programa vinculado aos indicadores de execução, enquanto que o ILP é o programa vinculado a geração de valor. Brinco, que o ICP é o Romeu e o ILP é a Julieta. Como especialista em remuneração executiva ressalto que empresas que não tem estes dois programas estão fadadas a gerar comportamentos de curtíssimo prazo ou algumas miopias que algum momento a conta chegará. Minha humilde opinião é que cabe as empresas alinharem este tema nos comitês de pessoas e conselho para saber qual será o "parafuso" a ser apertado.