Comunicação: como facilitar (sem ser demais)?
Dia desses, um aluno me pediu para fazer uma análise de seu desempenho. Perguntou-me, pelo whatsapp, se eu poderia fazê-lo, e, eu aceitei sem pestanejar. Na sequência, ele me passou uma série de pequenas frases com uma linguagem de internet aplicada a vocabulário técnico (ex: abreviações de termos técnicos). Além de usar uma linguagem diferente, enviou pequenas frases com cada etapa. Ao final, eu teria que analisar, pelo whatsapp, dezenas de frases com termos que eu teria que adivinhar quais eram. Alguma pontuação?! Bem, não preciso nem falar...
Com alguma frequência, eu escuto de profissionais de diversos segmentos relatos parecidos. Pessoas tentando se comunicar pela internet, via apps, como o whatsapp, sem muito sucesso ou perdendo tanto tempo que precisam gastar minutos preciosos para interpretarem mensagens que deveriam ser simples. Não estou entrando no mérito do excesso de regras da língua portuguesa, que é bem difícil. Estou falando de como a intenção de facilitar a comunicação pode atrapalhar.
Conversando com a minha irmã, que é formada em Letras, ela falava-me de um autor chamado Mikhail Bakhtin. De acordo com ela, o autor considerava a linguagem de maneira dialógica, como um constante processo de interações mediado pelo diálogo, em que a construção do sentido acontece através dessas trocas feitas por interlocutores. Troca esta que é baseada no que já foi dito anteriormente e pode dar origem a novos significados ou reforçar os anteriores.
Se consideramos a comunicação de maneira dialógica, percebemos que ela só será efetiva quando houver uma relação de igualdade entre os interlocutores.
A partir desse diálogo com ela, passei a refletir como a velocidade da internet pode gerar problemas na comunicação. Afinal, o pressuposto de todos é que "ninguém quer perder tempo". Ou seja, a partir dessa "regra coletiva", o vale-tudo começa. O exemplo do início do texto pode ser encarado como um reflexo disso. Ao que parece, deixamos de considerar o outro.
Em primeiro lugar, eu preciso saber se nós dois temos o mesmo código, ou seja, se usamos as mesmas expressões. Porque se eu falo: "sup, Carlos?! pls manda pra mim aquele arq ASAP!", eu tenho que entender se o outro está atualizado com gírias em inglês, como "sup", "pls" e "ASAP"; tenho que entender se a palavra 'arquivo' é o melhor termo para ser abreviado. E, sobretudo, se nesse diálogo com o outro, o resultado é facilmente compreensível. Porque se não for, todos perdemos tempo, ou pior, podemos entender a mensagem de forma errada e, consequentemente, tomarmos decisões com base em informações comprometidas.
Uma estratégia para sanar esses problemas de comunicação passa pela lembrança de que ao enviar uma mensagem estamos num diálogo.
Se queremos ser entendidos, precisamos nos fazer entender. Assim como numa negociação, onde ambas as partes tem um terreno em comum para negociar; o processo de comunicação necessita de um espaço compartilhado, que é o código. Se a minha linguagem não respeita o código comum, eu sou responsável pelas consequências disso, pois sou o originário do conteúdo. Desse modo, considerar o outro, estimando o seu código, por meio de sua linguagem, seu histórico e seu nível de abertura para novas formas de interação pode ser uma forma interessante de diminuir os problemas de comunicação, sobretudo quando queremos facilitar demais aquilo que já é simples o suficiente para ser conhecido.