Confissões de um geek desatualizado
Sim, sou geek. Adoro tecnologia. Trabalho em uma empresa de tecnologia. Uso iPhone, Note 10, adoro tecnológicas. Amo astronomia, mas entendo nadica. Jogo Fortnite e Rocket League on-line e tenho até uma galerinha virtual. Meu amigo preferido de jogatina tem 6 anos e manja muito.
Um geek desatualizado é, no mínimo, irônico.
Achei que trabalhar de casa seria mais fácil, afinal tenho muitas ferramentas à disposição para interagir com pessoas remotamente. Super bacana, vou poder usar todos os recursos dos meu gadgets... Mas gente, que sufoco foi para me acostumar. Achar o melhor ângulo da câmera, tripé que não para direito na posição que quero, imagem desfocada, sons duplicados, arghhhhh.
Não vou entrar aqui em detalhes de como o trabalho remoto afetou produtividade, condições físicas, psicológicas... tem bastante conteúdo relevante sendo publicado em várias mídias sociais. E comigo não está sendo diferente.
Meu drive para fazer este artigo foi com base em uma experiência vivida há dias atrás. Eu estava falando com uma pessoa, ajudando em uma questão técnica, e constantemente tinha a impressão de que a ligação tinha caído por ficar muda. Mas depois de alguns “alôs” e a pessoa voltava à ligação, percebi que era uma prática de colocar no mudo mesmo. Droga! Se liga cara... tão 2001 isso.
Falo profissionalmente com pessoas por telefone há bastante tempo, discutindo informações técnicas, e só agora me dei conta dessa prática, muito comum quando falamos em centrais de atendimento de bancos, por exemplo. O atendente normalmente te avisa que a linha ficará muda e aguardamos o retorno.
Porque na minha rotina isso soa tão diferente? Achei que isso tava no meu sangue.
Como prover assistência técnica de equipamentos complexos demanda a construção de uma linha de raciocínio, fico com muito receio da ligação cair e perder o foco. Vivo isso constantemente com a operadora do meu telefone – de repente, sem nem indicar uma pequena falha, só escuto o “tu-tu-tu”... e assim começa toda a construção de raciocínio de novo. A interrupção constante gera frustração em ambas as partes. Assim como em um jogo com servidores lotados e você animadaço para jogar.
Voltando ao caso da conversa ao telefone, percebi também que ele/ela estava falando com outras pessoas, e me dei conta também de outra importante característica da utilização do mudo, que é proteger a segurança da informação. Percebi a importância de quando precisa falar com alguém próximo, sempre usar a função mudo para evitar que a pessoa do outro lado da linha ouça, garantindo a confidencialidade e exposição à situações desconfortáveis. Mas avise que vai colocar no mudo, assim quem está do outro lado da linha não fica no vácuo.
Aproveitando o tema – numa reunião, tirar todos do mudo sem avisar, é um horror. Pode ser muito constrangedor. E gente, por favor, coloquem no mudo quando uma pessoa estiver falando ou apresentando algum conteúdo... falo por mim, me perco facilmente com distrações. Me lembro de quando era criança, e tinha que ligar para pedir pizza... meus pais e meus irmãos trocando o sabor na hora do pedido, eu bugava e pedia tudo errado.
Conversando com outra pessoa sobre este texto, ela me disse que isso passa pela etiqueta. Desculpem-me, não fiz Socila, me perco com os garfos e facas para salada, peixe, carne e sobremesa.
Já notaram que o gatilho para parar de falar, quando uma outra pessoa te interrompe, demora mais para ser acionado em uma reunião por telefone? Já perceberam que quando estamos em uma reunião virtual, esse atraso diminui? Por ver reações ao vivo da pessoa que o interrompeu, o interlocutor tem mais informações para decidir de parar de falar para que a outra pessoa pessoa siga com sua fala. Estou considerando que a conexão é de primeiro mundo viu. Nós estamos mais acostumados com a nossa pior cara travada na videoconferência – me parece até uma pegadinha. Na real, queria algo bem tecnológico e totalmente imersivo.
Me acostumo com tudo isso? Reclamo o tempo todo? Espero o tempo passar? O que você faria? Eu estou indo por tentativa e erro por enquanto. Descobri recentemente que no YouTube tem tutorial para tudo.
Tenho a impressão que a interação ao vivo traz ainda muitas informações subliminares que afeta um diálogo – é aquela máxima: nada como o cara-a-cara. Neste sentido, vejo ocasionalmente ferramentas cada vez mas avançadas indo na direção da imitação total da realidade. Tem até dispositivos acoplados a estações de trabalho remotas que simulam cheiros normalmente encontrados em um escritório, como o de café. Aplicativos de celulares estão sendo usados para simular sons ambientes como cabine de avião, ruídos de conversa de escritório, tudo para lembrar de dias de um futuro esquecido (tá vendo? Geek...). Testei um desses uns dias atrás durante o trabalho, e não é que me deu um conforto? Estou criando boas expectativas.
Meu, tô viajando aqui... veja que estamos acostumados ver as pessoas niveladas pela nossa altura. Em uma reunião virtual, olhamos todos praticamente pelo mesmo ângulo. Será que isso afeta de alguma forma a conversa com pessoas que você já conhece presencialmente? E como será o encontro presencial com aquelas que conheceu virtualmente? Isso já deve ter sido discutido em algum outro artigo, vou procurar 😊.
No auge dos meus 35 anos, pensei que minha geração estava na crista da onda e que dificilmente algo me surpreenderia. Mas me vejo hoje como quando meus avós viram uma televisão plana pela primeira vez. Como aquele trambolho todo coube em algo tão fino?
Minha sensação de estar por fora é pungente, e me incomoda muito. O que antes era natural e orgânico, algo que os adultos na época falavam que “as crianças de hoje estão tão espertas”, hoje percebo que preciso me esforçar para acompanhar. Penso: o que a geração atual vai ver no futuro que os façam refletir como eu? Será que vão refletir?
Detalhe: comecei a jogar on-line há menos de um ano. Entrava em jogos e já perdia, era headshot atrás de headshot. Demorei bastante para entender as dancinhas do Fortnite, customizar meu avatar e como a gravidade do Rocket League funciona (eita Rodolfo, se superou). Super Mario World era tão mais simples e era muito divertido. Peguei esses dias para jogar de novo, bacaninha no início, mas fiquei entediado. Vai entender...
Controle de Qualidade | Desenvolvimento Analítico
4 aÓtimas reflexões! Também sinto que estou desatualizada. Até para usar o Zoom eu ficava super perdida no começo! Era câmera que não ligava, áudio que não saía... 😅
Química | Especialista de produto na Shimadzu do Brasil
4 aEu me identifiquei demais com esse texto! Estou me acostumando com essa coisa de encontros virtuais, não gosto de aparecer na webcam, às vezes perco o foco com um som estranho que surge porque alguém esqueceu o microfone ligado ou até mesmo com a minha própria imagem no vídeo. Mas por mais que seja estranha essa situação, a gente vai se reinventando e vendo coisas muito criativas. Como os alunos da monitoria que aparecem de jaleco na videoconferência que era a aula "prática virtual" hahaha Acho que a cereja do bolo está na criatividade e na empatia pra viver esses desafios em conjunto.
Química Industrial • LinkedIn Top Voice • Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) • Biotecnologia • Ciências da Vida • Desenvolvimento Analítico • Controle de Qualidade • Sustentabilidade • ESG • Mercado de Carbono
4 aAdorei o artigo Rodolfo Lorençatto! Lendo seu texto me lembrei de uma situação que eu estava discutindo com a minha irmã que é psicológa. A minha geração cresceu com as evoluções tecnológicas... E mesmo assim acho que tenho algumas analogias ultrapassadas hahaha. Quando eu era criança e brincava que estava falando no telefone, tentava imitar esse modelo: 📞 Polegar e dedo mínimo aberto, e os dedos indicador, dedo médio e anelar fechados. Hoje, as crianças imitam o smatphone com a mão aberta na orelha, o que faz total sentido para a geração atual.
Doutor em Química Analítica
4 aPerfeito! Adorei o texto, super pertinente.
Desenvolvedor Web Front-end | JavaScript | ReactJS | HTML | CSS | NodeJS | SQL | Sequelize | MongoDB | Mongoose | Python | POO
4 aRodolfo Lorençatto me identifiquei em praticamente todo o texto. Engraçado que antes aquelas reuniões que se julgavam desnecessárias hoje faz tanta falta. Aquela aglomeração, o burburinho da conversa ao lado, o toque, o cumprimento, o olhar nos olhos faz tanta falta, mesmo pessoas que antes eram mais reservadas, hoje sente falta disso tudo. E mesmo nós, geração y, tão interada de assuntos hightech, notamos que sensações humanas realmente são insubstituíveis..... Ainda bem que adaptabilidade faz parte do nosso ser.