Correção VI – Pesos e medidas adequados
A dosagem é um dos grandes desafios na aplicação de medidas disciplinares, punitivas ou corretivas. Eu me lembro do meu sentimento de frustração ao acompanhar o processo da Ação Penal 470, mais conhecida como “Mensalão”, particularmente pela ginástica feita por boa parte do STF, no sentido de abrandar as penalidades dos réus acusados de corrupção ativa, passiva e formação de quadrilha. Tal esforço ficou claro nas discussões relativas à dosimetria das penas para cada crime.
Corrupção, no sentido amplo do termo, é um dos piores tipos de crime. Dela, derivam-se tantos outros delitos, que eu poderia chama-la de mãe da criminalidade, sendo um crime tão hediondo, que sua punição deveria ser a mais severa possível, mas não é. As penas são de poucos anos de reclusão, com direito a progressão, prisão domiciliar, entre outras regalias, para crimes envolvendo vultuosas quantias, fiquei a conjecturar quantas pessoas poderiam ter sido salvas se aqueles recursos fossem bem utilizados em educação, saúde e segurança.
Ao final, mesmo considerando aquelas condenações como uma evolução significativa para a realidade brasileira, fiquei com a sensação de que a justiça, além de tardar muito, não tinha sido feita na dosagem adequada. Aqueles condenados brevemente estariam novamente livres para desfrutar dos resultados de seus crimes.
Após a definição da pena base, mínimos e máximos para cada tipo de crime, é na dosimetria que os atenuantes e agravantes são avaliados para se chegar à pena a ser aplicada. Não querendo transformar o Comitê de Conduta Ética num mini STF, este comitê deve trabalhar com critérios que garantam a aplicação de medidas justas aos eventuais desvios de conduta dos membros da organização.
Estes critérios devem ser cuidadosamente elaborados, aprovados pela alta direção e divulgados a todos na organização. Todos devem estar cientes das possíveis consequências de seus atos e da conduta a ser adotada pela empresa no tratamento de atitudes e comportamentos non compliance.
Pensar nos extremos me ajuda a organizar as ideias e definir caminhos. No meu segundo artigo sobre o Pilar da Correção, eu disse que a impunidade é o mais eloquente convite à prática sustentável da corrupção. Por outro lado, o excessivo rigor na aplicação da disciplina pode promover um terror geral que sepultaria a iniciativa e a criatividade. Impunidade e excesso são extremos a serem evitados, o que torna o processo disciplinar muito complexo e delicado.
Isso implica bastante cuidado não apenas na elaboração do Código de Conduta Ética, como também na escolha dos integrantes do Comitê de Conduta Ética, assuntos abordados nos meus dois últimos artigos. Critérios bem estabelecidos e divulgados produzem um duplo efeito nos membros da organização: o sentimento de justiça e adequação e um freio psicológico naqueles que poderiam ceder à tentação de cometer algum ilícito.
Além destes efeitos benéficos, o próprio Comitê de Conduta Ética passa a ter uma base segura sobre a qual trabalhar em cada caso em que for acionado. Em outras palavras, o Comitê não terá a liberdade de agir por impulso, simpatia ou antipatia, quando estiver tratando de um processo disciplinar. Isso dá credibilidade ao processo e oferece ao Comitê limites dentro dos quais deve atuar.
Finalmente, numa cultura em que a justiça não é cega, fazer com que a organização acredite nos seus próprios valores e princípios, no seu Código de Conduta Ética e respeite o seu Comitê de Conduta Ética é um tremendo desafio, que não será superado sem pesos e medidas adequados.
Sucesso!