Crédito privado: cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém
No Halloween, maus gestores podem empacotar cubos de caldo de galinha e te oferecer como se fossem balas dadinho, substituindo uma gostosura por uma travessura.
O apetite dos investidores por crédito privado tem aumentado proporcionalmente à alta dos juros no Brasil e no mundo. A busca por retornos elevados e os prêmios oferecidos parecem não contemplar adequadamente os riscos envolvidos, considerando a baixa liquidez, o aumento da inadimplência corporativa e da quantidade de pedidos de recuperação judicial no passado recente.
Stephen Schwarzman, CEO da Blackstone (que tem mais de US$ 1 trilhão de ativos sob gestão), afirmou recentemente que o crédito privado desfruta de um "momento de ouro" nos Estados Unidos, tornando-se um relevante provedor de capital de dívida de alto risco, incluindo o financiamento de fusões e aquisições, operações que, segundo Schwarzman, serão estimuladas pela redução da taxa de juros pelo Fed.
Também nos Estados Unidos, gestoras têm lançado ETFs referenciados em ativos de crédito privado, com grande demanda por investidores em geral, a despeito da dificuldade de precificação desses ativos e da incompatibilidade entre sua liquidez e a dinâmica de resgates de ETFs. Para piorar, as regras de transparência de investimentos e taxas propostas pela SEC, regulador norte-americano do mercado de capitais, foram suspensas pelo Judiciário daquele país.
Em 26/9, Fernando Torres, editor-executivo do Valor, publicou um artigo provocativo intitulado "Algo de errado não está certo no crédito privado", demonstrando perplexidade com o grande influxo de recursos em fundos de crédito privado no Brasil:
"Banqueiros de investimento que não costumam conhecer de agro muito além de seus sítios no interior começam a montar operações estruturadas de crédito para o setor agrícola com remuneração, ao que tudo indica, incompatível com o risco de crédito. E enchem a carteira dos clientes com esses títulos de dívida".
Torres destaca como fatores para a "coqueluche do crédito privado" a relevância dos benefícios fiscais para investidores e a ausência de mercação a mercado de modo a mascarar o risco da aplicação - a alta de juros não tem sido refletida nos papéis privados.
Varejo e crédito privado
O tema ganha relevância quando começam a ser ofertados os primeiros fundos de investimento e direitos creditórios (FIDC) para investidores de varejo e, ainda, a evolução do mercado de renda fixa digital, no qual boa parte dos ativos tokenizados é de crédito privado.
Se o investidor não é diligente a ponto de verificar a compatibilidade entre o risco de crédito e o prêmio ofertado, agentes mal intencionados podem oferecer ativos ruins ou mesmo fraudulentos. A assimetria de informação pode levar o mercado ao colapso, como é de praxe no mercado financeiro, exemplificado o problema enunciado por Geogre Akerlof em seu artigo "Market for Lemons".
Nesse contexto, a curadoria dos ativos a serem ofertados, a diligência dos gestores e administradores fiduciários e a participação de gatekeepers tais como empresas de auditoria independente e agências de classificação de risco se mostra essencial. Os custos decorrentes da presença destes intermediários devem ser cotejados com o potencial benefício no processo de sinalização do risco dos ativos.
Mas será que realmente poderemos contar com os agentes de mercado? Ou será que boa parte deles irá privilegiar sua própria remuneração, isentando-se da responsabilidade como vivemos, por exemplo, em 2008?
Em se tratando de crédito privado, mais do que nunca, conheça seu gestor. No Halloween, maus gestores podem empacotar cubos de caldo de galinha e te oferecer como se fossem balas dadinho, substituindo uma gostosura por uma travessura.
Regulação de fintechs
Tive o privilégio de participar de um painel sobre o tema com a profa. Christine Mendonça e o prof. Kleber Luiz Zanchim no Insper .
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Além de o tema ser tratado nos cursos de pós-graduação do Insper, a escola oferece um curso de curta duração específico sobre o tema, liderado pelo prof. Eduardo Montenegro Dotta :
A íntegra do debate pode ser vista no YouTube:
BCB promete consulta pública de normas cripto para outubro
Nesta semana, ocorreu a Digital Assets Conference Brazil 2024, organizada pelo MB | Mercado Bitcoin , segue abaixo o link do evento:
O regulador anunciou que serão submetidas à consulta pública neste mês de outubro as minutas de Resolução BCB para a regulação das VASPs, tratando de conduta, organização, e processos de autorização.
Neste link você encontrará os slides a apresentação do presidente do Banco Central no evento.
Para ouvir
Convido você a curtir a minha playlist Dylanesque no Spotify, onde incluo minhas músicas preferidas de Bob Dylan em versões originais, alternativas e covers.
Obrigado pela leitura e até semana que vem!
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Criando um novo projeto
3 mEu estava justamente tentando entender a bronca do crédito privado esses dias. Ótima explicação.