Créditos de carbono no Brasil... mais uma oportunidade perdida por atraso?
Acredito que todo mundo já tenha ouvido falar, como adicional ao de uso de energias alternativas para reduzir a pegada de emissões de CGH, sobre o “carbono capture” (CCUS), como sendo a bala de prata para reduzir emissões em indústrias intensivas de energia térmica.
E na maior parte do mundo isso faz sentido, pois na maior parte do mundo a geração de energia é feita usando carvão ou gás natural. Não é o caso do Brasil. Aqui a maior parte das emissões é disparada, originada na da agropecuária, e mudança no uso da terra (vulgo desmatamento), e isso traz uma grande oportunidade para o país que não pode ser desperdiçada.
Hoje todas as grandes empresas de energia buscam a neutralização das emissões. E em alguns casos são submetidos a custos de compra de créditos de carbono que tendem a ficar cada vez mais caros.
Na Mecânica da Precificação de Carbono - Mercados de carbono são criados quando um governo implementa um limite nas emissões. Para garantir o cumprimento desse limite, o governo emite permissões de carbono para empresas, seja gratuitamente ou por meio de leilão, e as empresas devem devolver uma permissão de carbono para cada tCO2e que emitirem. Tipicamente, os Sistemas de Comércio de Emissões (E-missions T-rading System) incluem a capacidade das empresas de negociar permissões de carbono para fornecer flexibilidade para cumprir suas obrigações regulatórias. Esse sistema de negociação de créditos de carbono cria um mercado com seus próprios fundamentos de oferta e demanda. Como benefício secundário, os mercados de carbono geram receitas significativas para os governos por meio do leilão de créditos.
Muitos desses mercados exigem que tais receitas sejam usadas para investir em tecnologias de redução de carbono, apoiando a transição para uma economia com baixa emissão de gases de efeito estufa. Em dezembro de 2021, os quatro maiores mercados futuros de carbono globais rastreados pelo Índice Global de Carbono da IHS Markit tiveram um volume anual de negociação de US$ 684 bilhões.
O número de iniciativas tem crescido muito nos últimos anos em todo o mundo, sendo 2 os de maior destaque:
• O ETS da UE: Lançado em 2005, abrange os estados membros da UE e cobre 40% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) da região. O programa reduzirá o fornecimento anual de permissões leiloadas por meio de reduções únicas de 90Mt em 2024, 27Mt em 2026, acelerando a programação anual de redução do limite e visando uma diminuição de 62% do limite anual de emissões em 2030 em relação a 2005 (o primeiro ano do ETS). As metas mais rigorosas de redução de emissões levarão a uma escassez de permissões no mercado, teoricamente elevando o preço e tornando as emissões de carbono mais caras.
• Programa de Comércio de Emissões da Califórnia: O programa começou em 2013 e atualmente cobre aproximadamente 85% das emissões de GEE do estado, com o limite de emissões diminuindo de 307,5Mt em 2022 para 200Mt em 2030. O aumento do valor das permissões de carbono resultou em receitas maiores para ajudar o estado a alcançar seus objetivos climáticos. No ano fiscal de 2021-2022, os leilões geraram uma receita recorde de US$ 4,5 bilhões.
Mas à parte do mercado mandatório (cap and trade) de créditos de carbono há o de neutralização voluntária emissões; uma estratégia que visa compensar as emissões de gases de efeito estufa (GEE) por meio da compra de créditos gerados a partir de projetos que reduzem, evitam ou removem esses gases da atmosfera
Já houve carregamentos de LNG e petróleo cru, neutralizados, e vendidos com um prêmio pela neutralização. O Japão e um dos maiores clientes dessas de gás com algum tipo de “selo verde”.
O uso de energias renováveis está engargalado com a liberação de licenças em boa parte do mundo desenvolvido e a velocidade e o capex envolvido são muito altos. A substituição dos combustíveis fósseis apenas não vai acontecer na velocidade necessária para atingir as metas de emissões de 2030 e 2050.
O CCUS ainda não se provou uma tecnologia factível em larga escala. Há casos de sucesso como os da Petrobras com a retirada de CO2, mas apenas do gás natural. Há poucos pilotos e nenhum em operação comercial lucrativa no mundo parar captura de CO2 de gases de combustão, como os oriundos de caldeiras a carvão, turbinas a gas, alto-fornos, ou fornos de cimento, em que a pressão dos gases é baixa e a concentração de CO2 também, tornando o processo de retirada do CO2 muito mais difícil.
A característica das emissões do Brasil pode permitir o pais encaixar nesse contexto de uma forma interessante economicamente e ambientalmente. O manejo florestal, o manejo agrícola e o a recuperação de vegetação nativa integrada à produção agropecuária podem capturar no solo bastante CO2, gerar créditos de carbono voluntários e ainda reduzir as emissões do Brasil.
• Recuperação de áreas degradadas com espécies florestais: de 1,5 a 10 toneladas de carbono /há/ano (valor médio para 15 anos).
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• Sistema ILPF(Integração Lavoura Pecuária-Floresta): de 1 a 3 t Carbono/há/ano. O sistema ILPF: consiste em integrar diferentes sistemas produtivos (agrícolas, pecuários e florestais) em uma mesma área, o que aumenta a eficiência do uso da terra, a reciclagem de nutrientes, a proteção do solo e a fixação de carbono na biomassa vegetal e no solo.
• Plantio direto na palha com rotação de culturas: de 0,3 a 1 t Carbono /há/ano. O plantio direto na palha: consiste em não revolver o solo e manter a cobertura vegetal morta sobre ele, o que aumenta a matéria orgânica e a retenção de carbono no solo. A rotação de culturas: consiste em alternar diferentes espécies vegetais em uma mesma área, o que melhora a fertilidade do solo e a produtividade das plantas, que capturam mais CO2 da atmosfera.
Como isso funciona?
Recentemente foi divulgado um bom artigo que mostra que a cultura de cana, tem um potencial muito alto de sequestra carbono no solo. Basta não queimar a cana antes da colheita (para retirar as folhas) e usar uma colheitadeira deixando a forragem de folhas no solo...
Essa massa de carbono fixada permanentemente solo se origina assim: das folhas que caem, frutos, vegetação que morre, raízes de gramíneas em pastos, e CO2 liberado pelas raízes.
E apenas nos 30 cm superficiais de solo do mundo, o estoque de C está em torno de 800 bilhões de toneladas , quase a mesma quantidade armazenada na atmosfera.
E a metade do Carbono total estocado no solo (em até cerca de 200cm de profundidade) - cerca de 780 bilhões de toneladas - é referente aos solos ainda sob florestas. As demais áreas, pastagens e cultivo, contem respectivamente cerca de 500 bilhões de ton e 170 bilhões de ton.
Estimativas realizadas para todo o território do Brasil (8,5 milhões de km2) mostraram estoques de C na ordem de 40, e 100 bilhões de toneladas, respectivamente para as camadas de 0-30, e 0-200 cm de solo.
Então ... solos de uso agrícola submetidos a manejos eficientes, podem de fato acumular carbono continuamente. Na verdade, estudos conservadores trazem números de até 60 bilhões de toneladas de C num período de até 50 anos de cultivo , levando assim um tempo razoável para enfim recuperar todo o C perdido no desmatamento (3 a 6 mil ton/há/ano na media do período)
A área desmatada da floresta amazônica no Brasil (ate 2010) teria um potencial de sequestrar C da ordem de 450 milhões de ton/ ano; e desse total, cerca de 30 % seria acumulado pelo solo, e os 70 % restantes, devido à biomassa aérea. Essa estimativa, claro, deixa clara a grande importância de se evitar o desmatamento.
Atualmente, a Amazônia é o bioma com maior extensão de pastagens cultivadas (60 milhões de ha), seguido pelo Cerrado (50 milhões de ha), Mata Atlântica (30 milhões de ha), Caatinga (20 milhões de ha) e Pantanal (2,5 milhões de ha).(Dados da MapBiomas). Entre 2000 e 2020, a pastagem na Amazônia aumentou de 44 milhões de hectares para 55 milhões. Pior, dados de 2020 de análise imagens avaliam a qualidade da pastagem no território nacional com sinais de degradação, em 53%. No caso das pastagens severamente degradadas há em 14% (22 milhões de hectares).
Se toda a área de pastagem degradada apenas da Amazônia fosse PELO MENOS convertida para uma pastagem bem manejada, haveria uma taxa de acúmulo contínuo de 0,3 ton/ha/ano de C na camada de 0 a 30 cm, o que equivaleria a poderia 15 milhões de toneladas C por ano de neutralização. Muito mais poderia ser conseguido com a evolução da forma de manejo dessas áreas incluindo recuperação da vegetação nativa.
Como ordem de comparação: As emissões de Escopo 1 e escopo 2 da Petrobras de acordo com o Relatório Anual de Sustentabilidade de 2020, foram respectivamente de 51 milhões e 13 milhões de toneladas de CO2e.
Reforçando para não ser mal interpretado: apesar da pastagem bem manejada resultar em aumentos do estoque de C do solo em áreas já desmatadas, é importante manter a vegetação nativa no que se refere ao sequestro de C. A conversão de floresta amazônica em pastagens pode emitir para atmosfera cerca de 100 a 200 mil ton/ha de C, em função do processo de desmatamento e queima da biomassa aérea. A fixação no solo dessa quantidade de carbono levaria séculos.
Então, temos potencial e ferramentas de implantar um bom mercado de créditos de carbono e incentivar a preservação e recuperação de áreas florestais e de cultivo, além de permitir a empresas de energia neutralizarem suas emissões em projetos aqui ao invés de comprarem créditos de carbono em mercados muito mais caros. – porque agora vai ter um mercado internacional de créditos de carbono
E isso sem investir bilhões em tecnologias complexas como o CCUS, e ajudando a recuperar a imagem internacional do pais.
Big Data | Inteligência artificial | Data Science | AVSEC | BASeT
1 aVocês sabem que minerais também podem captar carbono? Então...
Strategy for Growth - lets do it!
1 aNice Carlos Rocha. Yvonne Lam check it out