Democracia direta de Bolsonaro era sonho das esquerdas
Ao vivo no celular para a multidão na Paulista: ele saiu na frente para construir a democracia direta com que a esquerda sonhou.

Democracia direta de Bolsonaro era sonho das esquerdas

É do DNA da esquerda mundial o sonho de uma democracia direta, aquela em que o cidadão iria opinar diretamente e votar todos os dias, por cima das instituições tradicionais.

Há muito que a esquerda do Brasil opera para entronizar a vontade popular acima de um sistema representativo que ela julga, com boa dose de razão, falido.

Instado algumas vezes a criticar a ditadura da Venezuela, entre outras com que o PT tem afinidade, o líder da esquerda brasileira hoje e por acaso seu candidato a presidente, Fernando Haddad, deu algumas cambalhotas estilísticas para deixar escapar o ato falho de que a sociedade venezuelana não está conseguindo resolver seus problemas através da intermediação das instituições. Como a sugerir que a luta pelos métodos tradicionais estava esgotada.

Pois a democracia de participação direta desses devaneios acabou por chegar ao Brasil pelas circunstâncias dessa eleição. Com a sensação para a esquerda brasileira de que o tempo passou na janela e só ela não viu.

Enquadrada pelas regras do sistema democrático e sua formação histórica, procurou construir essa democracia direta em assembleias nas instituições populares disponíveis e possíveis: sindicatos, confederações, frentes, movimentos organizados.

Ao mesmo tempo, tentava tomar o poder por cima. Ou participando democraticamente da competição pelo voto em eleições regulares ou procurando domar por pressão ou cooptação, por métodos legais ou espúrios, as instituições tradicionais da sociedade: Legislativo, Judiciário e imprensa, no topo da lista.

A tese era se apropriar dos instrumentos da burguesia para conquistar essa burguesia, tomar o poder e fazer a sua revolução, embora em moldes mais modernos, sem armas.

Percebeu a tempo o poder das novas tecnologias de comunicação e das redes de relacionamento. Tanto que o PT, sua ponta de lança, foi pioneiro no uso da guerrilha virtual para disputar o voto e ganhar eleições, federais, estaduais e municipais, desde os anos 90.

O problema é que, na obsessão de se concentrar nos instrumentos da burguesia, arrastou seu vício para as novas mídias, sobretudo as das redes sociais. Possivelmente, achava que poderia replicar nelas o modelo de pressão ou cooptação, por métodos legais ou espúrios. Sua experiência na guerrilha virtual é um prontuário de muitos crimes de compra de opinião em blogs e uso de dinheiro ilegal para operar robôs na manipulação do sistema democrático.

A experiência de seu adversário mais eficiente no Brasil, Jair Bolsonaro, mostrou o quanto escolheu o caminho errado.

Bolsonaro cativou público e maioria nas redes sociais com um trabalho contínuo, persistente e centrado no espírito de autonomia, espontaneidade e afinidade que caracteriza o novo eleitor de celular na mão.

Ele não inventou essa relação e nem deve ter agido pragmaticamente para domá-la ou cooptá-la, por métodos legais ou espúrios. Foi absorvido por ela por encarnar várias coisas, sobretudo um monte de valores que a maioria andava procurando num candidato.

Dentro dela, confiante num método que funcionava, se deixou levar. Foi engolido e ampliado.

Por faro político ou pressão da legislação, deve ter percebido que não precisa, não adiantava e não convinha pagar. No início da campanha, empresários que lhe procuraram oferecendo ajuda foram surpreendidos quando ouviram dele que não queria dinheiro. Queria militância nas redes. Se alguns usaram dinheiro para isso, está em investigação.

Acabou construindo o modelo de democracia com que a esquerda sonhava. O resultado do primeiro turno, as reviravoltas nas pesquisas de intenção de voto e a devastação que as redes sociais fizeram e estão fazendo nas instituições tradicionais, a toda dia e toda hora, com a baioneta do celular na mão, é tudo o que ela, ocupada com os métodos tradicionais, não conseguiu visualizar.

Mas ainda dá tempo. E outras eleições. O bom é que, tendo chegado tarde, pôde também perceber os erros, as desvantagens e os problemas do novo modelo. Pode ajudar a construir um melhor que esse

Democracia na imprensa

Não há como negar que as manifestações pró-Bolsonaro de domingo impressionam muito mais que as contra ele, realizadas no sábado. Basta uma googlada nas imagens das duas para perceber a diferença que a grande imprensa não mostra.

Nem é por má fé. Há tempos que, por medo da legislação eleitoral, a cobertura das campanhas na mídia tradicional é parcimoniosa e amedrontada, sugerindo um equilíbrio que não existe.

Depois ela reclama que a internet está lhe arruinando. Poderia ser mais respeitada se prestasse um serviço melhor. O Antagonista, que não tem medo de tomar partido, só cresce.

Democracia de palanque

Os candidatos tendem ser mais sincericidas na mídia mais tradicional que existe, o palanque, achando talvez achando ainda que não terão repercussão além do trio elétrico. No fim de semana, botaram pra quebrar:

Bolsonaro, ao celular para a avenida Paulista:

— Essa pátria é nossa. Não é dessa gangue que tem uma bandeira vermelha e tem a cabeça lavada. Pretalhada, vai tudo vocês para a ponta da praia. Vocês não terão mais vez em nossa pátria. Vocês não terão mais ONGs para saciar a fome de mortadela de vocês. Será uma limpeza nunca vista na história do Brasil.

Haddad, no Maranhão:

— Bolsonaro não é um democrata, não sabe conviver com a divergência. Não é um candidato a presidente, é um chefe de milícia. Depois que você dá o poder para quem anda armado, você não tira mais. Seus filhos também são milicianos, são capangas. É gente de quinta categoria.

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