Desvendando a Angústia: Como a Evolução Humana Influencia Nossas Emoções Modernas.
Ao longo de um dia comum gastamos boa parte da nossa energia analisando informações e executando tarefas. Embora essa energia psíquica que usamos para processar todos estes dados e coordenar as tarefas a serem executadas pareça algo simbólico e imaterial, o cérebro humano é o órgão que mais consome energia no corpo.
Bastante, não é?
Talvez seja por isso que boa parte das nossas experiências no mundo se dão a partir do que o cérebro entende como necessário ou importante.
Se voltarmos a nossas origens podemos entender de modo mais claro a maneira como nosso corpo foi sendo construído e as reações fisiológicas que cada componente dele produz. Assim, podemos também supor que até mesmo a ansiedade, do ponto mais fisiológico possível - angústia, aperto no peito, mãos e pés frios - possuem uma razão de ser.
O homo sapiens possui certas reações inatas para conseguir enfrentar os perigos e também para se proteger. Deste modo ele consegue lutar de forma agressiva, por exemplo, por comida ou então encontrar parceiros sexuais com o intuito de preservar a sua existência como espécie.
Claro que cerca de 300 mil anos se passaram desde o surgimento dos primeiros homo sapiens, mas numa escala evolutiva de uma espécie isso é pouco, o que indica que nosso corpo ainda carrega componentes iguais àquele que vivia nas savanas africanas em tempos remotos.
É fato também que nosso ambiente hoje costuma ser outro, bem diferente. Muitos vivem em cidades, tem acesso a recursos ilimitados de alimentos e coisas que nos trazem bem estar. Nos relacionamos com muitas pessoas, com muita informação e estamos conectados com qualquer parte do globo terrestre através de telas. Esse ambiente que hoje traz uma quantidade inimaginável de recursos e possibilidades vai muito além do que aquilo para o qual basicamente nossos corpos foram projetados.
Assim, nem sempre o que se quer ou se precisa do ponto de vista orgânico é aquilo que se deseja do ponto de vista social e cultural.
Um indivíduo que viveu naquele contexto da savana africana, provavelmente sentiu algo que podemos entender como ansiedade quando ele se deparava com um animal de uma espécie diferente. Ele se via tentado a matá-lo para saciar a sua fome ou talvez tenha sentido medo, pelo animal representar uma ameaça. O cérebro desse "homem das cavernas" deve ter processado a informação e analisado se era possível partir para o embate e ou se seria necessário fugir. Seu corpo então respondeu a isso a partir de impulsos enviados pelo seu instinto de sobrevivência. A reação no corpo dele é um aumento da frequência cardíaca e uma respiração mais acelerada. Isso permite que o corpo dele fique com mais oxigênio, velocidade e força. Este ser de repente fica mais condicionado para o embate.
Curiosamente continuamos a sentir essas reações nos dias de hoje. Os desafios do nosso cotidiano hoje são diferentes, trabalho, lidar com o chefe, pagar contas, e etc. Estes são exemplos de situações em que o cérebro continua a entender como situações de alerta e que necessita ser executada uma ação. Porém, os nossos acordos éticos, morais e cívicos não nos permitem matar o banco, abrir o pacote de bolachas no supermercado sem que se pague, ou fugir das obrigações no trabalho e com o governo. A nossa condição de espécie social nos coloca em conflitos permanentes: o impulso de proteção ou de luta versus as regras e acordos da sociedade.
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Para a filosofia existencialista essa angústia experimentada não é apenas um sintoma de um adoecimento mental, mas um estado básico do ser humano. O homem se angustia e percebe seus efeitos no corpo diante de situações das quais não se escapa. Estar vivo é se angustiar. Estar juntos de outras pessoas gera angústia. Perceber a morte, a finitude da vida, causa angústia. Para Sartre a angústia existencial advém do fato de o homem estar condenado a ser livre e não poder se livrar dessa condição. O que você vai ser quando crescer? essa pergunta é um exemplo desta liberdade que nos é dada. Mas, em oposição existe todo um gigantesco sistema de determinismos históricos e sociais que coloca em cheque a liberdade individual.
É necessário se dar conta dessa nossa condição de indivíduos orgânicos em um mundo social e cada vez mais digital. É possível, porém, que essa luz que se joga sobre isso cause naqueles que a observam uma crise. É bem verdade também que temos atualmente vários recursos para lidar com a angústia: remédios, estilos de vida mais saudáveis, mudar o padrão de pensamento…
Você já deve ter ouvido o quanto as crises são importantes como um início de um processo de mudança. E de fato, podemos entender a crise e seus sintomas - o aperto no peito, a ansiedade, o tremor nas mãos - como uma denúncia de que algo no seu querer não está compatível com o seu ambiente. É interessante se ao invés de simplesmente combater os sintomas busquemos entender o porquê dele ter surgido.
Alienar-se em receitas mágicas de bem estar em um mundo que é às vezes confuso pode não tratar a causa fazendo o problema da angústia retornar na forma de outros sintomas. Tornam se assim indivíduos frágeis e inseguros com as constantes mudanças sociais, pois vivem em função daquilo que se deve ter, e o ter vem de fora.
Olhar para angústia e buscar entender o que ela está denunciando pode ser uma excelente forma de se conhecer melhor. Olhar para o que lhe paralisa pode ser assustador mas é também o mais importante passo. Ao reconhecer que possuímos limitações estamos delimitando aquilo que é impossível daquilo que é possível. Sendo então possível moldar possibilidades para uma vida mais feliz.
Texto escrito por Marcus Vinicius Bertola Caetano
Psicólogo psicoterapeuta
psicmarcusvinicius.com
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1 mOlá, dr. Marcus Te enviei uma mensagem, gostaria de um retorno seu quando possível. Obrigada desde já