DILEMA
Diante do computador, ele e três pessoas a olhar o vídeo na internet. A cena? Duas mulheres no estacionamento. Completamente desconhecidas uma da outra. Uma delas abre a porta e acerta sem querer o carro da outra. A outra reclama dentro do carro. A que está de pé diz uma palavra atravessada e se afasta, quando a que está no interior do outro carro abre a porta e começa a bater várias vezes no carro da rival. E o vídeo segue mostrando a criatividade que a vingança provoca. Tudo porque ambas as mulheres estavam em TPM.
As pessoas na sala sorriam. As mulheres dizendo que a TPM é brava e “tadinho do meu marido quando estou atacada”. “Eu é que não provoco quando a minha está neste estado”, um rapaz, casado, reforça o temor diante da esposa ‘tepeemizada’. O clima de descontração era geral. Seria uma cena comum, sem qualquer ponto conflitante, certo?
Sim, se na sala só tivesse pessoas comuns. Mas havia um de espírito irrequieto. Embora casado, acostumado às intempéries da esposa ‘Naqueles Dias’, hoje um quê de dúvida abateu-se sobre ele.
Uma das mulheres presente na sala era sua chefa. Ele disse, quase sem pensar:
“Será que pode ter alguma relação entre TPM e violência contra a mulher?”, ia falando temeroso com as palavras, como uma criança que receia levar bronca.
“Não entendi”, ela perguntou, embora prestasse pouca atenção, visto o olhar estar dedicado a um notice da chefia de gabinete.
“É sabido que há mulheres que ficam transtornadas neste período. Assim, estariam mais dispostas a brigas. E se diante de si tiver um marido grosseiro, provavelmente ficará em desvantagem caso o seu nervosismo a leve a agredir o cônjuge.”
“Ahn?”, ia ela tentando pescar a ideia.
“A violência doméstica contra mulher aí estaria em função da TPM, que tirando a mulher de seu controle mental, faria atacar o homem, e este revidaria, caso fosse do tipo violento”, e ele apressou a se justificar, “tão diferente de mim, que sei que Nesses Dias eu tenho é que tolerar e se possível sair de casa até ela se acalmar”.
“Nem por brincadeira fale isso. A mulherada cairia de pau em cima de você”, e sem dar muita atenção ela voltou-se para o notice.
“Claro”, ele procurou descontrair o ambiente, mudando de assunto.
Às 17h00, a galera saindo do trampo. Sendo sexta-feira, muitos irradiantes diante da perspectiva de um fim de semana, com as cabeças leves, pegando ônibus, se enfiando nos carros. Mas o maluco do cara ‘ia na neura’. Enquanto a repartição ficava para trás, ele, dentro do ônibus, ia matutando sobre a hipótese da TPM ser uma causa da violência contra a mulher.
Estava diante de um dilema.
Nada a ver quanto aos procedimentos científicos. Era versado em ética na metodologia cientifica. Caso fosse fazer este experimento: pensou num grupo A e grupo B. O grupo A teria as mulheres ‘tepeemizadas’. No grupo B, as mulheres cujo nível de hormônio não causa distúrbio nesse período crítico. A segunda etapa é investigar as mulheres vítimas de violência doméstica e ver se a maioria se encaixa no Grupo A ou no Grupo B.
Os resultados poderiam comprovar ou negar a hipótese. Se negassem, tranquilo. O perigo é se os resultados comprovassem a hipótese de que mulheres em TPM são mais – ou pior, as únicas – vítimas de violência dos maridos.
Eis seu dilema. Se fosse comprovado, muito marido que bate na esposa alegaria legítima defesa diante dos ataques provocados pela influência da TPM. Temia que o achado científico pudesse culpar a vítima em vez de punir o agressor.
Humanista que era não temia pela própria pele. Nem o amedrontava o fato de ter na presidência da empresa que ele trabalha uma mulher. Até votou na Dilma e realmente gosta do estilo de sua chefa.
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