Divórcio. Resenha do livro de Ricardo Lísias
O livro parte de um acontecimento conhecido e de âmbito privado (a separação de Ricardo Lísias após ter tomado conhecimento do diário feito por sua então esposa, no qual ela fazia apontamentos depreciativos sobre ele e sobre o casamento de ambos) para exercitar a passagem entre o universo ficcional e aquele que seria o da realidade. Em entrevista à Folha de S. PauloLísias respondeu: “Meu livro tem um ponto de partida pessoal e traumático e a partir dele criei um texto de ficção. A literatura não reproduz a realidade, mas sim cria outra”.
No limite esmaecido entre realidade e ficção, personagens remetem a sujeitos que se encontram, de algum modo, fora do âmbito do livro. Todavia, à parte a premissa inicial, não temos nunca como saber se algo do que é narrado estaria além ou aquém do exercício literário. Isto é, só as personagens e suas narrativas nos restam.
É nesse movimento que a literatura é apresentada como o meio pelo qual o protagonista consegue se recompor e fazer da experiência de separação não apenas um (re)começo, que se traduz na própria confecção do livro, mas também na positivação do distanciamento com aqueles que fazem da palavra meio para construir realidade: jornalistas e políticos. A experiência literária é ímpar nesse sentido.
Que a narrativa a todo instante destaque a dimensão física da (re)construção de si (a pele, a corrida) nada mais é do que o acento que aponta para a primazia da palavra na invenção em curso. É a palavra que nos faz saber da aventura do protagonista, tanto quanto desenha para ele próprio o eu em que habita.
LÍSIAS, Ricardo. Divórcio. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013. 153 p.