Eu sou o sonho mais selvagem dos meus ancestrais

Eu sou o sonho mais selvagem dos meus ancestrais

Parafraseando Racionais: eu sempre fui sonhadora e é isso que me mantém viva.

Enquanto crescia, eu fui constantemente incentivada pelos meus pais a sonhar, a almejar grandes feitos e a encontrar minha verdade.

Não foi até pouco tempo atrás que eu, uma mulher negra e periférica, percebi que a gente só sonha com aquilo que a gente conhece. E que sonhar, de uma certa forma, também é um privilégio.

Quando você cresce sem enxergar pessoas do seu pertencimento racial e social alcançando sonhos diversos e sendo bem sucedidos, é difícil acreditar que você vai ser a exceção à regra. De maneira geral, eu via o sucesso sendo constantemente atribuído a um grupo do qual eu não fazia parte. Mesmo hoje em dia, essa discrepância ainda me assusta e me abala.

Quando eu falo sobre sucesso, eu penso de forma abrangente e fluída, abstrata e pessoal para cada um de nós. Pra mim sucesso é poder trazer um pedaço do Capão Redondo para ambientes ainda tão pouco representados e ter um lugar de voz ativa na mesa. É saber que hoje eu sou a representação do sonho da Alycia de 17 anos e que através de mim outras pessoas podem se inspirar e sonhar apesar dos obstáculos sociais.

Levando o conceito de sucesso para o contexto profissional, apesar de todas as inúmeras reuniões com as mais variadas empresas de diferentes setores que eu fiz nos últimos três anos, ainda assim eu consigo contar nos dedos de uma só mão as vezes em que eu encontrei profissionais negros em posição de gerência e/ou diretoria, ou até mesmo situações onde as pessoas negras eram uma maioria representada durante essas mesmas reuniões.

Onde estão os meus iguais? E no dia a dia, onde se escondem as políticas de diversidade e inclusão de grandes empresas?

Eu gosto de acreditar que não é surpresa pra ninguém eu dizer que a conta simplesmente não fecha, certo? Pessoas pretas são maioria populacional no país e minorizadas drasticamente em faculdades, cargos do alto escalão executivo, além de privados de tantos outros privilégios sociais.

Esse aspecto e tantas outras complexidades do que significa ser uma pessoa preta no Brasil desgasta o sonho de qualquer um, é exaustivo de tantas formas tentar ser duas vezes melhor para superar esse abismo de oportunidades.

Depois de um longo processo de autodescoberta e recuperação da autoestima roubada pelo racismo estrutural, hoje eu conheço muito bem o meu valor como pessoa e como profissional. Ainda existem sonhos que eu admiro de longe e acho que estão tão distantes de mim e da minha realidade. Por ser negra e periférica eu já entrei nesse jogo atrasada, sem qualquer tipo de vantagem, mas tudo começa com um sonho, certo? Então eu convido você pessoa preta ou marginalizada a sonhar junto comigo.

Eu decidi que eu não vou sonhar pequeno ou com modéstia, todos os meus sonhos me cabem, me pertencem e eu vou reinvidicá-los. Eu vou ocupar lugares e por onde passar abrir portas para que outras pessoas como eu possam entrar, para que outras pessoas como eu possam se inspirar e sonhar também. Sonhar com um futuro mais diverso, com oportunidades mais diversas, com equidade e respeito para as nossas futuras gerações.

Vou reivindicar cada um dos meus sonhos mais ousados, por mim, pela minha família e para que outras pessoas possam se ver na minha história.

Eu sou o sonho mais selvagem dos meus ancestrais. E eu só estou começando.


Admiração total por você! E só cresce ❤️ quero ler mais textos seus por aqui!!

Suelen Marcolino

Forbes Innovators | Conselheira | Columnist @MIT Technology Review Brasil | 2x no ranking das pessoas mais influentes da tecnologia no Brasil | Entrepreneur & Consultant | Mentora | Diversidade e Inclusão

3 a

Que orgulho te ver crescer profissionalmente! Que sorte termos você, Aly e, como você disse, ainda é só o começo! 💥

Que texto incrível Alycia, quantos de nós não desistem de sonhos de criança como ser astronauta, médico ou até mesmo policial depois que cresce. Quando pequeno eu queria ser militar ou bombeiro, mas na adolescência "aprendi" a ter medo da polícia simplesmente porque para nós negros periféricos, a polícia era uma espécie de ceifador e não protetor. Que possamos cada vez mais ocupar espaços e mudar certas pressões que temos que conviver. ✊🏾

Gilmara Bittencourt

Conselheira de Saúde/Enfermeira Especialista e Consultora em Saúde da População Negra/ Professora e Palestrante/ Gestora em Saúde/Moção de Reconhecimento pelo trabalho em prol da Saúde Pública

3 a

Alycia Paixão, você fala com a alma. Muito obrigada por essa reflexão sensacional. Não há duvidas que: nossos passos vëm de longe.

Fabiana Rocha

Customer Success | Gestão de projetos | Gerente de Relacionamento | Vendas | Palestrante | Futura Psicóloga

3 a

Maravilhosa Aly! E seu sonho é nosso sonho. E vamos longe 🤎✊🏾

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