Insalubridade e periculosidade no trabalho com radiações ionizantes nas unidades de radiologia e radiodiagnóstico

Insalubridade e periculosidade no trabalho com radiações ionizantes nas unidades de radiologia e radiodiagnóstico

No dia a  dia da gestão, nós Físicos Médicos somos inquiridos sobre os adicionais percebidos pelos profissionais que atuam atuam com equipamentos ou fontes de radiação ionizante, entre os principais os equipamentos de radiologia.  Contudo cade salientar que alguns conceitos devem ser abordados tais como:

RADIAÇÃO é uma forma de energia transmitida através do ar ou não, como uma onda eletromagnética ou partículas. Além de existir naturalmente no ambiente, a radiação também vem de fontes artificiais como atividades médicas e industriais. A forma mais familiar de radiação é a luz solar, que consiste de radiação numa gama de comprimentos de ondas a partir do infravermelho, mais longo, aos raios ultravioletas, mais curtos. Além da radiação solar, existem outros tipos de radiação que recebemos em pequenas doses, como as que vêm da terra, o ar que respiramos e fontes artificiais como aquelas usadas ​​na medicina.

Tipos de radiação na vida cotidiana. O espectro eletromagnético abrange diversos comprimentos de onda.

Dividimos todas estas formas de radiação em duas categorias: radiações ionizantes e não ionizantes. Íons são átomos e que podem ter tanto uma carga elétrica positiva quanto negativa. O tipo de radiação que faz com que eles se tornem íons é conhecida como a . Radiações não ionizantes, por outro lado, não têm energia suficiente para causar esta mudança de estado. Todos nós recebemos alguma exposição à radiação ambiente natural, bem como, ocasionalmente, radiação artificial como médico ou odontológico.

RADIAÇÃO NÃO IONIZANTE possui energia menor do que a radiação ionizante e inclui formas como microondas ou ondas de rádio e televisão. Seu efeito geralmente é limitado à geração de luz ou calor.

RADIAÇÃO IONIZANTE consiste em ondas eletromagnéticas com energia suficiente para fazer com que os elétrons se desprendam de átomos e moléculas, alterando sua estrutura num processo conhecido como ionização.

INDIVIDUO OCUPACIONALMENTE EXPOSTO ( IOE ) é  indivíduo sujeito à exposição ocupacional.

PROTEÇÃO RADIOLÓGICA OU RADIOPROTEÇÃO refere-se a um conjunto de medidas que visam a proteger o ser humano e seus descendentes contra possíveis efeitos indesejados causados pela radiação ionizante.

SERVIÇO DE PROTEÇÃO RADIOLÓGICA é a estrutura constituída especificamente com vistas à execução e manutenção do plano de proteção radiológica de uma instalação. Esta denominação não tem caráter obrigatório.

INSALUBRIDADE Conforme o Art. 192 da CLT, o adicional de insalubridade deve ser pago quando os limites de tolerância estabelecidos pelo MTE forem superados. Como estes limites são anuais (doses somadas durante 12 meses), o pagamento somente acontecerá quando a soma das doses em 12 meses consecutivos exceder àquele valor.

Como exemplo, vamos supor que um operador de gamagrafia recebeu 45 mSv nos últimos 11 meses. Neste caso, se no 12º mês o trabalhador receber 5,1 mSv, terá direito ao adicional de insalubridade (45+5,1=50,1).

Por outro lado, o SESMT poderá afastar este trabalhador das atividades com exposição à radiação ionizante justamente para que o limite não seja excedido, não configurando atividade insalubre esta é uma das principais metas de proteção radiológica: evitar que os limites de dose sejam alcançados.

Seguindo com o exemplo, vamos agora considerar que no primeiro destes 11 meses a dose recebida havia sido de 15 mSv e passado o 12º mês sem exposição, o somatório das doses dos últimos 12 meses passaria a ser 30 mSv (45-15+0). Ou seja, no 13º mês o SESMT poderá liberar o trabalhador para voltar às atividades com exposição à radiação ionizante.

Atenção, além de quando superar 50 mSv em um ano, o adicional de insalubridade será pago quando a média da dose recebida ultrapassar 20 mSv/ano em cinco anos consecutivos. Cuidado deve ser tomado em serviços de radiologia diagnóstica e intervencionista, pois o Ministério da Saúde definiu outros limites e outras obrigações a serem cumpridas.

A CNEN 3.01 apresenta os limites de dose estabelecidos pela Comissão Nacional de Energia Nuclear, adotados pelo MTE, e pelo Ministério da Saúde. 

PERICULOSIDADE Mesmo sendo um agente insalubre, alguns profissionais reivindicam pagamento de adicional de periculosidade para exposição à radiação ionizante. Tal reivindicação é baseada na Portaria 518/03 do MTE. Esta portaria é muito discutida e controversa tanto por aspectos legais é hierarquicamente inferior à CLT quanto por aspectos técnicos e científicos. O artigo não entrará neste debate. Para fundamentar uma perícia nesta Portaria 518/03 é preciso interpretá-la corretamente. O Art. 2º define que o adicional de periculosidade será pago somente quando o trabalho incorrer nas condições enunciadas no “Quadro de Atividades e Operações Perigosas”. Este quadro apresenta diversas atividades e áreas de risco que devem ser correlacionadas. Por exemplo, não basta enquadrar o serviço do trabalhador na Atividade 4 (operação com aparelhos de raios X), pois se assim fosse, todos teriam direito ao adicional e não haveria necessidade de “aprovar um quadro” discriminativo.

Portanto, há também de se enquadrar na área de risco (salas de irradiação e de operação de aparelhos de raios X). Mas não é simplesmente isso. A Atividade 4 possui algumas subdivisões, cada qual com sua(s) área(s) de risco.

Por exemplo a Atividade 4.1 (Diagnóstico Médico e Odontológico) tem por área de risco apenas laboratórios de testes, ensaios e calibração com as fontes de radiação descritas. Ou seja, têm direito a receber o adicional de periculosidade apenas trabalhadores destes laboratórios. Neste rol ainda poderão estar equipes que testam equipamentos durante sua fabricação e equipes de manutenção. Note-se que técnicos de radiologia, médicos, dentistas e enfermeiros não se enquadram e, portanto, não têm direito ao adicional.

Já na Atividade 4.2 (Radioterapia), não há área de risco para se correlacionar e, portanto, todos que exercem atividades nas salas de irradiação têm direito ao adicional.

EFEITOS DA RADIAÇÃO IONIZANTE, estando entendidos os conceitos de Insalubre e Periculoso no âmbito trabalhista brasileiro, devem ser recordados os danos biológicos que as radiações ionizantes podem causar no organismo humano. Estes podem ser classificados como Determinísticos ou Estocásticos.

Os Efeitos Determinísticos são aqueles para os quais existe um limiar de dose abaixo do qual o efeito não é observável.

Acima deste limiar, o dano é observável e sua severidade aumenta com o aumento da dose. Pode-se citar: catarata (2.000-10.000 mGy), esterilidade temporária (150 mGy para homens e 600 mGy para mulheres), esterilidade permanente (3.500-6.000 mGy para homens e 2.500-6.000 mGy para mulheres), eritema e descamação da pele (3.000-5.000 mGy) e necrose de tecidos (50.000 mGy).

Em geral, estes efeitos ocorrem para exposições agudas. Um tipo especial de efeito determinístico são as chamadas Síndromes Agudas da Radiação, que ocorrem em situações onde um indivíduo é exposto de corpo inteiro, num curto espaço de tempo, a doses maiores que 2.000 mGy, cerca de 40 vezes maior que o limite de dose para trabalhadores em um ano.

O indivíduo irradiado apresentará um quadro clínico típico: para doses maiores que 2.000 mGy as células mais danificadas são as da medula óssea, causando anemia, hemorragia e infecções; para doses acima de 4.000 mGy ocorrem danos ao epitélio intestinal e sistema de renovação celular, causando desidratação, perda de peso e letargia; doses acima de 8.000 mGy causam insuficiência respiratória aguda, coma e morte entre 14 e 36 horas; acima de 10.000 mGy o sistema nervoso central é afetado e o quadro clínico é irreversível, levando a óbito em poucas horas, por colapso.

Os Efeitos Estocásticos, também chamados de Probabilísticos, por sua vez, são aqueles em que a probabilidade de ocorrência aumenta com o aumento da dose recebida. Dentre eles pode-se citar: câncer, leucemia e efeitos genéticos. Veja-se que estes efeitos também ocorrem em pessoas que nunca trabalharam expostas à radiação ionizante. São alterações para as quais o organismo humano já possui uma predisposição para sua ocorrência. Observe-se também que, como se trata de um aumento de probabilidade de ocorrência, é igualmente possível que não ocorram mesmo que o indivíduo receba doses elevadas.

A Portaria 518/03 do MTE deveria ser o preceito legal para esclarecer em que condições o trabalho com exposição às radiações ionizantes deve dar direito ao Adicional de Periculosidade. Outrossim sob o ponto de vista técnico e científico, analisar o "Considerando" do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego, que sequer é texto integrante da Portaria, porém infelizmente vem sendo utilizado para balizar perícias e decisões judiciais.

Sabemos, toda a humanidade está continuamente exposta às radiações ionizantes, seja no ambiente de trabalho, em casa ou em momentos de lazer. Trata-se de um fenômeno natural que existe desde a origem do nosso planeta. Segundo dados do Comitê Científico das Nações Unidas para os Efeitos da Radiação Atômica UNSCEAR, a população mundial recebe, em média, 2,71mSv/ano de radiação natural.

Parte desta dose é devida à exposição à radiação cósmica, proveniente do espaço, e à radiação oriunda de materiais presentes no solo terrestre e, inclusive, em materiais de construção. Outra parte deve-se à inalação do ar e ingestão de alimentos e água.

Conforme o Artigo 2º da Portaria 518, somente o trabalho nas condições enunciadas no quadro discriminativo é que deve ser considerado periculoso. Consonante com o item 16.8 da NR-16, o empregador deverá delimitar as Áreas de Risco estabelecidas nesta Portaria. Enquanto esta legislação estiver em vigor, mesmo que contra toda a ciência e técnica, o perito trabalhista deve dizer que a atividade dá direito ao Adicional de Periculosidade por se desenvolver dentro de uma das áreas de risco especificadas.

A operação de aparelhos de raios X para diagnóstico médico e a operação de aparelhos de irradiação gama para radioterapia são exemplos bem conhecidos. Em ambos os casos a área de risco compreende as salas de irradiação e operação destes aparelhos. No primeiro caso são consideradas periculosas somente as atividades desenvolvidas em laboratórios de testes, ensaios e calibração. Ou seja, técnicos em radiologia e equipes médicas de radiologia intervencionista, por exemplo, não se enquadram.

Já no caso da radioterapia não há áreas de risco especificadas, portanto,todo o trabalhador que desenvolver atividades dentro de salas de irradiação e de operação dos aparelhos tem direito ao Adicional de Periculosidade. Podem-se incluir aqui as equipes de limpeza que entram nas salas somente quando a fonte está recolhida em sua blindagem. Vemos aqui um grande erro técnico, pois se a fonte estiver dentro da blindagem não há risco de exposição a doses elevadas.

Outro erro que não pode deixar de ser percebido é em relação às salas de operação dos aparelhos, que normalmente não estão no mesmo ambiente das salas de irradiação e possuem barreiras de proteção com blindagem suficiente para que os níveis de radiação não superem o limite previsto na NR-15.

Outro exemplo trata da atividade de análise de materiais por difratometria. Conforme consta, tem direito ao Adicional de Periculosidade o trabalhador que manuseia o equipamento. Por outro lado, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), disponibiliza em seu site uma relação de difratômetros que estão isentos dos critérios de proteção radiológica.  Tal isenção significa de que o risco é tão baixo que pode ser considerado irrelevante. Se é irrelevante, não põe em risco a saúde humana.

Considerando-se a legislação trabalhista brasileira os agentes ambientais insalubres são aqueles que causam danos à saúde do trabalhador, ao passo que as atividades e operações periculosas podem levar o trabalhador a óbito imediato. Para a maioria das atividades e operações que expõem os trabalhadores às radiações ionizantes, o enquadramento de periculosidade é errôneo.

A probabilidade de efeitos danosos das radiações ionizantes no organismo humano, o uso das radiações ionizantes na medicina e a radiação natural demonstram ser um erro considerar o trabalho com radiações ionizantes como sendo periculoso, posto que não há duvida de que a operação de aparelhos emissores de radiações ionizantes é uma atividade insalubre. 

Maílson Silva

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4 a

Prezado, muito bom seu artigo e esclarecimentos. Uma pergunta: o aparelho de tomografia pode ser considerado uma aparelho de raio-x, tendo em vista que funciona com princípio semelhante? Neste caso, sua operação deveria ser feita apenas por técnico em radiologia? Grato

Juercio Lopes

Safety, Health, Environment and Regulatory Manager

5 a

Caro Phillip, tenho um aparelho de raio x no meu laboratório aqui na mineração, devo pagar insalubridade ou este raio x e diferente dos existentes em hospitais e clinicas medicas.

Phillip Patrik Dmitruk

PROFESSOR (Whatsapp: + 55 11 95987-8833)

8 a

Não tratamos aqui de fontes com elevadas doses aplicadas nos pacientes, mas a risco direto de exposição a fontes radioativas e sua ação é de risco e perigosa e cabe a exemplo de outras áreas a utilização por pessoas especialmente treinadas e capacitadas. E particularmente classifico como um risco que implica na aplicação da periculosidade, posto que há uma soma de fatores que podem provocar exposição e contato direto com fontes radioativas e materiais tóxicos e que podem não imperar como controle do IOE.

Phillip Patrik Dmitruk

PROFESSOR (Whatsapp: + 55 11 95987-8833)

8 a

Obrigado pelo retorno, a priori conhecer e diferenciar as circunstâncias em que esta inserido o conceito de insalubridade e de periculosidade nos dá um viés para pratica correta em proteção e higiene das radiações. As exposições radiológicas são e devem ser de controle de quem opera os equipamentos emissores de raios X. Na radioterapia trabalhamos com fontes seladas onde não há contato direto com o material radioativo e os aceleradores lineares estão substituindo a gamaterapia com uso de fontes de Cobalto-60 e na braquiterapia utilizamos as fontes de Iridio. Na medicina nuclear as fontes não são seladas e a risco de exposição a radiação gama e beta, bem como o risco de contato direto com fontes radioativas não seladas, tais como os Isotopos do Iodo, Samário e Tecnécio entre outras em menor volume. Caso muito particular de fontes não seladas em que o planos de proteção radiológica deve prever o uso e descarte correto destas fontes de radiação ionizante.

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