v. 1, n. 1

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Institucionalidades


A crise política envolvendo os três poderes da república tem tomado boa parte do noticiário. E não vejo como poderia ser diferente, tendo em vista a sua configuração e a sua natureza. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 8/2021 - a chamada PEC das decisões monocráticas do STF - foi originalmente apresentada em 2021 pelo Senador Oriovisto (Podemos/PR). Outras PEC's direcionadas à mesma corte estão represadas no Parlamento, apresentando qualidade diversa.

Muitos argumentos têm sido mobilizados em torno dessa discussão. Alguns mais passionais, outros menos. Uma parcela da audiência toma partido em prol do STF, outra pelo Senado. Há, inclusive, os que querem descartá-la sob o argumento de que ela seria um PEC bolsonarista?! Salvo engano, a prestigiada jornalista Miriam Leitão vai nessa direção.

Fato é que poucos analistas têm se feito uma pergunta bem simples: o texto da PEC, ao fim e ao cabo, contém elementos que desestabilizam a nossa democracia? Dito de outra forma, a modulação realizada sobre as decisões monocráticas retira poderes do Supremo Tribunal Federal?

O texto da PEC é bem redigido, seu escopo é bem delimitado e modula as decisões individuais apenas para derrubada de decisões colegiadas de outros poderes. Uma leitura atenta e desapaixonada do texto vai revelar o equilíbrio que predomina no documento. Logo, a aprovação da PEC em si não favoreceu o bolsonarismo, mas a reação intempestiva do Supremo sim.

Os próprios ministros do Supremo parecem não estar totalmente seguros quanto a isso, possivelmente por não terem se debruçado analiticamente sobre ela e já terem vindo a público de maneira agressiva e pouco polida. O ministro Barroso, atual presidente da corte, afirmou inicialmente que a PEC traria pouco impacto ao cotidiano do STF! Seria, portanto, inócua. Entretanto, as reações intempestivas de Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes vão em sentido oposto.

Mesmo que a PEC fosse uma "provocação" do Senado à corte, como dizem os ministros do STF, então podemos dizer que eles caíram na armadilha feito patos!!! Ainda que vários articulistas tenham saído em defesa do judiciário no debate público, o desgaste desse poder tem maior amplitude, pois já vem de algum tempo e não se relaciona apenas com o campo bolsonarista.

O STF está na berlinda por méritos e deméritos próprios. Destaco três pontos mais recentes…

  1. Protagonismo exacerbado é feito ao atropelo da legalidade; o STF em diversos momentos realizou interpretação para além da lógica, do direito e do bom senso. Mesmo os maiores especialistas nos temas em discussão, alguns deles defensores costumeiros da corte, não titubearam em apontar a existência de ativismo judicial.
  2. A concentração do julgamento dos réus do 8 de janeiro na corte. Além de ser uma afronta ao ordenamento do nosso sistema jurídico, tendo em vista que o STF foi alvo dos eventos, a dinâmica dos julgamentos tem atropelado o Direito de Defesa dos réus, o que levou a um contencioso com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Não creio que, em sã consciência, alguém atribua à ordem qualquer indício de adesão ao bolsonarismo. Muito ao contrário, pois a instituição cerrou fileiras com o STF e muitas outras na luta contra a tentativa de golpe. Não é, como vários ministros querem dar a entender, que a corte foi a única defensora…
  3. O fator “Alexandre de Moraes”: frequentemente envolvido em polêmicas, com frequência as respostas do ministro são marcadas por um ethos antirrepublicano. O episódio do aeroporto, a bem da verdade, é mal menor, por incrível que pareça. Na quinta-feira, dia 23/11/2023, o ministro saiu-se com uma fala irônica, incompatível com a formalidade do rito, contra a OAB ("Eu vou repetir novamente e a OAB vai lançar outra nota contra mim falando que eu não gosto de direito de defesa [...] Então vamos fazer a festa do Twitter e das redes sociais [...]").

Acima apenas três elementos que contribuem para o desgaste. Os deméritos têm se sobressaído na percepção da opinião pública. A reflexão dos magistrados deveria se concentrar nesse aspecto. Os méritos, no entanto, ficam ofuscados por essas polêmicas sem sentido. A imagem pública da corte está arranhada, sobretudo, por atitudes e comportamentos de seus integrantes.


Expediente


Editor-responsável: Prof. Dr. Márcio Santos de Santana

Contato: msantana@uel.br

Uma publicação do Grupo de Pesquisa [Theoria/Philosophia] Estudos Interdisciplinares em Teoria e Filosofia da História


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