A inteligência artificial é capaz de criar conteúdo de marca? Estaremos todos demitidos?
Imagem gerada no MidJourney com o prompt: imagem minimalista para artigo sobre inteligência artificial e criatividade

A inteligência artificial é capaz de criar conteúdo de marca? Estaremos todos demitidos?

A inteligência artificial generativa foi um dos assuntos mais comentados no #SXSW deste ano e parece tocar o paradoxo que a tecnologia traz na sua premissa: por um lado, o fascínio que a ferramenta possui com promessas de simplificação e desoneração de tarefas; e, por outro, o temor de usos escusos, mal mapeados quando ela é criada e que pode representar um risco à humanidade.

Para além de qualquer extremo, comecei a me questionar sobre o uso da #IA dentro do universo que faço parte, o de #criatividade e #estratégia para marcas. Mais especificamente, estou investindo meu tempo para entender quais são as possibilidades e sua aplicabilidade no processo criativo, de criação de conteúdo para o Twitter - e como evoluímos nossa entrega a partir daí. 

Para isso fiz alguns testes, usando como exemplo (1) uma marca de chocolates cujo posicionamento fala sobre reviver momentos doce da infância e (2) uma marca de banco sólida e tradicional, que quer falar com uma audiência Gen Z. Testei a parte textual no ChatGPT AI e a imagética no Midjourney , Mage.Space e Playground AI. Aprendi 4 coisas com esses testes: 

(Importante: as reflexões e conclusões que vou colocar aqui são totalmente empíricas e, por isso, vão precisar ser testadas com mais recorrência e disciplina.)


1. As IAs atuais não são criativamente autônomas.

Quando o comando (prompt) é mais generalista, as IAs ainda fracassam. No caso do Chat GPT, depois de algumas interações, onde você municia a ferramenta com mais exemplos, as respostas começam a ficar mais interessantes. Os resultados foram melhores quando pedi algo mais macro, como um calendário de tweets para a marca de chocolates. Os resultados não foram bons quando eu pedi exemplos de textos que evidenciassem o posicionamento da marca (reviver momentos doces da infância):

Quem disse que ser adulto é chato? Com nossos chocolates, você pode voltar no tempo e se divertir como uma criança novamente! 🍫 #VivaOQueHáDeMaisGostoso

A vida é muito curta para não aproveitar os momentos mais gostosos! Experimente nossos chocolates e reviva as lembranças mais doces da sua vida. 🍫 #DocesLembranças #RevivendoMomentos


No caso das ferramentas de IA para imagens, o problema se acentua. Aqui, como o prompt ainda é textual, há uma limitação de entendimento e até uma "subjetividade". Quando pedi uma imagem de um chocolate humanoide num campo verde, uma das imagens que o MidJourney devolveu foi essa aí embaixo. As que recebi nas outras ferramentas foram lamentáveis. Mas aqui eu sabia que estava testando o lado "criativo" da IA.

Não foi fornecido texto alternativo para esta imagem
Imagem criada no MidJourney para prompt: "chocolate humanoide num campo verde"


2. As IAs são literais.

Coloquei a subjetividade entre aspas no item anterior porque é, de fato, um contrassenso dizer que uma inteligência artificial possui subjetividade, freudianamente falando. E isso fica bastante evidente quando é dado um comando para as IAs e você começa a colher as primeiras respostas.

Para o caso do banco, pedi alguns tweets que respondessem ao desafio de falar com a audiência Gen Z, focando na pluralidade de produtos e serviços, em contraposição à fintechs e novos entrantes na categoria. Disse que o posicionamento desse banco era "aqui você tem tudo" e os tweets deveriam elucidar isso. Alguma das sugestões abaixo:

Quem disse que bancos tradicionais não são modernos? Aqui, nós temos tudo o que a Gen Z precisa para gerenciar suas finanças. #AquiVocêTemTudo

Para nós, não existe "serviço básico". Com o nosso banco, você tem acesso a uma variedade de serviços financeiros. #AquiVocêTemTudo

As fintechs são ótimas, mas você já experimentou ter tudo em um só lugar? Venha para o nosso banco e veja a diferença. #AquiVocêTemTudo


Achei tudo bem óbvio e pedi exemplos mais criativos:

Se você é da Gen Z e quer um banco que te entenda, venha para cá! Aqui, você tem tudo para alcançar seus objetivos financeiros. 🚀 #AquiVocêTemTudo

As fintechs até tentam, mas não têm a variedade de serviços que a gente tem. Aqui, você tem tudo para fazer sua grana render! 💰 #AquiVocêTemTudo

No nosso banco, você não precisa se preocupar em ter várias contas em diferentes instituições financeiras. Aqui, você tem tudo em um só lugar! 🙌 #AquiVocêTemTudo


Chega a ser engraçado como o Chat GPT interpreta como um texto pode ser mais criativo. Nesse caso, a IA entendeu que ao colocar emojis e trazer um call-to-action mais direto ela estaria cumprindo seu objetivo.


3. As IAs parecem funcionar melhor após estímulos criados por criativos.

Um dos testes que temos feito aqui no time de Next, no Twitter, é alimentar uma IA com textos criados por redatores e pedir uma variação sobre eles. De novo, não há nada que venha de inovador e revolucionário, mas os resultados ajudam naqueles momentos onde é destravar a criatividade.

Fiz um outro teste com o Chat GPT, onde forneci o seguinte texto: "Com a conta internacional do nosso banco, você tem mais liberdade financeira: usando o cartão você evita andar com dinheiro em espécie e não paga IOF no momento da compra! Tudo isso sem taxas de manutenção ou anuidade." Pedi algumas variações e depois de duas rodadas, onde falei para a ferramenta ser mais criativa e usar memes, essas foram algumas das respostas que vieram:


Você quer liberdade financeira? O nosso banco tem TUDO! Você pode usar nosso cartão internacional sem se preocupar com dinheiro em espécie ou IOF. E sem taxas de manutenção ou anuidade! É tipo assim:

[Meme: Imagem de um cachorro pulando de alegria com o texto "TUDO ISSO?!"]


Quer viajar sem preocupações? Com a conta internacional do nosso banco, você não precisa levar dinheiro em espécie e ainda economiza com o IOF! E não tem taxas de manutenção ou anuidade! Vem com a gente nessa aventura!

[Meme: Imagem de uma pessoa pulando de paraquedas com o texto "Vamos nessa!"]


No caso das imagens, ainda estamos longe do ideal. Mesmo fornecendo as imagens de uma campanha, os resultados ficam muito aquém do esperado e as variações são muito piores do que a original. Aqui, aparecem aberrações e formações inexplicáveis. Existe um trabalho que ainda precisa ser feito de maneira extenuante.


4. As IAs possuem vieses.

Muito já foi falado sobre os vieses algorítmicos e esse sempre foi um ponto de dor das grandes techs. Existem casos emblemáticos na ferramenta de busca do Google, exaustivamente discutidos, e o tema já virou documentário na Netflix. E isso aparece aqui também.

Assim como as respostas dos #algoritmos tendem a priorizar o que é o "padrão" e tudo fora dele representar algo feio e ruim, nas IAs, sobretudo nas de imagem, isso também aparece. Quando pedi para o Mage.Space criar uma imagem de uma criança comendo chocolate, advinha qual o fenótipo da criança retratada?

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Imagem criada no Mage.Space para prompt: "criança comendo chocolate"


Como podem ver, aqui também existem aberrações na imagem, mas quando pedi a mesma coisa para o Playground, o resultado foi bastante pitoresco:

 Voltei ao MidJourney, onde estava tendo resultados mais consistentes e pedi a mesma coisa: imagem de uma criança comendo chocolate. Além de resultados estranhos, algum deles me atravessaram de um jeito incômodo, me pareceram racistas:

Não foi fornecido texto alternativo para esta imagem
Imagem criada no MidJourney para prompt: "criança comendo chocolate"


Somos nós que empregamos as IAs, ainda.

Sem dúvida, as IAs generativas já podem nos ajudar criativamente, hoje, mas ainda precisam de muito treinamento e de aperfeiçoamento. Voltando ao assunto inicial deste artigo, me parece que os redatores vão se beneficiar mais das ferramentas por ora e talvez num futuro sejam mais "diretores de redação", no sentido de direcionar as IAs, as alimentando para respostas mais interessantes e que minimamente tenham sua assinatura criativa.

No caso dos diretores de arte, a lacuna é muito maior e as IAs terão que ser capazes de eliminar as aberrações, os vieses e endereçar questões de diversidade. A emergência do formato de vídeo que observamos hoje fala sobre a habilidade dos conteúdos visuais de capturar a nossa atenção de um jeito mais eficaz e, aqui, explica porque ainda é tão difícil contar com a IA para criar imagens: a estética é complexa e nunca esteve tão associada com a ética.

As possibilidades são diversas e me animam muito, mas, é claro, nem tudo são flores e muito em breve precisaremos aprofundar o debate sobre propriedade intelectual sobre o que é criado com o apoio das IAs - o que é do homem e o que é da máquina?

Fernando Stacchini

Technology/ Digital Business/ Intellectual Property at Motta Fernandes

1 a

👍👍👍

Adriano Herrera

Insights y Estrategia | Investigación de Medios y Mercado | Creatividad y Datos

1 a

Obrigado por colocar luz e razão sobre o tema, Rafa! 💫

Rafa, fiz questão de compartilhar seu artigo, não só no meu perfil, mas com meus parceiros de trabalho. Na empresa que trabalho temos pesquisado e testado bastante sobre as I.As, sem sombra de dúvidas nos proporciona experimentos surpreendentes. Mais ainda faltam alguns feelings...

Douglas Godoy

[Freelance] Diretor de Estratégia | Brand Strategy | Creative Effectiveness

1 a

Excelentes reflexões, amigo 🌟

Abel Melo

Eu ajudo marcas a falar a língua dos GAMERS.

1 a

Rafa, achei muito boa a forma que apresentou seus testes. Cheguei em uma conclusão parecida ao testar eu mesmo. Acho que com o tempo teremos I.As mais segmentadas e que serão melhor para fazer certos tipos de trabalho (como muitas ferramentas específicas que temos hoje). Acho que hoje uma barreira foi quebrada em termos de acesso a arte como ilustração, código e até produção fotorealista. Mas a linguagem necessária para se comunicar com a I.A ainda é ruim, hoje eu vejo mais o surgimento de um profissional chamado “cara do prompt e da I.A” do que profissões desaparecendo. Pra mim um Redator e um D.A hoje ganharam esteroides, e não um concorrente direto. Ótimo conteúdo.

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