A Internet está chata
Tão propagada como inovação, símbolo de uma nova geração, responsável pela transformação digital e mãe da disrupção – a internet está cada vez mais previsível e chata.
Está se transformando numa televisão moderna. Tão cheia de anúncio, que fica impossível você não ser bombardeado no seu feed por coisas que você não quer comprar.
Pior do que isso, quando aquele vídeo interessante é interrompido igual no tempo do “Repórter Esso” – dá vontade de quebrar o smartphone e imediatamente passar a odiar aquela maldita marca.
São tantos e-mails marketing invadindo a caixa postal, que me faz lembrar a antiga caixa de correio cheia de papeis e malas direta da Editora Abril sugerindo assinatura de revista – “Não perca a última chance”.
O inbound marketing virou uma ferramenta cheia de falsas promessas, com conteúdo fúteis e de conhecimento raso. Sempre com objetivo óbvio de capturar seus dados e informações.
As veias abertas do consumismo e da autopromoção tomaram conta das redes sociais. Como galinhas poedeiras, a cada ovo uma festa, um post e viva a hipocrisia das vidas e empresas perfeitas.
Fernando Pessoa, um dos maiores poetas da língua portuguesa, parece ter vivido os tempos do Facebook, Instagram, Linkedin e outras redes sociais. Através do seu heterônimo Álvaro Campos, escreveu o Poema em Linha Reta, o qual destaco alguns trechos abaixo:
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita.
(...)
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma covardia!
Não, são todos o ideal, se os ouço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
(...)
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
Depois de Fernando Pessoa não me resta muito a dizer.
São tantas métricas e algoritmos, as informações parecem ser tão precisas, que eu fico perdido diante tantas afirmações.
Quem poderá nos salvar?
Marco Aurélio Moraes Rettore, 05 de maio de 2019.