João e o Empreendedorismo Caboclo
João sempre foi um sujeito destemido. Marcado pela dor e curiosidade. Nascido num rincão esquecido; em sua infância faltou uma família, religião e educação.
A sociedade formal nunca o tocou, a não ser com um cassetete. Na sua escola despreparada, ele ensinava mais que aprendia. E como era de se esperar, na sua vida recebeu mais informação e menos formação.
Tinha potencial e inquietude. Era um peixe oceânico encurralado numa enseada com peixes de outras cores. Sentia que todas as explicações estavam muito além do seu universo. E sem respostas satisfatórias, ganhou o mundo.
Começava a saga do seu empreendedorismo, nato e sem polimento.
Partiu para a capital, a sua primeira parada. Logo na chegada, ouviu uma proposta.
E através do seu senso de oportunidade, enxergou um caminho a seguir. Ir para onde as coisas acontecem! Onde gira dinheiro, trabalho e consumo. Chegou ao destino, e tudo aquilo não parecia real. Via muitas oportunidades, todas piscando, feito luzes de Natal. Maravilhado, traçou planos e logo começou a executá-los.
Gravitando como satélite de uma sociedade, vivia razoavelmente na sua condição de assalariado, e como tal, gastava até o que não tinha em ambientes mundanos. A certa altura e já com uma networking formada, ouvia muitas ideias e propostas. Eram muitos negócios da china. Mas nenhum tão atrativo quanto a de um camarada. Um cara estrangeiro , cheio de afinidades com João. E eram tantas, que até pareciam ser da mesma família.
Plano era com ele mesmo. Após muitas tentativas frustradas de seguir com sua vida enfadonha, e sempre esperando, sem nunca chegar a tal ajuda do estado, pegou todas as suas economias e investiu em uma produção agrícola, para atender consumidores heterodoxos, em um lado escuro do mercado.
Muito criterioso, e seguindo altos padrões de qualidade, logo aumentou seu marketing share e engoliu toda a concorrência. Ampliou sua rede de contatos, e com isto portas se abriam facilmente, e numa dessas portas, acabou por atravessar para o lado do holofote.
Deixando-se levar pelos ganhos rápidos e o glamour, transitou em ambientes que não tinha domínio, e sem perceber ramificou o seu negócio. Com o foco dividido, perdeu força e caiu na malha.
Viveu seu inferno astral pela primeira vez. Sem honra e esmigalhado, decidiu entrar de vez no submundo dos negócios, atuando da forma que mais dominava. A vida sem lei.
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Agora era um empresário sem pudores, destemido e temido por todos os segmentos
da sociedade. Mas - sempre há um mas, ele se deixou levar pela emoção e novamente mudou o foco dos negócios, influenciado pela nova equipe que havia formado. Confundiu trabalho com relacionamento afetivo e optou por voltar para a pseudo-segurança de um emprego.
Assim seguia sua vida, até o dia em que a sua fama lhe trouxe um investidor, disposto a aliar muito capital a sua expertise. Disse não para aquele empreendimento, revoltado com tamanha falta de ética e preceitos. Mesmo não sendo ele um Santo!
Como era de se esperar, tudo aquilo mexeu com João, que fugindo da sua aptidão maior, acabou por rever sua trajetória e descobriu que não se pode deixar de lado suas vocações.
Mais uma vez seu tino apitou. Buscou na sua rede de contatos um parceiro que atendesse aos seus padrões de qualidade e confiabilidade. A esta altura o negócio de importações do seu quase parente ia de vento em polpa. João agregou capital e logo formaram uma joint venture.
Não se deve negligenciar o poder de um benchmarking bem feito, e muito menos a falta de um!
Totalmente afundado no dia a dia do seu negócio, sem olhar para o mercado e para sua vida pessoal. João descobriu tarde, o quanto havia perdido de área, clientes e colaboradores para um forte concorrente com muito mais foco, comportamento dúbio, sem regras para atuar no mercado e decidido a triturar o seu negócio.
Não estar completamente focado no seu negócio, não ter desde sempre os posicionamentos corretos, deixa o empreendedor despreparado para as turbulências e certas conjunturas. Desta maneira a saída mais fácil é quase sempre a mais perigosa, e desastrosa.
Assim sendo, João partiu para o embate direto com seu maior concorrente. O algoz que surrupiou seu mercado e parte da sua equipe. Partiu para um duelo, esquecendo-se de que naquele mercado não havia ética.
A regra era apenas sobreviver e aniquilar o concorrente a qualquer preço. Os consumidores assistindo aquela guerra sangrenta, apenas aplaudiam e se beneficiavam de uma promoção aqui, uma queima de estoque ali. Quando menos se esperou, um ex-colaborador correu para socorrer, mas já era tarde. Só faltava o tiro de misericórdia. Bancarrota total! O seu público não acreditava ao ver na TV a história de um império desmoronando.
João todo santo dia sonhava em construir algo grande, que trouxesse benefícios para sua gente, e se fazer ouvir por quem comanda a sociedade. Sonhou alto e realizou voos curtos. Mas assim acaba sendo a via crucis de nove entre dez empreendedores sem formação. Acabam virando Cristo