A lei tributária e o nó da inovação tecnológica

A lei tributária e o nó da inovação tecnológica

Há uma série de razões técnicas e econômicas que influenciam fortemente o atual estado da inovação em nosso país, mas por ora nos concentraremos em algumas falhas na legislação que, se suprimidas, poderiam contribuir para uma melhoria no ambiente de negócios de uma forma geral.


Importante mencionar, inicialmente, que sob a ótica do incentivo fiscal a legislação brasileira é relativamente eficiente, comparativamente à de outros países. Dados do relatório R&D and Tax Incentives da OCDE, de 2013, demonstram que a Lei do Bem põe o Brasil na 9ª posição quanto ao volume de subsídios. Contudo, em um cenário de prejuízos – o que normalmente ocorre em períodos de crise – a legislação brasileira nos leva à 20ª posição, por não prever a possibilidade de diferimento do incentivo para outros exercícios. Ou seja, em ambiente adverso de perdas, quando justamente mais se precisa inovar, não há qualquer incentivo à recuperação do necessário investimento por parte de quem decide empreender com inovação!


Ainda assim, deixando de lado essa falha na legislação, resta a pergunta do porquê do setor privado brasileiro apenas ter investido 0,03% do PIB em inovação nesse mesmo ano (último disponível), e ainda apresentar índices baixíssimos de investimento até os dias atuais.


Há várias respostas. Sob a ótica tributária, a Lei do Bem permite às empresas adotarem dois grandes tipos de benefício. Aqueles do Art. 17 e 19, e o benefício do art. 

19-A, esse último denominado de “superdedução”.


As empresas que desejam inovar submetem seus projetos ao MCTIC, ao tempo em que usufruem do benefício fiscal. O órgão estatal ao final do período os avalia quanto aos requisitos metodológicos e de aderência às normas técnicas aplicáveis. Caso a autoridade responsável discorde do conteúdo do seu projeto, o contribuinte estará imediatamente sujeito a questionamentos por parte da Receita Federal.


Surgiram vedações juridicamente discutíveis, principalmente aquelas relativas à contratação de entes privados para qualquer atividade relacionada à inovação, exceto quanto à Universidades, Inventores Independentes ou Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs), e nesse último caso apenas permitida a contratação aos casos em que os riscos e a gestão dos projetos fossem exclusivamente do contribuinte, ou seja, que todo o projeto fosse executado dentro da empresa.


Aqueles que decidissem por tomar a “superdedução” do art. 19-A da Lei do Bem, apenas poderiam fazê-lo pela contratação de ICT’s públicos, em projetos submetidos à regulação ex ante, após submissão prévia do projeto à comitê tripartite formada por três entes governamentais, MCTIC, MDIC e MEC – talvez um exemplo clássico do excesso de presença estatal.


O resultado é que apenas se tem notícia de um único projeto executado segundo esse modelo no Brasil, na Ilha do Fundão, e ainda assim em pequena escala. Modelo este que poderia resultar em um real incentivo para que empresas globais trouxessem seus centros de pesquisas para o nosso país.


O legislador, entretanto, sensível a essa situação, tentou resolver o impasse por meio do novo Marco da Inovação, lei nº 12.243/16, ao permitir a contratação de ICT’s privados para a execução dessa pesquisa, porém, o fez pela metade. Esqueceu-se, ou não foi politicamente possível endereçar a questão da submissão prévia dos projetos a um comitê; e quanto à regulação do próprio ICT, não solucionou questões tais como a possibilidade de pagamento de incentivos sobre os resultados em um ente privado – ainda que sem finalidade lucrativa.

Entendemos que em todos os casos a remoção de pelo menos parte desses nós seria possível por regulação infralegal, ou como dizem os economistas, por meio de medidas microeconômicas.


Um decreto presidencial poderia determinar que seriam passíveis de submissão ex ante apenas os projetos a serem executados por meio de ICT’s públicos, porque apenas nesses casos estaríamos diante da hipótese de utilização de recursos públicos para benefício de ente privado. Ainda assim, seria possível a fixação de margens para o caso de utilização do benefício por meio de ICT´s privados, que por sua vez resultariam na formação de preços mínimos para a transferência de propriedade intelectual. Paralelamente, incentivariam a destinação de parte desses recursos para pesquisas por meio de ICT’s públicos, tal como ocorrem em outros setores regulados.


Concluindo, o que se pretende aqui não é iniciar um novo ciclo de regulação à inovação, pois tempo é justamente o que o Brasil não tem nesse momento de crise econômica e de desindustrialização acelerada. Pretende-se justamente desregular, deixando os agentes de mercado livres para investirem e para compartilhar a inovação, para livremente se associarem a ICT’s privados, criados para fins específicos, ou ICT’s privados sem fins lucrativos patrocinados pelo setor privado com o interesse de inovar em soluções para produtos e processos.


O Brasil não pode mais se dar ao proveito de desperdiçar o tempo. A Indústria 4.0 bate a nossa porta, a “Internet das Coisas” está avançando nos países desenvolvidos. Temos um bom modelo legal de incentivos à inovação que precisa de poucos mas significativos ajustes, que proporcionem ao setor privado a segurança jurídica necessária para que seus projetos saiam dos mais recônditos escaninhos e virem realidade.

Fonte: Valor Econômico


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