Leis de direitos autorais da UE deviam ser copiadas pelo Brasil
Os bucaneiros do Vale do Silício pilham conteúdo alheio para incrementar os seus bilhões

Leis de direitos autorais da UE deviam ser copiadas pelo Brasil

A UE trata as empresas de tecnologia com rigor cada vez maior. No último dia 15 de abril, duras leis de proteção aos direitos autorais foram aprovadas pelo parlamento europeu. A partir de agora, empresas como Google, Facebook, Instagram e Twitter são legalmente responsáveis pela pirataria do trabalho de músicos, escritores e jornalistas. Espera-se que a legislação seja copiada por outros países, em especial o Brasil.

Protecionismo econômico sempre dá bobagem, especialmente num país burocratizado como o nosso, que tem estado demais e governo de menos. No entanto, os novos conglomerados do Vale do Silício agem como bucaneiros do século 17, pilhando riquezas no planeta inteiro para deixar a Califórnia cada vez mais rica. Alguma coisa tem de ser feita. Notícias são copiadas e disponibilizadas de graça na rede, enquanto empresas jornalísticas quebram e desempregam milhões. A revista “Playboy”, que dirigi durante sete anos, perdeu a razão de ser quando seu principal produto, o ensaio de capa, passou a ser roubado e distribuído gratuitamente todo mês via Google, Messenger, e-mail e WhatsApp. A mídia “tradicional” cometeu muitos erros, é claro. No caso da “Playboy” brasileira, a excessiva dependência das celebridades, num modelo de negócios dispendioso e refém do mercado monopolizado. Outro erro fatal, esse da mídia como um todo, foi disponibilizar conteúdo de graça na internet na crença de que a rede seria um produto elitista para sempre. 

Mas tudo isso já é história. 

Hoje, o importante é lembrar que Google, Facebook, Twitter e Instagram, entre outras redes sociais, são empresas de mídia, embora não produzam conteúdo algum. Quando uma editora derrete, como aconteceu com a Abril, o share não vai para concorrência. Ele simplesmente desaparece para enriquecer os megabilionários digitais. Estatísticas recentes mostram que 82% de toda a riqueza produzida mundialmente está nas mãos de 1% da população. E entre os 10 homens mais ricos do mundo, cinco vieram do Vale do Silício. 

O pior é que a destruição da mídia como espaço de ideias e debates faz proliferar os extremistas. Mark Zuckerberg pagou US$ 22 bilhões pelo WhatsApp em 2017. Vinte e dois bilhões de dólares! Com todo esse dinheiro, é imoral que a plataforma não disponha de equipe ou algoritmo para filtrar fake news e impedir a ascensão política dos radicais. 

Em entrevista para a Folha (15/04/2019), a escritora e palestrante americana Kate O’Neill, especializada na relação entre a tecnologia e o desenvolvimento da humanidade, é taxativa: “É preciso responsabilizar plataformas como Facebook, Twitter, Google e outras redes sociais que definem o conteúdo que é mostrado a população”. 

É fato. Uso Facebook, adoro o Twitter e não vejo como o mundo moderno possa funcionar sem o Google. No entanto, o progresso feito à custa da destruição de empregos, empresas e da própria democracia já não pode mais ser chamado de “progresso”. Que a regulamentação imposta pela União Europeia seja apenas o começo da história. 

(publicado originalmente no Portal Imprensa)



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