Lições inesperadas

Na última newsletter do Casa Trabalho Casa, partilhei que tinha encomendado um pequeno instrumento musical chamado Kalimba para brincar. "Brincar é uma atividade que te traz alegria, sem estar associada a um resultado específico."

Enquanto aprendia a tocar, reparei que o processo de aprendizagem da Kalimba era muito semelhante ao de outras competências, especialmente as soft-skills, que costumo ensinar.

 O que já sabemos pode dificultar a aprendizagem de algo novo

Na Kalimba, as notas estão organizadas de forma diferente do piano, e músicas que tocava no piano surgem em tons distintos. Este conhecimento prévio acabou por criar resistência: por exemplo, queria tocar "os parabéns" começando em sol, mas a minha mente estava programada para começar em dó, bloqueando o processo.

Este fenómeno aplica-se a qualquer tipo de aprendizagem. Muitas vezes, acreditamos que a forma como sempre fizemos as coisas é a correta, o que nos impede de experimentar algo novo. Outras vezes, precisamos de despender energia extra para contrariar o hábito de fazer as coisas "como sempre fizemos".

Vejo este padrão repetidamente, por exemplo, quando tentamos adotar novas estratégias de organização pessoal. Ficamos presos em pensamentos como "eu sou assim", "isto não funciona" ou "não posso fazer de outra forma", e acabamos por cair nos velhos hábitos que, por serem familiares, exigem menos esforço e se manifestam naturalmente.

 O João, um cliente que queria melhorar a gestão de tempo, resistia a mudar seu método de planeamento mental, acreditando que "já tinha o seu método". Mas como ele próprio admitiu, esse método não estava a funcionar. Ao experimentar novas abordagens e ajustá-las, percebeu que, apesar do esforço inicial, a nova organização o estava a ajudar a cumprir prazos, a sentir-se mais confiante em dizer não, e a levar menos trabalho para casa.

O feedback imediato é essencial para melhorar

Tocar um instrumento oferece feedback instantâneo. Basta uma distração para errar uma nota. Esse erro é um alerta para voltar atrás e corrigir.

O erro torna-se uma ferramenta útil, não um obstáculo. Continuamos a praticar sem pensar "não sou boa nisto" ou "isto não funciona". Sabemos que o caminho é a prática.

Curiosamente, no desenvolvimento de soft-skills, nem sempre adotamos esta atitude de curiosidade e experimentação. Se agirmos de determinada forma e o resultado não for o esperado, podemos perguntar: "Como posso ajustar?" ou "Quando posso tentar de novo?"

 A Sara, uma das minhas clientes, queria reduzir o tempo gasto a dar suporte à equipa que geria. Começou a procurar dar instruções mais claras, mas sem grandes melhorias. Então, passou a fazer perguntas para garantir a compreensão, o que lhe permitiu identificar lacunas e mal-entendidos, corrigir a sua comunicação, e com isso reduziu significativamente o tempo de acompanhamento.

Repetir as partes mais difíceis lentamente

Aprender um instrumento implica começar por músicas simples, e repetir algumas passagens mais difíceis, por vezes de forma mais lenta, e ir aumentando a velocidade e a complexidade.

Este princípio aplica-se a outras áreas. Quem quer melhorar, por exemplo, na gestão de conflitos, pode começar por praticar em contextos mais fáceis.

 Com o Tiago, um cliente que queria melhorar a sua capacidade de lidar com conflitos, começámos por praticar em situações menos intensas. Ele refletiu sobre possíveis desentendimentos com colegas e ensaiámos respostas assertivas. Esta prática preparou-o para gerir conflitos reais de forma mais eficaz.

Apesar de só querer brincar, surgiram “resultados” adicionais na forma destes insights. Mas conta na mesma como brincadeira! É tão bom quando aprender é também uma fonte de diversão. 

E deixo a sugestão para refletires como podes aplicar estes insights a uma soft-skill que estejas a desenvolver. Bons treinos!

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