Ligando pontos

Ligando pontos

No final de 2010 eu e meu sócio estávamos planejando a mudança da Mkt Virtual para um novo escritório, que era grande demais já naquela época. Um espaço de 450m2, do qual eu precisava de apenas uns 300. Com espaço sobrando, minha primeira ideia foi: "porque isso aqui não vira um espaço compartilhado para as pessoas trabalharem daqui?". Na época eu nem sabia que a palavra coworking existia.

Como boa curiosa que sou, fui ver se existia algo do gênero em São Paulo. Acabei conhecendo o The Hub, que nasceu em Londres, já estava em outros lugares do mundo e anos mais tarde deu origem ao The Impact Hub.

Era um dia ensolorado em Sampa e eu aproveitei, com meu Nokia E5 em mãos (quem nunca?), para fazer uma busca no Google e descobrir onde o The Hub ficava. Entrei em um táxi (lembrando que era um mundo sem aplicativos de mobilidade) e fui até lá. Sem marcar. Só com a cara mesmo.

Eu fiquei maravilhada com o conceito do The Hub pelo site e logo pensei:

"precisamos de uma parada assim em Santos".

Na breve visita, fui recepcionada por uma moça argentina chamada Angelica (se minha memória estiver funcionando) e fiz a pergunta:

"Como posso ter um The Hub em minha cidade?".

A Angelica deve ter me achado meio maluca e respondeu que eu precisaria descobrir outros cinco empreendedores interessados em ter uma estrutura do The Hub na cidade. E completou: "Eu só conheço um, o Rodrigo. Liga pra ele".

Peguei o contato. Liguei. E acabei conhecendo o Instituto Elos, do qual o Rodrigo é um dos fundadores. Eu me apaixonei pelo Elos e me encantei de ver algo tão poderoso em Santos, que gerava impacto em jovens do mundo inteiro. E eu nunca tinha ouvido falar.

Na visita ao The Hub não saiu um coworking em Santos. Eu e o Rodrigo falamos sobre o assunto, mas, se o próprio The Hub em São Paulo ainda não tinha uma estrutura sólida (para você ter uma ideia, os caras funcionavam sem ar-condicionado) e o mercado em Santos ainda era incipiente para algo do gênero. Mas comentei com o Rodrigo sobre outra ideia: montar um espaço para compartilhamento de conhecimento e levantar eventos solidários, treinar pessoas, gerar intercâmbio de conhecimento.

Com um incentivo moral imenso do Elos, a Mkt Virtual abrigou o TIP do início de 2011 até abril de 2021. Pouca gente sabe dessa história, mas o TIP nasceu com a intenção de ser o primeiro coworking da região. E acabou virando um espaço para educar a comunidade interessada na economia criativa em Santos.

De 2011 a 2021

Em 2011, como empreendedora, eu não tive coragem de iniciar um espaço compartilhado em Santos, porque na minha interpretação, o ecossistema ainda não tinha nem quebrado a casca do ovo.

Em julho de 2021 a realidade já é diferente podemos contar com 13 espaços de trabalho compartilhados em Santos. Com o crescimento da economia compartilhada, incluindo coworkings, colivings, aplicativos de mobilidade, hospedagens, entre outros serviços que ganharam o mundo, o mercado amadurece e os consumidores demandam novas soluções.

Além disso os espaços físicos, após a aceleração imposta pela pandemia de COVID-19, não deixarão de existir. Ao contrário do que se falava em abril de 2020, a pandemia expos a importância da qualificação do tempo. Trabalhar em casa trouxe elementos positivos como menos tempo em trânsito, maior convivência familiar e cozinhar a própria comida. Mas efeitos negativos também foram notados: a ausência da interação pessoal, ambientes inadequados para trabalhar, extinção das ideias impulsionadas pelos encontros, volume excessivo de videoconferências e a desaceleração de aprendizagem.

O futuro do mercado de trabalho está sendo definido e a economia compartilhada promete gerar ainda mais impactos nos hábitos e na configuração das cidades. E os espaços compartilhados fazem parte disso. Como protagonistas, inclusive.

Antes da pandemia o relatório (2020) da Coworking Resources apontava um crescimento anual de 21.3% no mercado de coworkings. A Ásia é o continente que lidera o ranking em número de espaços, seguida pela Europa e América do Norte. Em termos absolutos o Brasil possui menos de 2% do total de espaços compartilhados no mundo, ou seja, ainda há muito a ser desenvolvido.

A importância do "terceiro lugar"

Em 1989 o livro The Great Good Place foi publicado pelo sociólogo Ray Oldenburg, trazendo um olhar sobre os locais de encontro ocasionais e sua importância para as cidades. Cafés, espaços comunitários, pequenas livrarias e salões de beleza de bairro fazem parte dos lugares enaltecidos pelo autor.

Ray explica que o primeiro lugar é a nossa casa, onde convivemos e relaxamos em família. O segundo lugar é o trabalho, onde possuímos relações mais formais. E os terceiros lugares são aqueles onde podemos agir, relaxar, sem qualquer premissa ou julgamento, onde temos a liberdade de conversar despretensiosamente. Justamente nesses lugares as ideias fluem, a criatividade é expandidas e grandes revoluções (literalmente) acontecem. O autor cita inclusive a revolução francesa como exemplo: sem os cafés franceses, ela nunca aconteceria.

Coworkings são exatamente um exemplo de terceiro lugar do contexto da nova economia - e é por isso que precisamos de espaços como esses fora das metrópoles. Vale lembrar que quando Ray escreveu o livro, a Internet não era uma realidade e a conectividade ainda era uma fronteira imensa.

Infelizmente há pouquíssimo material em português que trata com profundidade a obra do sociólogo americano, mas o próprio autor explica o conceito do terceiro lugar em vídeo contido neste link.

Coworking em Santos

Em Santos, ainda há um longo caminho para a adoção da cultura de espaços profissionais como serviços (e não apenas como imóveis) e a cultura de espaços compartilhados. Faz parte disso não apenas pensar nos espaços, mas em como utilizar esses locais para serem verdadeiros aceleradores da economia local. Não se trata de negócios regionalizados, mas sim fazer de Santos um verdadeiro pólo de inovação, criatividade e exportação de suas ideias, não de seus talentos como vemos acontecer por muitos anos.

É nisso que que eu e meu time estamos trabalhando agora: o Juicyhub, uma plataforma digital e física focada em acelerar o capital social e econômico das cidades médias e pequenas, começando por Santos.

Fortalecer essas comunidades é um papel super importante na recuperação econômica. Olhar para esse lugar do acesso, do olhar colaborativo e do suprimento do gap das habilidades que temos de um lado e das vagas não preenchidas que temos do outros, tem me desafiado e entusiasmado muito.

E me feito enxergar todos os dias aquela frase do famoso discurso do Steve Jobs em Stanford, em 2005:

Você não consegue ligar os pontos olhando pra frente; você só consegue ligá-los olhando pra trás. Então você tem que confiar que os pontos se ligarão algum dia no futuro. Você tem que confiar em algo – seu instinto, destino, vida, carma, o que for. Esta abordagem nunca me desapontou, e fez toda diferença na minha vida.

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Obrigada Carol, por ter me destacado essa frase.

PS: Se você quiser assistir na íntegra, tá aqui:


Rita Aventurato

TRG - Transtornos Emocionais - Psicóloga | Palestrante | Apresentadora de TV | Escritora || Mentorias e Workshops

2 a

uau! Muito inspirador!

Que incrivel!! Parabéns!!

Haroldo Pereira Jr

Jornalista/ Editor / Coordenador de Mídia

3 a

Ah eu quero.....vamos falar? bj

Wesley Douglas Silva Adão

PMO | Gerente de Projetos | Operações

3 a

Maravilhoso

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