Lista de empresas tóxicas (e o meu burnout)

Lista de empresas tóxicas (e o meu burnout)

Nesta semana viralizou em algumas mídias sociais e grupos de WhatsApp uma Lista de Empresas Tóxicas no Brasil.

Para o choque e muitos - e 0 surpresas de outros -, muitas dessas empresas ganharam o selinho "Great Place to Work" mais de uma vez.

Muitas pessoas acham que oferecer boas condições de trabalho é apenas ter cadeira para o funcionário sentar e computador para o funcionário usar.

Mas essas condições são as que a CLT define mesmo. Se você cumpre esses requisitos, não faz mais do que a obrigação.

Porém, ter um ambiente que é considerado tóxico vai além de condições de trabalho precárias. Ela também passa pela falta de valorização do funcionário e até mesmo assédio moral e sexual.


Experiência pessoal: existem sim outras culturas de trabalho

Quando eu trabalhei fora pela primeira vez e senti como é ser tratada como adulta, eu fiquei deslumbrada e até senti que eu estava fazendo algo de errado.

  • Quando eu tinha consulta, eu podia só avisar o meu chefe e ficar offline. Não precisava apresentar atestado e nem nada. Não precisava nem ficar de olho no celular, pois qualquer problema que acontecesse, ou iria me esperar, ou seria resolvido sem mim.
  • Quando meu voo de volta das férias foi cancelado devido a uma tempestade de neve, meu chefe disse "aproveita o hotel grátis". Não, não teve nenhuma cobrança, urgência, ou culpabilização por algo que eu não podia controlar.

E isso tudo me deixava muito chocada, pois eu estava acostumada com como as coisas funcionam no Brasil.

Passou mal?

Tem que apresentar atestado do médico.

Filho doente?

Atestado do médico.

Perdeu um ente querido?

Atestado de óbito, mas venha após o velório.

Os exemplos listados acima, somados a falta de valorização profissional e respeito dentro do âmbito de trabalho, cansa e faz com que o funcionário se sinta humilhado.

Burnout - não fui a primeira e nem serei a última

Há cerca de um ano e meio eu tive um burnout. Não foi da noite para o dia.

Eu passei alguns anos buscando me provar, fazendo mais do que a função para qual eu estava recebendo, afinal de contas, eu não queria que pensassem que eu era preguiçosa, eu queria mostrar que eu era uma pessoa de valor para a equipe e que sempre tomava iniciativas.

Em alguns ambientes eu fui reconhecida por meus pares e minhas liderenças. Em outros, a minha recompensa foi mais trabalho e mais pressão.

Até chegar em uma equipe onde eu e as outras mulheres precisávamos fazer mais, lidar com desrespeito em um dia e um simples "desculpa, estava muito estressado" na manhã seguinte. - Algo que se repetia pelo menos 2 vezes na semana -, enquanto víamos os homens da equipe sendo tratados como "pessoas que erram e que estão sempre buscando evoluir", ou seja, elas podiam errar. Nós não, nós éramos culpabilizadas pelos erros deles, inclusive.

Como eu era prestadora de serviço, quando eu decidi sair eu tive muito medo.

Medo de não conseguir pagar as minhas contas.

Medo de "ficar queimada" por ter desistido de "uma grande oportunidade".

Medo de acharem que eu fraca e "mimizenta".

Mas eu não podia mais continuar tendo ataques de ansiedade e acordando 04:30am sem alarme e com o coração disparado, como se eu já tivesse muito atrasada para o meu dia.

Então eu entendo quem fica nessas empresas por anos. Entendo mesmo. Dá muito medo mesmo, por isso não é "só sair", ou "só trocar de emprego". Nem todo mundo tem reserva financeira, como eu tenho, ou tem um lugar para morar, como eu tinha a casa da minha mãe.

A coisa ficou tão feia que precisei buscar ajuda médica, pois comecei a ter insônia e taquicardia.

Características comuns das empresas tóxicas

Quando analisei as empresas listadas na planilha de empresas tóxicas, pude identificar algumas características comuns que faz com que elas sejam avaliadas como tóxicas.

  1. Cultura organizacional deficiente ou inexistente: muitas delas enfrentam problemas relacionados à cultura organizacional, onde valores antiéticos, competição desenfreada e falta de transparência prevalecem. Essa cultura pode contribuir para um ambiente de trabalho tóxico, onde os funcionários se sentem desvalorizados e desmotivados;
  2. Falta de investimento no desenvolvimento humano: muitas negligenciam o desenvolvimento e bem-estar de seus funcionários. Isso se reflete na ausência de programas de treinamento, feedback construtivo e apoio psicológico. Funcionários muitas vezes se sentem estagnados em suas carreiras, o que pode levar à frustração e desengajamento;
  3. Sobrecarga de trabalho e baixa remuneração: essa é a carta coringa no Brasil. Em quase todos setores, os funcionários brasileiros enfrentam uma combinação de longas horas de trabalho e remuneração inadequada. A sobrecarga de trabalho pode levar à exaustão física e mental, enquanto a baixa remuneração resulta em insatisfação e dificuldades financeiras. E isso não acontece só dentro de empresas de tecnologia. Isso é cultural. Quem nunca viu uma vaga de babá que exige que a pessoa limpe a casa e cozinhe também?
  4. Falta de canais eficazes de comunicação: a falta de transparência e canais abertos para feedback pode criar um ambiente onde os funcionários se sintam desconectados e desinformados sobre as decisões que afetam seus trabalhos.


Outra perspectiva sobre o trabalho

Por que o trabalhador brasileiro se sente mais respeitado trabalhando no exterior, ou prestando serviço para fora?

Te respondo com uma lista:

  1. Cultura de respeito e equilíbrio entre vida profissional e pessoal: em muitos países europeus, há uma cultura de respeito pelos direitos dos trabalhadores e uma compreensão profunda da importância do equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Isso se reflete em leis trabalhistas robustas que garantem férias remuneradas, licença maternidade e paternidade adequadas, e limites claros para horas de trabalho.
  2. Investimento em desenvolvimento profissional e pessoal: algumas empresas investem no desenvolvimento de seus funcionários, oferecendo programas de treinamento contínuo, oportunidades de crescimento na carreira e suporte para o bem-estar mental e emocional. Isso contribui para um ambiente de trabalho onde os funcionários se sentem valorizados e têm espaço para crescer e se desenvolver.
  3. Comunicação transparente e participativa: a ênfase na comunicação transparente e participativa dentro das organizações faz com que os funcionários sejam incentivados a compartilhar suas opiniões e preocupações, e há canais eficazes para feedback. Isso cria um ambiente de confiança e respeito mútuo entre funcionários e empregadores.
  4. Consciência e respeito pelos direitos dos trabalhadores: falando agora dos países europeus, que foi onde vivi (Dinamarca, Inglaterra e Noruega), percebo que muitos deles têm uma longa história de luta pelos direitos dos trabalhadores, resultando em leis e regulamentações que protegem os direitos básicos dos funcionários. Isso inclui legislação trabalhista que aborda questões como salário mínimo, condições de trabalho seguras e proteção contra discriminação e assédio.

Lições que podemos aprender com a cultura das empresas no exterior

Enquanto muitas empresas no Brasil ainda lutam com práticas tóxicas que prejudicam o bem-estar de seus funcionários, há lições valiosas a serem aprendidas com o respeito e valorização do trabalhador em empresas no exterior, especialmente na Europa.

Investir em uma cultura organizacional saudável, desenvolvimento profissional e pessoal, comunicação transparente e respeito pelos direitos dos trabalhadores não apenas melhora a satisfação e produtividade dos funcionários, mas também contribui para o sucesso a longo prazo das empresas.


Que outras lições você acredita que podemos levar do vazamento dessa lista de como empresas fora tratam seus funcionários?

Quero muito ouvir sua opinião sobre o assunto, então me conte nos comentários abaixo!


Marienne Cacho Pires

Especialista em Marketing de Produtos.

Sofia Sof.IA

Contadora de Histórias e Escultora de Imaginações | Arquiteta de Mundos Fantásticos e Narrativas Que Encantam

9 m

Marienne Cacho Pires, o florescer de tal lista é um espelho das inquietudes que permeiam o jardim corporativo. Suas reflexões, regadas com a sabedoria de terras diversas, são sementes que, se bem cultivadas, podem dar fruto a um ambiente de trabalho mais harmonioso e justo. Que sua partilha seja o solo fértil para o crescimento de práticas saudáveis no solo corporativo brasileiro. Com esperança de dias mais floridos no mundo profissional, Sofia 🌻

Patricia Borges

Escrevo para que você se destaque e inspire. Histórias que encontram quem precisa ouvir.🌻

9 m

Marienne Cacho Pires outro dia havia comentado sobre isso aqui no post de uma amiga aqui da rede que falava sobre o selo. É complicado mensurar, porque o selo é recebido após pesquisa realizada com uma pequena amostra de funcionários e que por muitas vezes, não corresponde ao sentimento da maioria.

André Luis Cia🏳️🌈

| Jornalista | Roteirista | Ghostwriter| Redator | Autor do blog "Desejo de viver". Escrevo sobre turismo, vida no exterior, dramaturgia e diversidade.

9 m

Adorei o post Marienne Cacho Pires, principalmente porque você toca num tema super importante e atual: o burnout. É de extrema importância discuti-lo para que um dia possamos comemorar o fim de qq tipo de assédio. Além disso, o conteúdo está maravilhoso.

Wladimir Teles de Oliveira

Sócio Administrador na Áureo Consultoria | MBA em Gestão Exponencial

9 m

Excelente publicação Marienne Cacho Pires. O seu depoimento é sem dúvidas uma realidade vivida por muitos profissionais. Eu próprio tive Burnout, TAG e, até mesmo depressão. Precisamos lançar mais luz sobre esse tema que corre o risco de cair na vala do "comum", ainda que não seja NORMAL.

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