LIVRO: PAIXÃO PELA VERDADE

LIVRO: PAIXÃO PELA VERDADE

A leitura do livro “Paixão pela Verdade” (do original “A Passion for Truth”) do apologista Alister E. McGrath é uma exposição preliminar dos princípios gerais em torno do evangelicalismo contemporâneo. Outrossim, condição prévia nesta resenha é respaldar o autor, pesquisador sênior na Faculdade Harris Manchester, presidente do Centro para Apologética Cristã (ambos em Oxford) e diretor do Centro de Teologia, Religião e Cultura na King's College, em Londres, Inglaterra. É evidente que tal experiência ministerial concebeu muitos textos e obras apologéticas. Assim sendo, dentre os muitos livros, justifica-se a resenha da obra em apreço por sua premiação como o livro do ano (1997) conferida pela Editora “Christianity Today” (“Cristianismo Hoje”).

A estrutura de “Paixão Pela Verdade” está alicerçada em cinco capítulos bem focados, empós uma introdução essencial que examinou criticamente o evangelicalismo. McGrath o fundamenta como “a maior e mais ativamente forma de cristianismo no mundo ocidental [...] e como o garoto novo no quarteirão acadêmico” (McGRATH, 2007, p. 10, 11). Não há dúvidas que o intento do autor é demonstrar a coerência intelectual da visão teológica evangélica como um todo, rechaçando o princípio que a teologia não é mais parte integral para manter e nutrir a identidade cristã no mundo. Expondo a singularidade de Jesus Cristo e a autoridade da Escritura, o escritor prova a coerência intelectual do evangelicalismo em detrimento aos movimentos hodiernos do pós-liberalismo, do pós-modernismo e do pluralismo religioso.

McGrath, ao afirmar que o cristianismo é singular entre todas as religiões do mundo, preceitua que a singularidade e natureza definitiva de Jesus constituem-se o seu ponto central e, portanto, infere que o evangelicalismo, essencialmente, seja cristocêntrico. Deste modo, o autor explora a importância revelacional, soteriológica, mimética (ou exemplificadora), doxológica e querigmática de Jesus Cristo. Tais estudos habilitam o leitor a rejeitar generalidades em prol da particularidade de Cristo.

O autor aborda a importância, suficiência e autoridade das Escrituras Sagradas. Para McGrath, a continuidade teológica e espiritual com a Reforma Protestante é valor intrínseco no evangelicalismo. Conseqüentemente, o autor confirma a autoridade da Escritura por ser a Palavra de Deus, unindo-a a Pessoa de Jesus Cristo e revelando sua dimensão libertadora. Este é um apelo coerente, muito embora alguns movimentos, como o modernismo (com abordagens pela razão e tradição) e o liberalismo (mediante abordagens da cultura e experiência), tentem estabelecer uma crise na autoridade bíblica o que, para McGrath, é destituído de verdade e profundamente enganoso.

É interessante observar a descrição de “embates” que são promovidos entre o evangelicalismo e algumas cosmovisões, intentando estabelecer as bases pelas quais estas possam ser criticadas. Aqui, o debate é entre os gigantes do evangelicalismo e do pós-liberalismo (1960; surgiu como conseqüência da desilusão com a teologia liberal). O pós-liberalismo (e outros imponentes desafios teológicos), comumente, é visto como uma séria ameaça a integridade e identidade cristãs. Uma crítica séria e inteligente perceberá aspectos positivos e negativos no movimento; esta é a abordagem de McGrath.

A partir deste ponto, naturalmente surgem argumentações na relação entre os gigantes do evangelicalismo e do pós-modernismo (1970; surgiu a partir da publicação do livro “La condition postmoderne”, “A Condição Pós-Moderna”, de Jean-François Lyotard e da rejeição do Iluminismo acusado de ter fundamentos intelectuais fraudulentos). McGrath explora os contornos históricos desta cosmovisão (bem como do Iluminismo e Modernismo) e avalia o pós-modernismo. Chama a atenção o tópico “a morte da modernidade” e o constante questionamento acerca da verdade, vista por muitos pós-modernistas como opressora. Por fim, o autor orienta o leitor a continuar ver a verdade, extrema e apaixonadamente, como importante para o evangelicalismo, mesmo diante de tantos desafios e pressões (McGRATH, 2007, p. 168).

Há em McGrath outro foco evidente: a comparação do evangelicalismo com o pluralismo religioso; ou seria entre o singular e o plural? Seriam todas as religiões essencialmente idênticas? Investigando a natureza e as visões teológicas do pluralismo (religião, Deus, salvação, Jesus Cristo), McGrath defende a singularidade do evangelho; protege a integridade do cristianismo. Nota-se que a leitura atenta da obra treina o leitor a criticar com inteligência. Do ponto de vista pluralista, o cristianismo só é apenas mais um meio, mais um caminho, visto multiformimente pelos judeus, muçulmanos e cristãos. Ora, o próprio evangelho mostra que o homem está no mundo; também é verdade que há pluralidade de religiões no mundo. Diante disto, o evangelicalista precisa entender os pontos de vista do pluralista, mesmo que não corrobore com muitos deles, pois, do mesmo modo que outros sistemas religiosos almejam o respeito, assim também é o cristianismo: “ele pede que sua integridade seja respeitada” (McGRATH, 2007, p. 201, 202). Essa é a pressão cultural ou filosófica hodierna. Logo, McGrath critica o pluralismo religioso com fundamentos sólidos e vê desacerto em se tratar todas as religiões numa base politicamente igual.

Finalmente, uma avaliação da obra é indispensável. Se for verdade, como atesta McGrath, que o evangelicalismo é de importância grandiosa para o futuro do cristianismo global, tal obra é imensamente relevante e repudiá-la seria um trágico engano (McGRATH, 2007, p. 203). “Paixão pela Verdade” é uma obra acadêmica por excelência, inda que sua leitura seja muito exaustiva. É o que falta no livro: uma forma mais ordenada, clara e simplificada de anunciar a coerência intelectual do evangelismo. Se se busca paixão pela verdade, nada mais justo do que aclarar o que já é muito obscuro.

A inércia do evangelicalismo na academia de outras épocas tem sido transformada em movimento ascendente, verdadeiramente preocupado com o que é celestial; e McGrath faz parte deste processo. O autor é coerente, inteligente, lógico, apaixonado e fiel ao Senhor Jesus e à Sua Santa Palavra. Destaca-se o amplo conhecimento das fontes que utiliza. Aproveitaria muito se as notas de referência estivessem na mesma página em que foram citadas e não no final do livro. Tal recurso utilizado é desgastante, imerece as notas e a “paixão pela verdade”.


RESENHA CRÍTICO-INFORMATIVA

MCGRATH, Alister; Paixão pela Verdade: a Coerência Intelectual do Evangelicalismo. São Paulo: Shedd Publicações, 2007, 239 pp.


Resenha publicada na Revista Fides Reformata, volume XVIII, nº 2, 2013, páginas 123-125

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