M&A
O Processo de M&A (Fusões e Aquisições)
Carlos Fernandes*
Objectivo de um processo de M&A
Comprar empresas concorrentes ou vender participações em empresas que consideramos não estratégicas, faz parte da atividade da gestão contemporânea, sendo uma alternativa ao crescimento orgânico.
Assim, uma Fusão ou Aquisição, modifica a estrutura societária de uma empresa ou de um grupo. São operações que exigem trabalhos de due diligence, capazes de dar resposta a um checklist exigente, questões normalmente complexas, que conduzem a contingências contabilisticas, juridicas, fiscais, económicas e financeiras; que exigem a presença de especialistas, para que se finalize com sucesso o processo de M&A, também designado entre pares, por "closing".
· Aquisição ou Venda: trata-se da operação mais usual para o profissional de M&A e será a transferência de quotas/acções de uma empresa para os novos sócios/accionista. O chamado "Asset Purchase".
· Fusão: trata-se da operação em que várias empresas se fundem para criar uma nova Sociedade, chamando-se por isso de uma união de empresas, ou incorporação, quando todas são absorvidas por uma única empresa.
· Troca de participações / "Spin-off": operações que se efectuam por troca de ativos ou spin-off, recebendo em troca acções das empresas envolvidas nas operações.
· Reestruturação das posições acionistas: operações que provocam uma alteração na estrutura acionista de uma empresa..
Os Consultores e os Empresários decidem-se por operações de F&A atendendo ao exposto no início, mas sobretudo para ganharem massa crítica rápidamente, sinergizarem os negócios, ou por forma a obterem ganhos de escala.
Tomemos o caso da empresa A, que quer comprar a empresa B; o valor de A é definido como Va, enquanto o valor de B é ilustrado como Vb. Se Vab > V(a+b) ou seja, se o valor da nova empresa resultante da fusão entre A e B é maior que a soma dos valores das duas empresas consideradas separadamente (valor stand alone), então a operação pode gerar valor acrescentado.
Esta é, obviamente, uma simplificação extrema, que não considera que uma operação pode gerar mudanças significativas no risco da nova entidade, alterando a estrutura financeira e por esta via o chamado custo de capital da nova estrutura.
Como exemplo geral, podemos elencar quatro categorias principais para uma operação Fusão ou Aquisição:
I. Razões estratégicas: aumento da fatia de mercado, eliminação de um concorrente, entrada em novos mercados ou novos segmentos de actividades, redefinição do nicho de mercado, por exemplo, venda de unidades de negócios não estratégicas, aquisição de um fornecedor ou cliente chave, internacionalização, melhoramento da imagem da empresas, p.e., através da aquisição de uma marca conhecida ,reestruturação societária, entrada/saída de acionistas. Outro exemplo será a compra dessa empresa por ser estratégica e que vai possibilitar vantagens competitivas no futuro; ou ainda, ao crescer por aquisições, o aumento dos ativos da empresa possa reduzir as possibilidades de falência (teoria do "too big to fail").
II. Razões económicas: Geram economias de escala.
III. Razões financeiras: Linhas de crédito aprovadas sem utilização que conduzem a melhorias significativas da posição de tesouraria / financeira de curto/médio prazo, redução de dívida estrutural por entrada de capital.
IV. Razões fiscais: possibilidade do comprador aproveitar o prejuízo acumulado na empresas adquirida (com reduzida eficácia em determinados regimes fiscais, por limitações á dedução dos prejuízos).
O TRABALHO DO ASSESSOR
O trabalho dos assessores neste sector é complexo e baseia-se na decisão ponderada de escolher uma estrutura pesada, com "know how" acumulado e com nome, quando recorremos às grandes empresas de consultoria ou bancos de investimento, ou mais personalizada, quando se recorre a Consultores Financeiros independentes com experiência e "know how".
A experiência ou track record de um assessor é fundamental e a ética e o profissionalismo são os complementos necessários para ganhar a confiança do mercado; uma vez que o M&A trata de interesses de vários tipos (acionistas, trabalhadores, fornecedores, clientes, etc.).
Requesitos do assessor:
Possuir uma excelente base de relacionamentos que possibilitem a actuação neste mercado:
I. Os contactos e os cuidados em mantê-los gera contínuos sinais sobre as tendências do mercado e permite detectar possíveis alvos para serem adquiridos.
II. Os contactos são desenvolvidos e mantidos por profissionais que cuidam de áreas específicas, em contínuo relacionamento com a gestão de topo das empresas clientes.
III. O assessor terá que ser preserverante, pois o retorno não é imediato, ao contrário, normalmente gera custos irrecuperáveis "sunk costs", que representam os investimentos da consultoria para gerar um satisfatório número de mandatos de representação.
Mandato:
I. Resultado do bom contacto com os acionistas das empresas alvos;
II. Com este(s) o Consultor compromete-se a usar todos os recursos próprios para conseguir a compra da empresa alvo;
III. Geralmente exclusivo;
IV. A duração pode ser de 6 a 12 meses ou mais (dependendo do tipo de operação), tanto para pequenos quanto grandes negócios;
V. Define o objecto da operação, o trabalho a ser feito pelo consultor, a equipe e a remuneração desta última.
Avaliação "stand alone":
I. Definição de um intervalo de valores como base para negociação;
II. Definição de eventuais medidas a serem tomadas, por forma a aumentar o valor da empresa.
Definição de uma estratégia de venda:
I. Preço de venda;
II. Forma de Pagamento;
III. Custo com os Consultores envolvidos na operação;
IV. Estimativa de Impostos a pagar caso haja sucesso na operação (trata-se de um aspecto fundamental, pois por vezes este custo pode gerar o sucesso ou insucesso da operação)
V. Estrutura da operação (venda de ações, venda de activos/passivos, spin-off, troca de ações);
VI. Sigilo;
VII. Duração;
Selecção e abordagem dos investidores:
I. Preparação de um "blind profile", que resume sem citar o nome, os dados principais da empresa em venda, tais como: sector, magnitude da empresa, posicionamento competitivo, objectivos de crescimento e alguns dados económico-financeiros;
II. Definição dos parâmetros para selecção dos potenciais investidores: Geralmente a busca de investidores é mais fácil quando se definem antes critérios detalhados de selecção. Estes critérios dependem mais de exigência própria do vendedor e podem abranger, sector, nacionalidade do comprador, cultura dos gestores, condições económicas/financeiras, etc.;
III. Selecção de potenciais compradores: Esta listagem pode incluir indicações da mesma empresa, informações a disposição do mesmo consultor ou, mais sistemáticamente, uma listagem de potênciais interessados a montante e a juzante da actividade produtiva da empresa alvo, isto é: concorrentes, clientes, fornecedores, investidores institucionais relacionados com a empresa;
IV. "Screening"/ listagem: A seleção deve ser feita satisfazendo os critérios definidos, excluindo automáticamente as empresas que não respondem a estes critérios e criando um ranking de nomes que representem as oportunidades estratégicas em ordem de importância. As informações (relacionamentos) e a experiência do consultor são fundamentais nesta fase, para proteger as informações estratégicas da empresa, evitando o envio de informações para investidores não realmente interessados;
V. A fase de contacto com os potenciais investidores e apresentação do blind profile conclui esta parte. Mais uma vez o património de relacionamentos e os contactos com os acçionistas e o top management desses potenciais investidores, é factor diferencial para um consultor ter sucesso na operação. A actividade do consultor nesta fase é remunerada por comissões chamadas de "retainer fees", normalmente pagas antes e descontadas das comissões de sucesso. Estas comissões representam para o consultor uma cobertura para os custos fixos.
A Declaração de Confidencialidade:
Antes de revelar o nome e os dados da empresa alvo, contidos no memorando de Venda / Selling memorandum, o consultor pede aos interessados para assinar uma declaração de confidencialidade como ferramenta legal para:
I. Obrigar o sigilo sobre qualquer informação recebida referente a empresa alvo;
II. Evitar qualquer acção que possa provocar a difusão da notícia da venda da empresa alvo;
III. Obrigar a não usar, directa ou indirectamente, as informações recebidas para finalidades diferente da análise da oportunidade de negócio.
O assessor trabalha para o sucesso do negócio evitando a difusão não autorizada de informações sobre a empresa alvo, que podem beneficiar os concorrentes e gerar preocupações em todos os stakeholders (fornecedores, financiadores, clientes, empregados, etc.).
A carta de confidencialidade permite receber o selling memorandum, que explica detalhadamente o que já foi antecipado em negociação, com o perfil sintético ou blind profile. O selling memorandum deve ser redigido com o máximo cuidado, destacando pontos fortes e fracos da empresa à venda, e indicando eventuais correções para melhorar a situação da empresa. Não vale a pena esconder dados e pontos fracos, acabam por ser descobertos no processo de "due diligence" e geram contingências.
A fase de negociação:
A negociação envolve os consultores e outros profissionais requeridos, tais como: advogados, auditores, contabilistas certificados, revisores oficiais de contas, etc..
A negociação caracteriza-se pela emissão de vários documentos: declaração de intenções, contracto de compra e venda, acordos de não agressão, etc.
A declaração de intenções, ou heads of agreement, define as condições gerais da operação. Esta carta não tem nenhum valor legal, mas serve para definir uma linha com base na qual as partes se comprometem aos termos negociados e a não tratar com outros interessados (cláusula "no shop").
Enquanto a declaração de intenções fixa uma linha para a condução dos termos negociados, sem nenhum vínculo legal, o contracto de aquisição, ou "acquisition agreement", constitui um documento importante para a conclusão do negócio.
Este documento já tem valor legal, pois contém todas as condições de venda, incluindo garantias fornecidas pelo vendedor sobre o estado da empresa. Cada concessão feita por meio deste documento possui efeito vinculativo, pelo que, é preciso a máxima atenção na sua redação.
A assinatura deste último documento conclui a primeira fase das negociações, que continuará com o processo de "due diligence" e se houver sucesso do "Closing" ou fecho do negócio.
Due diligence e Closing:
O objetivo da due diligence é apurar a exatidão das informações contidas no selling memorandum, esclarecer algumas dúvidas e ainda obter uma avaliação independente da empresa alvo, como motivo para pedir eventuais financiamentos necessários para finalizar a operação. A due diligence pode envolver diversos profissionais para cuidar das diversas áreas envolvidas (contabilistica, fiscal, técnica, legal, etc.).
Se não se detectar nenhum problema na due diligence passa-se ao closing. Todavia, pode ainda acontecer que por meio da due diligence se levantem importantes diferenças a respeito do conteúdo do selling memorandum, havendo risco de impasse ou interrupção do negócio.
O closing é a etapa final e a mais difícil de todo o processo, onde as partes negociarão sobre o preço a ser pago pela empresa e sobre outras condições de venda.
O papel do assessor será fundamental. A título de exemplo podemos enunciar algumas condições usadas para dirimir algumas dúvidas ou complementar o interesse das partes:
I. A cláusula earn out, que pode vincular parte do preço final aos resultados futuros da empresa alvo;
II. Ou a atribuição de um papel de continuidade aos Administradores descontinuados, por periodo a acordar, geralmente um ano.
Finalizada a operação, o consultor recebe a sua comissão de sucesso, dependendo do porte da operação.
* Licenciado em Gestão de Empresas,
Exerceu Corporate Banking entre 1987 e 2000,
Especialista em M&A, com várias transações fechadas.