Minha infância dos pés descalços
Já contei a primeira parte da minha história no artigo anterior, que você pode ler aqui.
Chegou a hora de contar a segunda parte, que na verdade é a primeira. Ou seja, do nascimento até os 30 anos.
Minha memória não é boa, mas é seletiva, o que me permite lembrar apenas dos acontecimentos mais marcantes.
Tento me concentrar, alguns eventos me vêm à memória em efeito cascata...Pronto. Cheguei à estaca zero. Mais longe que isso não consigo ir.
Não me lembro de nada dos 9 meses que passei na barriga da minha mãe.
Só sei que tenho um irmão gêmeo, e nossa afinidade é gigante. Além de gêmeos, acho que somos também almas gêmeas.
Acredito que nossa incrível conexão venha mesmo do ventre de nossa mãe. Lá tivemos que aprender a dividir o espaço, a alimentação, as experiências. A viver em sociedade, enfim.
Eu e meu irmão gêmeo, Piga.
Depois do nascimento, a primeira cena que me vem à memória é de quando tinha uns 4 anos. Isso mesmo, 4 anos. Não mais que isso.
Estou em pé dentro de uma banheira. Aquelas banheiras de louça antigas, que hoje são cobiçadas por serem relíquias.
No chão da banheira tem um pino de boliche (que nós chamávamos de garrafa) amarela, de plástico. Não sei porque cargas d’água cismei de pensar sobre a passagem do tempo. Aquilo me soava claramente inevitável, mas tinha que haver um jeito de vencê-lo. Superar esse senhor de todos os destinos. Tambor de todos os ritmos, como diria Caetano Veloso.
Me veio uma idéia. Presto bastante atenção nesse momento, chuto essa garrafinha de boliche amarela e mesmo que passem mil anos, me lembrarei sempre dessa cena.
E assim fiz.
Essa foi minha primeira tentativa de enganar o tempo. Tipo assim, você pode passar o quanto quiser, mas a minha memória não poderá apagar.
Daqui a muitos anos, quando me lembrar disso, vivenciarei tudo de novo, nos mínimos detalhes, e terei novamente o mesmo sentimento hoje. Resumindo: terei aberto um atalho vivo entre o futuro e o passado.
Aquilo que os astrônomos hoje chamam de buraco de minhoca.
Talvez tenha esse nome exatamente por causa das crianças. Com suas pequenas ferramentas fazem riscos e buracos no chão de terra, e em sua imaginação fértil são arremessadas num vôo super veloz, dançando com a lua, brincando com os astros.
Rodopiando suavemente, num bailado gracioso e repleto de revelações, através de inimaginavelmente lindas paisagens cósmicas, até os confins do universo.
Fui longe agora, né? Fui nada. Para as crianças e também para os adultos que não se afastaram em demasia da criança que foram um dia, o longe passa a ser perto.
O meu conflito com o tempo, portanto, vem de longe.
Passam-se alguns anos.
Inicia-se o período das brincadeiras de menino. Todo tipo de brincadeira na rua de terra, fogueira de esquina nas noites de frio e… futebol.
Ah, o futebol. Essa era a maior diversão. Descalço, campinhos de terra, terrenos baldios.
Domingo era dia de ver o grande clube da cidade jogar. Sentir o calor do povão. Era o evento da semana.
Nessa mesma época conheci o mar.
A preparação que meus irmãos mais velhos me fizeram, a expectativa que me colocaram durante o percurso de ônibus de BH até Santos, tornaram esse encontro arrebatador. Absolutamente inesquecível.
Na minha cabecinha de criança aquilo se sobrepunha a tudo que eu jamais poderia imaginar. Se adulto fosse, certamente me ajoelharia em reverência àquela colossal força da natureza.
Foi paixão à primeira vista. Aliás, uma paixão ar-re-ba-ta-do-ra.
Não sei por qual motivo, a lembrança começa a me fugir nesse momento. Será que Poseidon não gostou da forma resumida como me referi a ele? Não sei.
Sei que não poderei cumprir a promessa de escrever minha trajetória até aqui em 2 etapas. Terão que ser mais.
Se gostaram, peçam a continuação. Farei com todo prazer.
Caso contrário, continuarei escrevendo, mas sobre outros assuntos. Como sempre, comentários são muito bem-vindos.
Logistics Manager LATAM
4 aPompo, meu véio... O talento para as letras é divino e Deus, em toda a sua grandiosidade apontou o dedo para aquele menino de pé na banheira e disse: Fio, vai lá e escreve os causo da sua vida, ocê vai inspirá um monte de gente a ser "gente" como você é! Vai que eu tô aqui de cima só oiano... Obrigado, meu querido novo amigo, que Deus te inspire mais e mais e que nós tenhamos a oportunidade de ainda tomarmos aquele cafezim e ter aqueeele dedo de proza. Segue escrevendo! Bom final de semana!
Technology
4 aHistória linda e envolvente, Guilherme! Espero os próximos capítulos!
Especialista em Marketing | Gerente de Planejamento | Mobilidade Urbana | Transporte Público
4 aCai de paraqueda em um dos posts do seu filho, por acaso, talvez alguma conexão minha que curtiu. Sou curiosa, minha curiosidade me fez dar uma espiadiha em seu perfil. E por aqui fiquei um bom tempo, stalkeando 😁 Parabéns Guilherme Nunes (Seu Pompo), o senhor é uma inspiração pra muitos, me incluindo nessa por estar num momento de me resignificar. Ótimo exemplo de superação!
Gerente de Carteira PJ
4 aEspero que não demore a próxima publicação, espero ansiosa!