Mudanças climáticas – o precipício olhando para nós
Photo by Li-An Lim on Unsplash

Mudanças climáticas – o precipício olhando para nós

Participei na semana passada de uma mesa muito interessante sobre mudanças climáticas no Festival Social Good Brasil, quando tive a honra de interagir com Natalie Unterstell, presidente do Talanoa - Instituto Internacional de Políticas Públicas,  Ricardo Galvão, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) e ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Silvia Luz, diretora-executiva do Social Good Brasil.

Como ajuda-memória para a minha fala, rascunhei os pontos abaixo, que gostaria de compartilhar. Minhas respostas para as duas perguntas motivadoras:

Por que precisamos falar sobre as mudanças climáticas?

Porque as mudanças climáticas são a maior ameaça à vida humana na Terra!

Vejam bem: não falo da vida em geral, mas, egoisticamente, me refiro à vida humana mesmo. Até para ver se, pelo menos por este aspecto, as pessoas que ainda são céticas ou negacionistas sobre o papel da humanidade nas mudanças climáticas abrem finalmente seus olhos.

É a vida humana que está diretamente em risco.

Isto porque, na verdade, a vida é muito resiliente. Basta pensar que o planeta Terra já passou por alguns eventos de extinção em massa. No caso mais extremo, o do Permiano, há cerca de 250 milhões de anos, extima-se que cerca de 96% das espécies então existentes no planeta desapareceram. Toda a vida no planeta hoje é, portanto, herdeira dos 4% que restaram naquele tempo – e isso foi ainda antes de os dinossauros dominarem o planeta por mais de 100 milhões de anos, até serem extintos por um evento fora do seu controle.

Aliás, este vídeo da ONU traz uma mensagem dos dinassauros para nós. Precisamos ouvir a voz da experiência:

Nós, homo sapiens, por outro lado, passamos de caçadores-coletores ao domínio da agricultura, com isso criando as bases para o que entendemos por civilização, há apenas cerca de 12 mil anos – o milionésimo da fração de um piscar de olhos, em termos de tempo geológico da Terra.

E, ainda assim, estamos criando as condições para um novo processo de extinção em massa da vida. Na real, já somos os promotores de várias extinções de espécies, mas o impacto da industrialização e dos nossos hábitos de consumo estão afetando o delicado equilíbrio do planeta a um ponto em que a nossa própria sobrevivência está em risco.

E aqui vem um ponto adicional: não cabe mais falar em “futuras gerações”, esse conceito meio abstrato que ficou tão na moda até uns anos atrás. O impacto já sentimos hoje, aqui e agora. Mesmo uma pessoa que esteja em seus 50 anos de idade, se conseguir manter a média de expectativa de vida e chegar até os 75 ou 80 anos, verá, e sentirá na pele, as consequências das mudancas climáticas, traduzidas em eventos climáticos cada vez mais extremos, surpreendentes e destrutivos. Imagine quem tenha, agora, 30 anos ou 10 anos de idade? O que essas pessoas, nossos filhos ou netos, sentirão e viverão em consequência das mudanças climáticas?

Ou seja, somos nós, que vivemos hoje no planeta Terra, que testemunharemos o princípio e as consequências deste desastre global.

Infelizmente, reverter os efeitos da nossa marca no planeta levará muitas décadas. Por isso mesmo, não existe mais espaço para prorrogação. A hora de agir é hoje.

Como podemos agir no dia a dia para ajudar a resolver esse grande problema social?

A verdade é que traduzir este sentido de emergência para o cotidiano das pessoas ainda não é uma tarefa fácil. E, neste sentido, vamos aprendendo da pior forma possível, com os eventos climáticos extremos fazendo o papel de desenhar na nossa cara as consequências das nossas ações sobre o planeta. Chuvas abundantes e inundações na Alemanha, em Nova York, na China; tempestades de areia no interior do Brasil; incêndios florestais queimando milhões de hectares na Austrália, Califórnia e Portugal; a Sibéria literalmente derretendo sob uma onda de calor histórica e por aí vai. Cenas de um filme catástrofe hollywoodiano acontecendo às nossas vistas.

Na COP26, que acontece esta semana em Glasgow, na Escócia, líderes políticos mais uma vez se reúnem para debater os resultados do relatório mais recente do IPCC com um apanhado global da ciência climática validando o que a natureza já desenha para todos nós. Estará a liderança política que temos no planeta à altura do momento histórico em que estamos vivendo, como espécie? O meu lado pessimista me manda ir na direção da dúvida, mas sigo acreditando que uma combinação de ações individuais e coletivas podem gerar pressão importante para mover as liderancas políticas além do ponto da inércia.

Ações individuais são importantes, mas insuficientes. É preciso combiná-las com uma pressão permanente, sistemática e estratégica sobre governos e empresas.  

Neste sentido, o agir tem estes dois aspectos:

(1) A ação individual, na qual nos perguntamos a cada dia: o que posso fazer hoje, no meu cotidiano, para evitar as mudanças climáticas? Precisamos de ações concretas, factíveis, que consigamos implementar na nossa vida – e com isso estimular e servir de exemplo para as pessoas do nosso entorno. É o poder da mobilização exponencial em rede que traduz, na prática, a ideia de que nós somos os outros dos outros.  Aqui, algumas ações simples, realizáveis no dia-a-dia, mas que podem ter impacto efetivo se feitas em massa, por muita gente.

(2) A ação coletiva, na qual nos juntamos com outras pessoas para pressionar e mover aqueles e aquelas que têm o poder de produzir mudanças estruturais, seja no âmbito dos governos ou das grandes empresas. A ação coletiva e colaborativa - mais do que uma estratégia - torna-se uma urgência, exatamente porque não há mais tempo nenhum a perder. E os caminhos a seguir coletivamente são muitos, trilhados pelos movimentos de jovens, passando pela mobilização de populações originárias, de movimentos de identidade racial ou de gênero, de ambientalistas, chegando às mobilizações pelo desinvestimento em combustíveis fósseis. O importante é o foco coletivo de pressão sobre o status quo, em quem detém o poder de mudar o curso do Titanic, agora que estamos a ponto de abalroar o iceberg.

Estamos todas e todos à beira do precipício – e ele está olhando para nós.

Alegria em poder contar com seus ensinamentos e reflexões, Renato de Paiva Guimaraes!

Muito bom esse artigo! Pude acompanhar a participação na conversa do Social Good Brasil e sempre digo: essa pauta é urgente e deveria estar em TODAS as rodas de conversa! Obrigada por compartilhar conhecimento sempre, Renato de Paiva Guimaraes!

Entre para ver ou adicionar um comentário

Outros artigos de Renato de Paiva Guimaraes

Outras pessoas também visualizaram

Conferir tópicos