NÃO DIGA "CHÃO DE FÁBRICA"
No mundo Corporativo sobram adjetivos sofisticados para líderes e executivos. Porém, falta cuidado e sensibilidade na relação com os profissionais da Operação
Usar termos em inglês no Brasil para pseudo sofisticar nomes de marcas e produtos não é novidade. Como muitos brasileiros gostam e idolatram o American Way Of Life, absorvemos e incorporamos os termos estadunidenses com naturalidade em nossa língua – nem preciso me aprofundar neste ponto, certo? Pois bem, o mundo corporativo também tem essa verve. Ao longo dos meus 20 anos de carreira, convivi com os mais sofisticados verbetes para executivos e líderes. A paleta de nomenclaturas é vasta: Mill Manager, CEO, Chairman, CFO, Business Partner, e por aí vai. Por outro lado, para os profissionais da área Fabril, o vocabulário é pobre e comumente são chamados de “chão de fábrica”. Há anos, escuto e convivo com esse barulho. E, atualmente, tenho corrigido tal situação, quando oportuno, em reuniões e conversas com amigos.
Esse meu incômodo se intensificou em 2015. Na época eu trabalhava em uma empresa do setor de Construção Civil. Na ocasião, contratei uma empresa especializada em Pesquisa de Comunicação Interna, para medir a retenção de mensagens-chave. O objetivo era mensurar se os principais assuntos e iniciativas da companhia estavam sendo bem comunicados e compreendidos. De quebra, também fiz uma avaliação dos canais e veículos da empresa, além da Comunicação Direta dos líderes com as equipes. O universo era de 30 principais líderes e 568 profissionais da área Fabril, divididos em 15 unidades de norte a sul do país. Dentre os vários apontamentos que a pesquisa levantou, uma me chamou muito a atenção, e veio ao encontro da dor que me incomodava: a falta de cuidado de parte de alguns líderes na comunicação com seus times.
Em entrevistas realizadas com mais profundidade, muitos profissionais relataram seu desconforto e incômodo (para não dizer sensação de falta de respeito) quando eram mencionados como: “chão de fábrica”. Sim, “chão”, aquilo que, sem notar ou pensar, pisamos ou colocamos algo sobre. Como diria uma música de Elton John, com o grupo australiano Pnau: “Sad, so sad” =[. Pois então. Penso que não seja algo específico daquela empresa. Pelo contrário, já trabalhei em outras nas quais esse termo também era bem comum. Sinceramente, não acredito que as pessoas dizem isso por mal ou intencionalmente. Mas elas o fazem automaticamente sem, muitas vezes, ponderar a respeito.
Penso que seja hora de repensarmos esse termo. Lógico, que não só o termo. Pessoas são o centro e alma das empresas e os profissionais da área Fabril são peças fundamentais dos negócios. Fica aqui a minha provocação. Em vez de “chão de fábrica”, usemos palavras que valorizem os profissionais: “nossos colaboradores da área Fabril”; “nossa operação”; “nossos especialistas de Produção”; “nossos experts”. Se é para sofisticar o termos, nomenclatura e abreviaturas, que façamos de forma igualitária.
Algumas empresas já vêm trabalhando essa valorização e estão um passo à frente. A LUSH, empresa britânica de cosméticos vegetariana feitos à mão, dá um banho neste quesito. Ela estampa em seus rótulos o nome e a ilustração do seu profissional que manipulou aquele produto. Essa inciativa serve de exemplo e nos inspira a valorizar, ainda mais, aqueles que dão o seu melhor e são os “mestres das Operações Fabris”, “artistas das fábricas”, “artesãos”, “especialistas em produtos”. Só não vale “chão de fábrica”.
Conversando com alguns profissionais de Comunicação e RH sobre o tema, ouvi opiniões mais analíticas sobre o termo pejorativo em questão. A conclusão é que se os executivos e profissionais da área Administrativa referem-se aos profissionais da área Fabril com termos “que pouco os valorizam”, isso mostra que existe uma divisão clara entre os diferentes profissionais de uma empresa. Portanto, é uma companhia dividida por feudos.
E isso não é nada interessante em um cenário corporativo atual em que precisamos do engajamento de nossos profissionais para sermos cada vez mais competitivos. Muito mais que isso: hoje as pessoas se conectam às organizações por meio de um propósito. Mas, se em sua empresa ainda existem divisões claras nos relacionamentos entre os profissionais de diferentes áreas, melhor não entrar neste assunto. Por hora, vamos ter os pés no chão e simplesmente dizer copiosamente um “NÃO” ao termo “chão de fábrica”, de agora em diante.
P.S.: um abraço forte e especial para o super Gustavo Leme, que me incentivou a escrever esse artigo.
Engenheiro Civil - Engenheiro de Custos - Gestor de Obras - Facilitador de Gestão - Administração de Contratos e Pleitos, Comprador Senior CAPEX/OPEX.
4 mHoje me deparei com um profissional fazendo um chamado de um curso sobre " ............. no chão de fábrica " confesso que fiquei surpreso que ainda existam profissionais e empresas que se utilizam essa palavra pejorativa para tratar o ambiente de produção como chão. Lá nos idos dos anos 1999 da minha graduação em Administração na matéria Administração da Produção já tínhamos cuidados de não utilizar esse termo CHÃO DE FÁBRICA, inclusive um professor de RH do curso então diretor de RH de uma empresa multinacional EUA já expressava essa preocupação e até brincava, " eles acham que nesse ambiente as pessoas se rastejam", e já se passaram 25 anos e ainda insistem em se referir o ambiente de produção como CHÃO, sejamos mais profissionais. Procurei sobre esse assunto e fui trazido até essa sua postagem, que felizmente diz tudo sobre isso, parabéns pelo artigo
Consultor financeiro na ISOLUCKS Tintas em Pó
7 mMais pejorativo do que "chão de fábrica" é "Rádio peão"!! Com certeza TODOS na corporação devem ser referenciados da melhor maneira possível. Creio que o termo composto "Chão de fábrica", deva referir-se mais, ao local, como as áreas dos Processos Industriais, e não às pessoas dessas áreas em si!! A não ser que a pessoa diga: às pessoas do "Chão de Fábrica", e sim dizer: aos profissionais dos processos produtivos!!
Caractere Comunicação
2 aJá estamos em 2022 e, somente hoje, acabei me deparando com este seu artigo. Excelente!! A expressão "chão de fábrica" contraria qualquer preceito de sustentabilidade, ESG, diversidade, reputação. Comunicação, gestão e prática precisam estar alinhadas, senão os discursos caem no vazio.
Consultoria e Promoção da Educação e da Saúde Mental nas Organizações de Trabalho é na Talentos Humanos Educação e Saúde.
2 aMuito bom! Concordo e tb me incomoda bastante este termo, eu particularmente não uso, acredito que as instituições de trabalho são verdadeiros ESPAÇOS de construção do trabalho e vidas, famílias são mantidas a partir do que acontece nestes ESPAÇOS, nunca no chão! Compartilhando!!!Estou indignada!!! Estou prestando um serviço em escolas, aréa da EDUCAÇÃO e pasmem, usam este TERMO: CHÃO DE ESCOLA!! HORRORIZADA!! 😲 vOU VER o que CONSIGO fazer!!! Ressignificar é preciso!!! 🙏 Gratidão por esta publicação!
Ciência, Tecnologia e Humanidades
3 aHalisson Pereira Olá, Halisson, como vai? Peço licença, vi sua publicação e ia te mandar uma mensagem pelo privado, mas não consegui. Não quis comentar na sua publicação, mas gostaria de te enviar esse texto referente ao uso pejorativo do termo "chão de fábrica". Infelizmente, existem muitos termos comuns que usamos diariamente que estão carregados de preconceito, e usamos sem perceber. Nos resta substitui-los, pois ao mante-los podemos passar uma mensagem diferente da que queremos passar, e/ou até mesmo ofender alguém, mesmo sem a intenção. Acredito que sua intenção tenha sido boa com a postagem, por isso pensei em lhe escrever essa mensagem. Abraços!