Não estamos sós

Não se pode noticiar sobre suicídios abertamente na mídia. Isso ocorre porque se todos os suicídios fossem amplamente divulgados isso poderia gerar ideias em quem está pensando em tirar a própria vida. Seria como estimular, mesmo que indiretamente, o suicídio. Só para se ter noção estima-se que no Brasil uma pessoa se mata a cada 45 minutos, o que é uma taxa altíssima e faz do pais o oitavo em números de suicídios. É compreensível que não se divulgue com tanta precisão e acurácia sobre os suicídios que estão acontecendo a toda hora, mas o que precisamos é falar mais sobre eles.

Falar sobre os motivos que podem levar uma pessoa atentar contra si mesma é fundamental para que entendamos que isso pode ocorrer com qualquer um, de qualquer classe social e escolaridade. Muitas vezes pensamos que só famílias nitidamente desajustadas, com sérios problemas é que terão algum membro que se mata, mas na realidade não é assim. Claro que em famílias disfuncionais o suicídio ocorre, mas não apenas nelas. E falar sobre o sofrimento desesperador que pode levar ao suicídio pode fazer com que muita gente que está sofrendo em silêncio veja que não é só ela que está se sentindo assim e com isso possa vir procurar ajuda.

Sofrer silenciosamente, como se fosse algo muito incomum e vergonhoso, é uma das piores coisas para quem pensa em suicídio. Porque esse silêncio torna tudo muito mais pesado, muito mais forte do que realmente é. A solidão amplifica os sentimentos negativos e faz com que um rato transforme-se num elefante. Acreditar-se só em uma dor pode deixa-la insuportável e levar a pessoa a querer se livrar dela tão desesperadamente que ela confunde a dor que sente com ela mesma e mata-se a fim de matar a dor.

Porém, falar sobre os sofrimentos e sentimentos pode ser libertador. Quando compartilhamos o que sentimos e o que vivemos com outras pessoas nos damos conta de que não somos os únicos que sofrem, mas que há todo um mundo de gente passando por problemas e adversidades similares. Isso acalma, nos torna humanos e vemos que não somos fracassados e exceções, mas simplesmente somos humanos. Saber que outros também passam e compreendem a dor que sentimos pode ser humanizador. Falar sobre os distúrbios mentais, sobre as fantasias que nos angustiam é vital e se faz necessário. Não estamos sós em nossas dores e saber disso pode nos levar à vida.


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