Nós temos problemas demais - Design, Interação e ILA19

Nós temos problemas demais - Design, Interação e ILA19

Esse texto é um relato a partir da participação no Interaction Latin America (ILA19) em Outubro e Novembro de 2019, em Medellín (Colômbia).

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O Interaction Latin América (ILA) 19, em Medellín, foi fantástico... ponto.

É inevitável voltar de um evento desses e de uma cidade dessas sem um milhão de coisas borbulhando no cérebro. Reflexões sobre o design, sobre a América Latina, sobre nossa identidade e sobre nossa capacidade de impacto no mundo. Dessas coisas, uma se destacou em minha mente:

Nós temos problemas demais.

Já explico:

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O “NOVO MUNDO”

Medellín é uma cidade muito… diferente. Ela mora nesse meio termo entre ser uma cidade extremamente inovadora - sendo enorme exemplo de inclusão e reforma social a partir de um sistema ímpar de mobilidade urbana - e ser uma cidade extremamente pobre - com um passado violento ligado a cartéis de drogas e de problemas sociais ainda muito presentes. Essa cidade é um choque, um soco.

Andar por Medellín, principalmente pelo centro da cidade, é um exercício de atenção com uma percepção constante da hostilidade do espaço com quem não conhece muito bem por onde anda. Já andar nos teleféricos, que mudaram completamente a lógica da cidade, é um exercício de meditação, onde se reflete sobre essas estratégias de design e engenhosidade humana para driblar uma limitação muito física que é a topografia exuberante, mas muitas vezes alienante, daquele espaço.

É impossível ir a Medellín e não sair impactado.

Medellín é a Colômbia, mas é também a América Latina.

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O “VELHO MUNDO”

Medellín me fez pensar em quando voltei de um período em que tive a grata oportunidade de passar um ano e meio na França. Medellín me fez lembrar do choque que senti quando voltei para o Brasil e, ao olhar para a janela do ônibus via o tanto de problema que a gente ainda tem pra resolver. O tanto de coisa incompleta e oportunidade de impacto e de atuação que mora em cada esquina do novo continente.

O choque veio do fato de eu ter me habituado, nesse período distante dos solos latino americanos, com um cenário rico e próspero, onde tudo parece que já está meio pronto. Na janela do lado de lá não moram construções em reboco, nas ruas não mora a violência e a miséria. Na janela dos trens de lá, a natureza já está toda tomada, já está toda regrada, os campos são geométricos e as árvores aparadas. Lá, as estradas já estão pavimentadas.

Então, por que ser América Latina?

Sobre isso, algumas reflexões:

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SOBRE BANIR “MOMENTOS”

Louis Rosenfeld, em seu maravilhoso talk de fechamento do ILA19, resolveu falar sobre momentos. Nós, seres humanos (e designers, claro!) somos terríveis em entender o tempo. Somos terríveis em entender o passado e o futuro, limitando nossa existência em momentos e fragmentos do presente que vivemos. Os “termos” que usamos para definir os “momentos” que vivemos são passageiros. Os “momentos” desses “termos” que concebemos são prisões do nosso comportamento.

Assim sendo, momentos passam... e nós devemos saber nos adaptar a essas passagens, se pretendemos nos manter relevantes enquanto profissionais e agentes em nosso mundo.

A partir dessa colocação, Louis coloca em cheque tudo o que a gente costuma usar para definir esse momento que vivemos, esse momento que somos. O que é exatamente um “designer de interação”, o que é “u.x.”, o que é “design thinking”? Esses momentos deveriam ser banidos de nossa conversa? E se são banidos, o que sobra para trás? O que nos resta? Quais momentos continuamos sendo para o mundo em que vivemos?

A América Latina, tal qual a entendemos é um desses momentos.

O design, tal qual o entendemos, também é um desses momentos.

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WE ARE PROBLEM SOLVERS

Muita gente fala que os designers são, então, “solucionadores de problemas”... mas quem não é solucionador de problemas, afinal de contas? Talvez seja justamente essa a questão: pouco importa quem é e quem não é esse tal profissional “solucionador de problemas”. O importante é não nos apaixonarmos pelo momento que significa ser um designer e nos apaixonarmos pelos problemas que se colocam à nossa disposição.

Veja, a chamada para a ação talvez possa ser melhor expressa por aquilo que Josh Seiden e Maritza Guaderrama trouxeram para a conversa, em quando pensamos em ser América Latina e em ser esse “solucionador de problemas” a que se pretende o design.

Josh Seiden focou sua conversa em dizer que devemos focar em outcomes (resultados) e não em outputs (entregáveis). No seu entendimento, a matéria prima do design de interação é o comportamento das pessoas e, a partir de produtos, criaríamos sistemas para a mudança desse dito comportamento. Nós projetamos não o produto, mas a forma como o produto influencia a forma como agimos no mundo. Projetamos a forma como os problemas podem solucionar a si mesmos.

Maritza Guademarra já comenta sobre a necessidade de se “desenhar” para o impacto. A partir das necessidades emergentes de países como os latino americanos, devemos projetar com o resultado final de nossos trabalhos em mente. Devemos projetar com o potencial de resultado e impacto que podemos causar no contexto em que vivemos. Maritza fala da necessidade de colocarmos mais nossa palavra no mundo, de sermos mais sistemáticos em nossas análises e na necessidade de sermos esse design que projetamos para o futuro.

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Y EL DISEÑO EN AMÉRICA LATINA?

Medellín é uma cidade diferente, uma cidade especial. O convívio entre desigualdades, problemáticas e inovação é emblemático da realidade latino americana. A cidade, ao mesmo tempo que hostil, é também acolhedora. Ao mesmo tempo que magicamente inovadora, é absurdamente desigual e intimidadora. Cravada no meio das montanhas andinas, a cidade tem essas contradições que refletem tudo aquilo que o dito “novo mundo” tem de tão especial e esse tão grande potencial que parece ao mesmo tempo ativo e dormente. 

Ir ao Interaction Latin America de 2019, em Medellín, foi sobre lembrar um pouco do nosso lugar no mundo enquanto designers e enquanto latino americanos. Foi lembrar que existe uma comunidade vibrante, de uma potência e capacidade enormes por aqui. Foi lembrar que nós somos a América Latina e que nós somos esse que é o momento do que é o design na atualidade.

O ILA19 foi mais sobre um design de interação um pouco mais amadurecido. O ILA19 foi menos sobre um entusiasmo desestruturado e mais sobre um momento que busca se definir, polir e entender sistematicamente seu poder de impacto no mundo. O ILA19 foi sobre entender um momento que passa e outros momentos que chegam. O ILA19 foi sobre entender que ainda tem muito problema a ser resolvido nesse lugar gigante que chamamos de América Latina. Foi entender que temos de parar com esse pensamento colonizado e entender que a América Latina pode ser protagonista de muita mudança ainda a ser vista em nosso mundo globalizado.

Medellín foi o melhor lugar possível para ocorrer este ILA e mal posso esperar para ver o que Costa Rica nos reserva para 2020.

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Um agradecimento ao IxDA, por ser essa comunidade maravilhosa que permite que congregações como essa ocorram sistematicamente e consistentemente. Um grande agradecimento pela equipe do ILA19, graças a quem tive a oportunidade de apresentar meu trabalho durante esse que é o maior evento de design de interação da América Latina. Um agradecimento à Thais Falabella, com quem mergulhei nessa loucura e para toda a comunidade de Design de Interação de Belo Horizonte. <3

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Cleber Tavares

Senior Project Manager at Wabtec Corporation | MSc | CSPO® | CSM®

5 a

Excelente relato e reflexão, Leonardo. Valeu por compartilhar!

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