A Natureza Jurídica dos Créditos de Energia Solar e o Papel na Transição Energética Global

A Natureza Jurídica dos Créditos de Energia Solar e o Papel na Transição Energética Global

1.      A Conexão entre Energias Renováveis e Hidrogênio Verde

A transição para uma matriz energética sustentável é um dos grandes desafios do século XXI, e o Brasil desponta como protagonista nesse cenário. Com recursos abundantes em energia solar e eólica, podemos nos posicionar estrategicamente tanto para atender à demanda interna quanto para liderar o mercado mundial de exportação de energia limpa.

A necessidade premente de transição para uma matriz energética mais limpa e sustentável impulsiona o desenvolvimento de tecnologias inovadoras, com destaque para a energia solar e o hidrogênio verde. O Brasil, com sua vasta capacidade de geração de energia renovável, assume um papel central nesse processo.

A Lei nº 14.193/2021, que instituiu o Programa Nacional do Hidrogênio (PNH2), consolida a importância estratégica do hidrogênio de baixa emissão de carbono no cenário energético nacional. A produção do hidrogênio verde, obtido por meio da eletrólise da água utilizando fontes renováveis, demanda grande quantidade de energia. É nesse ponto que a energia solar se apresenta como um importante aliado, fornecendo a energia necessária para a quebra da molécula da água e a produção do hidrogênio verde, alinhada a metas globais de descarbonização e promete transformar o Brasil em referência mundial no setor.

Dentro desse contexto, os créditos de energia solar, regulamentados pela Lei nº 14.300/2022, adquirem um papel estratégico, não apenas como mecanismos de compensação, mas também como ativos jurídicos que potencialmente poderiam ser alocados para atender a demandas emergentes, como a de plantas de hidrogênio verde.

2.      Marco Regulatório dos Créditos de Energia Solar

Os créditos de energia solar são regulamentados pela Lei nº 14.300/2022 e pela Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021, que definem sua natureza e utilização. Esses créditos surgem como excedente de energia gerado por consumidores participantes do Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) e podem ser:

  • Alocados: Utilizados em ciclos subsequentes, com validade de até 60 meses.
  • Vendidos: Comercializados em casos específicos, como encerramento contratual ou chamadas públicas para compra por concessionárias

3.      Natureza Jurídica: Frutos Civis e Direitos Patrimoniais

Os créditos de energia solar configuram direitos patrimoniais do consumidor-gerador, originados da geração de energia. Conforme o Código Civil, no artigo 95, esses créditos podem ser considerados "frutos civis", pois derivam de uma atividade produtiva recorrente.

A possibilidade de venda em situações específicas reforça sua natureza como ativos econômicos, aproximando-os de outros créditos, como os de carbono, que também são reconhecidos como bens intangíveis de valor comercial.

Embora os créditos de energia solar não se destinem primariamente à comercialização como os créditos de carbono, ambos compartilham a característica de serem ativos intangíveis com valor econômico. A possibilidade de venda dos créditos de energia solar em determinadas situações, como previsto na Lei nº 14.300/2022, reforça essa similaridade, conferindo-lhes uma dimensão patrimonial.

4.      Demanda Energética e o Hidrogênio Verde: Um Novo Horizonte para os Créditos de Energia Solar.

Com plantas de hidrogênio verde exigindo alta capacidade energética, como o projeto no Ceará com 1,2 GW iniciais, a integração entre geração distribuída e projetos de grande escala surge como uma oportunidade de sinergia.

A energia solar, uma das principais fontes renováveis no Brasil, não apenas sustenta essa transição, mas também pode transformar os créditos de energia em instrumentos para financiar e viabilizar tais empreendimentos.

5.      Em Defesa de um Consumidor Protagonista na Transição Energética

Os créditos de energia solar são mais do que mecanismos compensatórios; são direitos patrimoniais que conferem ao consumidor-gerador o papel de protagonista na construção de uma matriz energética sustentável, a regulamentação dos créditos de energia solar deve priorizar a proteção dos direitos do consumidor. A venda para a concessionária, com procedimentos transparentes e preço justo, pode garantir ao consumidor o retorno de seu investimento. A exploração de outras possibilidades, como a cessão de crédito entre consumidores, merece ser considerada.

Garantir autonomia e flexibilidade na gestão desses créditos, como a possibilidade de venda ou cessão para grandes projetos, pode alavancar ainda mais a integração entre geração distribuída e demandas emergentes, como a produção de hidrogênio verde.

Enquanto o Brasil avança em direção a liderar o mercado global de energia limpa, a regulamentação deve acompanhar essa evolução, assegurando transparência, justiça econômica e benefícios diretos para os consumidores-geradores.

A informação clara e transparente sobre os direitos e as possibilidades de utilização dos créditos de energia solar é essencial para que o consumidor possa usufruir plenamente dos benefícios da geração distribuída e contribuir ativamente para a construção de uma matriz energética mais limpa e sustentável.

Essa é uma reflexão para o futuro da energia limpa mundial, e o uso da energia renovável em todos os seus espectros, e esse futuro começou ontem!


[1] Bacharel em Direito e Administração pela Universidade Federal do Piauí - UFPI. Pós-Graduado em Direito Público e Auditoria e Perícia Contábil. Ex-Auditor da Eletrobras, foi gerente de processos e atuou na área de regulação e eficiência energética da companhia. Conhecedor e entusiasta do setor energético e regulatório do Brasil, com trabalhos relevantes em governança corporativa e empresarial. Atuou como professor do curso de Administração EAD-UFPI. Membro da Comissão de Acompanhamento do Processo Legislativo OAB-PI. Presidente do Comitê de Auditoria Estatutário da Empresa de Tecnologia do Estado do Piauí – Etipi. CEO e controller jurídico do Escritório Enoque Soares Advocacia.

Erik Saraiva

Coordenador Comercial Lekko Marketing

3 sem

Muito top! Conteúdo excelente 👏👏👏👏

Luiz Carneiro

Empreendedor em energia solar. Sistemas de geração solar para apartamentos e lugares sem telhados.

3 sem

Excelente artigo! A regulação precisa avançar, dando ao consumidor-gerador mais alternativas de uso dos créditos energéticos. Aumentando o avanço da transição energética no país e abrindo novas oportunidades.

Sophia Sales Selleguim

Advogada Júnior - Tributário

3 sem

Ótimos apontamentos!

Cecília Bastos

Advogada; Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho; Pós-graduanda em Direito Digital, Empresarial e Previdenciário.

1 m

Debate importantíssimo! Tema de extrema relevância.

Arielly Dantas

Advogada | Direito Digital | Contratos | Direito Civil

1 m

Muito bom! 👏👏

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