A Necessidade da evolução do Atendimento nas Unidades Básicas de Saúde do SUS.
O atendimento em unidades de saúde é um tema importante e relevante para a população brasileira, que depende do SUS para ter acesso a serviços de saúde de qualidade, integralidade e universalidade. O SUS é um dos maiores e mais complexos sistemas públicos de saúde do mundo, que atende mais de 190 milhões de pessoas todos os anos. Para funcionar bem, o SUS precisa ser organizado em diferentes níveis de atenção e assistência à saúde, de acordo com o grau de complexidade necessário para acolher as demandas dos usuários. O primeiro nível é a Atenção Primária à Saúde (APS), que é a porta preferencial de entrada do usuário no SUS, onde a maioria dos problemas de saúde podem ser resolvidos ou encaminhados para a rede de atenção especializada.
As Unidades Básicas de Saúde (UBS) são os estabelecimentos que prestam serviços na APS, onde atuam as equipes de Saúde da Família, compostas por médico, enfermeiro, técnico de enfermagem, agente comunitário de saúde e, em alguns casos, profissionais de saúde bucal e de outras especialidades. As UBS realizam ações e atendimentos voltados à prevenção e promoção à saúde, ao diagnóstico, ao tratamento e à reabilitação, com objetivo de desenvolver uma atenção integral, que considere as necessidades e as particularidades de cada indivíduo e de cada comunidade. As UBS também são responsáveis por realizar o acolhimento, a classificação de risco, o cadastro, o acompanhamento e o encaminhamento dos usuários, de forma humanizada e resolutiva.
No entanto, nem sempre o atendimento nas UBS corresponde às expectativas e às necessidades dos usuários, que muitas vezes se deparam com situações de grosseria, desinformação e desorganização por parte dos profissionais que trabalham nas unidades, principalmente por àqueles que estão responsáveis pelo primeiro atendimento ao público. Essas situações geram insatisfação, indignação, desconfiança e revolta nos usuários, que se sentem desrespeitados, desamparados e desassistidos pelo sistema de saúde, inclusive com manifestações negativas nas redes sociais contra todo o SUS.
É exatamente sobre "ATENDIMENTO" que pretendo abordar a seguir, partindo de um relato pessoal recente. No último final de semana, necessitei buscar atendimento em uma Unidade Básica de Saúde (UBS), responsável pela área onde resido, devido a sintomas que poderiam ser de dengue ou de uma infecção qualquer. Ao chegar ao local, fui atendido por duas pessoas na entrada encarregadas de preencher um formulário em papel com meu nome, endereço, CPF, data de nascimento e a hora de chegada, apesar de já ter um cadastro prévio na unidade, conforme ficha em papel que eu possuía, mas nem foi verificada. Após ser "orientado" a entregar o formulário no "Acolhimento", passei meia hora tentando descobrir a quem deveria entregá-lo em frente ao tal "Acolhimento". Após algumas tentativas frustradas com os "profissionais" que circulavam pelo corredor, mal atentos a uma simples pergunta e respondendo de maneira mal-educada e desinteressada, apenas dizendo para eu aguardar, que a prioridade era para idosos e crianças, e que me chamariam conforme a hora da chegada, uma delas afirmou que eu já estava no “sistema”. No entanto, eu não havia registrado minha chegada em nenhum "sistema", apenas fornecido os dados para preenchimento em uma ficha de papel com cópia única.
Não vou nem comparar o atendimento prestado a um animal, pois em qualquer clínica veterinária que já estive presente o tratamento dispensado aos meus pet foram muito mais humanizados. Nestes locais, o tratamento é sempre mais empático e cordial do que o dispensado aos cidadãos quando precisam ser atendidos em uma unidade de saúde do SUS.
Após muito tempo de espera, o que já é comum nesses locais como toda a população já deve ter experenciado, especialmente em momentos como este de epidemia, fui atendido por uma técnica de enfermagem e, posteriormente, por uma enfermeira. Não faltou empatia e cordialidade da parte delas, mas observei que, após responder a alguns questionamentos da técnica que aferia meus sinais vitais e registrou na ficha de papel, ainda na mesma sala já estava precisando repetir para a enfermeira que, finalmente, estava lançando os dados no "sistema" e no papel. Após isso, fui orientado a ir até o Laboratório com outra ficha em mãos e, estando lá, mais uma vez precisei confirmar meus dados e "complementar" informações cadastrais para o "sistema" registrar que realizaria um Hemograma e, assim, consultar via Internet o momento em que o resultado do exame estiver registrado como "pronto". Sim, o local possui um “sistema” que registra e informa o resultado dos exames para que o cidadão possa retornar depois para dar continuidade ao atendimento.
Me estendi no relato, detalhando alguns pontos para evidenciar absurdos que nos levam a concluir que um dos maiores desafios do SUS não se resume apenas ao seu tamanho e complexidade, à escassez de recursos humanos, materiais e financeiros, à demanda excessiva e diversificada de usuários, à falta de integração e articulação entre as UBS e os demais serviços e níveis de atenção à saúde, entre outros. O problema central reside na ausência de um atendimento condizente com os objetivos propostos pelo SUS, começando pela gestão de recursos humanos que permite a presença de profissionais não preparados para lidar com o público no ponto inicial do sistema.
Como servidor público há quase 20 anos, e atendendo ao público, jamais fui ignorante ou desagradável com as pessoas. Reconheço que os cidadãos esperam o melhor do Estado, que represento como servidor. Compreendo que as pessoas são a essência do sistema e que isso precisa ser enfatizado, sem qualquer hipocrisia. O Sistema Único de Saúde do Brasil sofre uma mancha devido a “profissionais” que ainda não compreenderam seu papel como servidores a serviço da população. Talvez seja o momento de uma mudança um pouco mais “inovadora”. Considerando que máquinas demonstram, em muitos casos, serem mais empáticas com os humanos do que alguns indivíduos, a inovação nesse sentido pode ajudar a evitar o “fracasso” do SUS.
Em diversas palestras e cursos sobre inovação, é recorrente citar casos de grandes empresas que sucumbiram à falta de adaptação aos avanços tecnológicos, como Kodak e Blockbuster. Contudo, é crucial ressaltar que nem sempre a ausência de inovação é o único fator determinante. A Blockbuster, por exemplo, teve sua queda iniciada devido a um péssimo atendimento a um cliente, evidenciando que inovação e atendimento estão intrinsecamente ligados. Uma multa de US$ 40 por ter devolvido com atraso um DVD do filme "Apollo 13" fez o americano Reed Hasting iniciar a Netflix.
Considerando esse contexto, surge a reflexão sobre a substituição de atendentes por robôs e sistemas de Inteligência Artificial (IA). Máquinas equipadas com IA poderiam oferecer uma qualidade de atendimento, paciência e empatia superiores ao público, elementos cruciais para o sucesso de qualquer sistema, especialmente em saúde no Brasil.
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No âmbito das Unidades Básicas de Saúde (UBS), aprimorar o atendimento envolve não apenas questões de Recursos Humanos (RH), mas também a modernização dos procedimentos, eliminando o papel e adotando soluções tecnológicas eficazes. Máquinas poderiam substituir atendentes e fichas de papel, registrando informações básicas do cidadão e integrando-se ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Propõe-se a implementação de um aplicativo do SUS, no qual um bot já teria a identificação e o registro dos sintomas do paciente. Esse aplicativo facilitaria a comunicação, indicando o local e horário para o melhor atendimento, evitando deslocamentos desnecessários e longas esperas. Ao chegar ao local, robôs seriam capazes de identificar o paciente e realizar toda a gestão da demanda local.
É conhecido que as Unidades Básicas de Saúde (UBS) enfrentam uma demanda excessiva e diversificada de usuários, superando frequentemente a capacidade de atendimento das unidades, resultando em filas, espera, demora, congestionamento, insuficiência, desorganização, conflitos e violência, afetando tanto os profissionais quanto os usuários. Muitas UBS atendem um número de usuários muito maior do que o previsto, apresentando diferentes necessidades e demandas de saúde, nem sempre compatíveis com o perfil e a proposta da Atenção Primária à Saúde (APS). Adicionalmente, é comum que alguns usuários desconheçam ou não respeitem o fluxo de atendimento das UBS, buscando atendimento imediato, sem passar pelas etapas necessárias, como acolhimento, classificação de risco, cadastro e encaminhamento, comprometendo a qualidade e resolutividade do atendimento.
A introdução de robôs com Inteligência Artificial (IA) não se limitaria a fornecer informações precisas, mas também englobaria a realização de procedimentos básicos, como aferição de pressão, temperatura, verificação de peso e altura, além da coleta de dados vitais e amostras de sangue para exames diagnósticos.
Essa integração de dispositivos inteligentes ao sistema proporcionaria um atendimento mais eficiente, personalizado e ágil, contribuindo significativamente para as UBS enfrentarem os desafios decorrentes da escassez de profissionais qualificados, equipamentos, medicamentos, insumos, infraestrutura, transporte, comunicação, segurança e apoio técnico e administrativo, recursos essenciais para o funcionamento adequado dessas unidades.
É amplamente reconhecido que a falta de recursos pode gerar sobrecarga, estresse, insatisfação, desmotivação, adoecimento e desgaste nos profissionais de saúde, refletindo diretamente em seu comportamento e na relação com os usuários. A adoção de soluções tecnológicas inovadoras poderia aliviar essa pressão, melhorando não apenas a eficiência do atendimento, mas também o bem-estar dos profissionais e a satisfação dos usuários do sistema de saúde.
Em resumo, a integração entre inovação tecnológica e atendimento humanizado é fundamental para aprimorar o funcionamento de qualquer sistema, especialmente no desafiador contexto da saúde pública, considerando os enormes desafios enfrentados pelo SUS. Sistemas inteligentes voltados para o atendimento público de saúde têm o potencial de transformar o cenário, proporcionando um atendimento ao cidadão mais eficaz, respeitoso, atencioso, informativo, organizado e humano. Afinal, o Sistema Único de Saúde do Brasil, juntamente com toda a população, sofre as consequências de profissionais do atendimento que não correspondem aos padrões esperados e que todos nós merecemos.