Nem tudo é sobre você...
Uma das coisas mais difíceis da minha vida, desde que eu era uma criança e achava que o mundo acontecia totalmente por minha causa, foi compreender que nem tudo acontecia da forma como EU pensava.
Eu sei que toda criança está no processo de se diferenciar dos outros, ela ainda acha que tudo no mundo gira em torno dela, ela acredita realmente que se ela gosta de alguma coisa todo mundo gosta e se ela não gosta é claro que ninguém mais gosta.
Conforme a gente vai lidando com as pessoas, os conflitos começam a aparecer e a gente percebe que nem tudo funciona como imaginávamos na nossa cabeça. Você começa a entender que as outras pessoas têm um mundo completamente diferente do seu, ela tem gostos diferentes dos seus, ela tem forma de pensar diferentes das suas e até a maneira que elas enxergam escutam é levemente diferente, dizem os especialistas.
Agora não pense você que esse processo acontece de um dia para o outro, e que ele acontece sem nenhum tipo de sofrimento. Você pode “na teoria” até compreender que as pessoas são diferentes e pensam diferente de você, mas “na prática”, ali no meio das relações, é só depois de algum sofrimento que você compreende isso.
Portanto na construção da nossa identidade, precisamos reconhecer aquilo que é nosso e também ganhar clareza sobre o que não é. Esse "NÃO EU" só é aprendido nessas trocas com outras pessoas, nos pequenos embates sobre qual é o sabor mais gostoso de sorvete, ou em momentos mais dramáticos como na história que eu vou te contar agora.
Devido à educação liberal que recebi da minha família, nunca fui de ter muitos pudores, lidava com a minha sexualidade com bastante liberdade, e comecei a experimentar minhas relações com homens desde muito novinha (digo isso porque só depois dos 30 que me permiti viver o outro lado da minha moeda e me relacionar também com as mulheres).
Lembro-me como se fosse hoje de um evento que aconteceu há quase 15 anos atrás, tinha uns 20 anos de idade, estava fazendo faculdade e tinha algumas amigas. E como quase toda jovem que está explorando sua sexualidade e seus relacionamentos, conversava sobre minhas relações com elas.
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Na época, parecia quase impossível na minha cabeça a idea de se conhecer uma pessoa, sentir atração por ela, querer ter um relacionamento com ela, e não ter relações sexuais de imediato. Era uma regra que eu tinha, se você gostar você tem que transar. Percebam, isso não era verdade do mundo e nem funcionava desse jeito para todas as pessoas, mas na MINHA cabeça deveria ser assim.
Pois bem, conversando no intervalo de uma das aulas da faculdade eu descubro que uma colega minha estava mais de 8 meses flertando com um rapaz sem sequer ter dado um beijo na boca ainda!! Eu me lembro que comecei a rir, fiquei estupefata, achando que ela só podia estar brincando comigo! Mas a reação dela ao invés de rir, foi de ficar triste e logo em seguida ficar nervosa, ela olhou na minha cara e com lágrima nos olhos me disse:
"Nem tudo no mundo funciona do seu jeito Patrícia! Você precisa me respeitar! Para mim o toque físico só pode acontecer depois do namoro! Agora se você faz de outro jeito, ótimo para você, não tente impor as suas regras na minha vida!" Ui.... naquela época eu não consegui perceber que a minha fala tinha sido tão invasiva para ela.
A ideia de compartilhar essa história aqui com você é mostrar que: tão importante quanto reconhecer e aceitar a NOSSA identidade; o nosso jeito de ver o mundo, os nossos hábitos e costumes é aprender a ouvir e perceber o OUTRO.
Só nos tornamos realmente adultos quando sabemos diferenciar o que é nosso do que é do outro. Em relação a vários aspectos: pensamentos, sentimentos, comportamentos, modos de vida, culturas, hábitos, e tudo mais que você imaginar. E além de simplesmente identificar as diferenças é necessário que respeitemos essas diferenças.
Somos seres de relação, o que significa que não vivemos sozinhos, e sequer seríamos capazes de sobreviver sem um coletivo de outras pessoas dispostas suprir as nossas necessidades biológicas, afetivas e intelectuais.
Muitos dos nossos grandes conflitos e sofrimentos da vida adulta nascem do embate entre essas diferenças, acredito muito que ampliar a consciência sobre si, e ampliar a consciência sobre o outro, percebendo esses padrões relacionais é a solução que todos precisamos.
Na semana que vem eu volto, e vamos conversar um pouco mais sobre esses padrões e suas diferenças, te espero.