A nova publicidade é a do boca a boca
O mundo passa por um momento de transformação talvez nunca visto na história da humanidade. A tecnologia digital vem revolucionando nossas vidas e nossas relações de trabalho, sociais e de consumo. A cada dia, vemos novas formas de economias surgindo, e negócios antes impensados revolucionam diversos mercados como o de transporte, de hotelaria, de comunicação, entre outros. Mas será que as empresas estão preparadas para acompanhar as necessidades do novo consumidor? Como os profissionais de marketing têm pensado as novas formas de interação entre empresa e consumidores nesse novo cenário? Para responder a estas e a outras perguntas, conversamos com Andréa Dietrich, palestrante e colunista do Meio & Mensagem, principal veículo direcionado aos profissionais de comunicação, e eleita como um dos 50 profissionais mais inovadores do mercado digital pela revista Proxxima e TOP 3 profissional de canais digitais pela Info Exame. Confira:
Site Renata Spallicci –Estamos em um mundo cada vez mais conectado, com as vendas on-line cada vez mais fortes e presentes na vida do consumidor. Como o mercado, em especial o varejo, está se adaptando às novas formas de consumo?
Andréa Dietrich –O grande desafio do mercado em geral é construir um relacionamento com esse consumidor independente, se o canal é on ou off-line. O que entra na pauta dos grandes varejistas é a construção dessa plataforma omnichannel, que permite conhecer, vender e se relacionar com o consumidor, onde quer que ele esteja. Não podemos mais ter canais separados, o que é um superdesafio, uma vez que as plataformas tecnológicas, as estruturas organizacionais e o mindset dos líderes ainda não estão prontos para responder a isso. Estamos num momento importante de desconstrução de um modelo para o nascimento e crescimento de outro.
SRS –Como ficarão as lojas físicas em um futuro próximo? O que elas precisam mudar para continuar atraindo os consumidores?
AD –O papel da loja física, em minha opinião, será cada vez mais de oferecer uma experiência única, que o mundo virtual não será capaz de reproduzir. Muitas lojas, principalmente as de não alimentos, acabarão sendo grandes“showroomings” para experimentação e conhecimento dos itens que esse consumidor pode comprar na hora, na loja, ou quando chegar em casa, pela internet. A transação pode acontecer em qualquer lugar, e as lojas serão pontos de apoio ao cliente e, portanto, deverão oferecer um excelente serviço e um ambiente aconchegante. Acredito que as lojas serão mais sensoriais e relacionais, e menos transacionais.
SRS –Como o Big Data está definindo os novos padrões de consumo e como as empresas podem fazer uso desta plataforma?
AD –Cada clique que você faz na internet deixa um rastro, um rastro que diz muito sobre o que você gosta, em que você está interessado, o que você compra, com quem você se relaciona, que marcas você curte, etc. Um mundo de informações comportamentais e transacionais ao qual as marcas, antes, tinham acesso por meio de muitas pesquisas que levavam muito tempo e custavam muito caro. Hoje, tais informações são real time e estão superacessíveis para as marcas usarem de forma a se relacionar com seu consumidor de forma precisa e muito mais eficiente. Em publicidade, por exemplo, os dados facilitam e otimizam a vida do consumidor, que é impactado somente por aquilo que realmente tem a ver com o que ele é ou procura, e para as marcas é muito menos dispersão, conseguindo fazer uma publicidade extremamente eficiente, com muita precisão no seu target. E além de publicidade, os dados possibilitam conhecer o seu consumidor a fundo e acompanhá-lo em sua jornada, possibilitando uma relação muito mais individualizada, contribuindo, portanto, para a fidelização dele. Num futuro próximo, quase tudo que conhecemos hoje será pautado pelo conhecimento e análise de dados.
SRS –Quais as inovações mais bacanas que você já acompanhou pelo mundo em termos de unir tecnologia e conectividade a serviço do consumidor?
AD –Não poderia deixar de falar em Facebook, que mudou a forma com que nos relacionamos uns com os outros, de WhatsApp, pois não conseguimos mais imaginar nossas vidas sem ele, do Uber, que já virou a maior companhia de táxis do mundo, e não tem nenhum carro, o Airbnb, que já é a maior rede de acomodações do mundo e não tem nenhum empreendimento, e por aí vai. São modelos totalmente disruptivos, que transformaram suas indústrias e que só usam tecnologia e muitos dados a serviço das pessoas.
SRS –Você acredita que as empresas brasileiras, no geral, têm sabido explorar as novas ferramentas que hoje temos a nosso dispor, de forma que realmente tragam ganhos para elas? Seja de imagem ou de vendas? O que se faz certo e o que não se deve fazer no novo mundo do consumo?
AD –O que acontece por aqui não é diferente do que acontece no mundo, mas nós sofremos um pouco mais por causa da nossa infraestrutura geral em termos de banda e acesso da internet para todos. O brasileiro gosta muito de inovação e adota rapidamente as novas tecnologias em sua vida, sem falar que somos um povo muito social. Portanto, adoramos as redes sociais e tudo que venha através delas. Não é à toa que estamos sempre no topo de maiores comunidades em Facebook, Twitter e WhatsApp, por exemplo. E o que vemos é o usuário mudando e adotando muito rapidamente essas tecnologias, e as empresas ainda com grande dificuldade de acompanhar essa velocidade. Ainda estamos presos a um modelo mais tradicional de fazer negócios, mais hierárquico, mais burocrático e mais avesso a riscos, e, muitas vezes, tudo isso trava a vontade de inovar. E é por esse tipo de barreiras que novos negócios têm surgido e destruído empresas superconsolidadas. Quem não acompanhou os tradicionais cases de Kodak e Blockbuster? E isso está acontecendo a todo momento com segmentos diversos. Vamos voltar aos exemplos de cima, Uber, Airbnb, Facebook. Esse tipo de negócio está destruindo modelos até então estabelecidos. O que se deve fazer? Acredito que precisemos rever nossas estruturas, nossas lideranças, nossos processos, nossas regras jurídicas, nossa infraestrutura e estabelecer um processo contínuo de inovação, que requer testar e errar. Requer muita humildade, muito esforço e muito trabalho em time, mas tem de começar, e rápido.
Muitas empresas pensam que precisam ser gigantes para aplicar de forma bacana as tecnologias a serviço dos seus clientes. É possível usar a tecnologia de forma inteligente e baixo custo? Com certeza. Posso garantir que existe alguma startup, em algum lugar no mundo, fazendo alguma coisa inovadora para seu segmento, e, portanto, pensando em formas mais fáceis e baratas, por meio da tecnologia. A inovação não precisa vir necessariamente de dentro da organização com grandes compras de tecnologia, mas ela pode vir de uma parceria, de uma sociedade, um movimento colaborativo externo. E isso não tem nada a ver com porte da empresa. Ao contrário, acredito que as empresas menores têm mais chances e velocidade de inovar do que as gigantes, e muito pelos pontos que coloquei na pergunta anterior.
SRS –O varejo ainda trabalha muito a questão do preço. Como tirar o preço do centro da discussão e levar o consumidor a perceber outros atributos?
AD –É muito perigoso para uma empresa pensar somente na relação preço e produto, pois não se constroem vínculos com esse cliente. Então, a relação é muito mais racional, onde quem der menos leva. Claro que, num momento como o que estamos vivendo atualmente, o consumidor fica mais sensível às questões de preço, mas o consumidor espera muito mais do que preço. Ele percebe e dá valor, sim, à qualidade, ao serviço, ao atendimento, e procura equacionar isso com o valor que paga. Existem várias formas de mostrar um bom custo benefício sem precisar se fixar em preço. Já está comprovado por alguns estudos que as marcas que constroem valor para os consumidores resistem muito mais às crises do que aquelas que são puramente transacionais. Construir valor é se importar com a qualidade do produto ou serviço que você oferecer, é se importar com o pré e o pós-venda, é dar acesso e facilitar a vida dele, é personalizar o relacionamento, etc.
SRS –Saindo um pouco da questão tecnológica, observamos que, cada vez mais, os clientes buscam um alinhamento entre a promessa das empresas e propósito de negócio com o que realmente está sendo oferecido. Empresas que atuam de forma mais consciente e transparente ainda levam mais pontos com os consumidores?
AD – Sim. E com o crescimento da internet, isso ganha cada dia mais força. Já virou parte do nosso modus operandi buscar informações sobre marcas e produtos antes de irmos às compras, certo? Não saímos de casa sem dar umGoogle. Os consumidores estão mais informatizados e conectados e dão muito mais valor ao que é dito pelas pessoas sobre aquela marca do que o que ela mesma diz sobre ela. Você compraria um produto sabendo que a marca poluiu um rio e prejudicou a vida de milhões de pessoas? Compraria sabendo que foi feito por trabalho escravo infantil? Compraria sabendo que uma outra cliente recebeu com defeito e ninguém nunca ressarciu os prejuízos dela? As pessoas não toleram mais marcas que não respeitem a diversidade, que não respeitem ou que prejudiquem o ambiente, e que não deem atendimento devido. A nova publicidade é a do boca a boca, o que vende uma marca é a experiência que ela deixa na vida das pessoas e não o comercial de 30 segundos. Essa é a construção de marca do século XXI, marcas com propósito, marcas com causas, marcas que fazem o que falam e não têm nada a esconder.
Busque seu propósito. Deixe o seu legado
Renata Spallicci
Propagandista vendedor
8 aNada supera o boca a boca e o olho no olho.