O alimento como objeto único para lidar com o sofrimento.

O alimento como objeto único para lidar com o sofrimento.

A busca desenfreada pela perfeição dos corpos imposta pela sociedade atual se esbarra em dificuldades geradas por essa mesma organização humana. Uma série de cobranças e pressões nos leva a um estado de sofrimento, ansiedade, estresses, angústias e sensação de vazio. A consequência dessa situação é o surgimento de vários problemas, entre eles está o transtorno alimentar ocasionando excesso de peso e obesidade. Desse modo, o tratamento interdisciplinar é o mais viável para essa situação no qual ressaltaremos a importância da clínica psicanalítica nesse trabalho conjunto.

Somos seres que vivemos em sociedade e para que essa relação seja assegurada, algumas exigências são impostas às pessoas. Dentre esses contratos de vinculação ao social, o corpo magro vem sendo cada vez mais cultuado oferecendo destaque para aqueles que se mantem nesse padrão. Ao contrário do que se prevê nesse contrato, o que percebemos, é a emergência de sintomas alimentares.

O tipo de vida que levamos hoje, com a falta de tempo, pressão do chefe, complicações familiares, trânsito, violência, dificuldade econômicas, falta de emprego etc. tem nos levado a desajustes emocionais tais como: angústia, estresses e sensação de vazio. Etc. Frente a esses fenômenos, é notória a eleição do alimento como objeto para lidar com esses transtornos.

O efeito colateral disso vemos claramente quando saímos nas ruas, são pessoas com excesso de peso ou em grau de obesidade. A maior parte delas é cobrada, pressionada a emagrecer, visto que não há espaço para esse tipo de padrão. O perigo aumenta quando elas próprias tomam essas cobranças como uma pressão pessoal. Nessas condições, o sofrimento mental só aumenta e elas passam a comer cada vez mais. É como a dosagem de um remédio que precisa ser dobrada para combater a patologia instalada.

Essa relação é clara, se há no alimento uma figura representativa de obturação do vazio instalado pela insatisfação social e pessoal, o lógico seria aumentar a alimentação para superar essa sensação. Nesse sentido, já não há mais uma ingestão por prazer, mas por desespero na tentativa de superar essa angústia.

O que se percebe no imaginário social é a caracterização da obesidade como doença e o emagrecimento como remédio. Por esse motivo, atribui-se à medicina uma especialidade exclusiva para tratar tal “patologia”. É indiscutível a importância do médico no diagnóstico e no tratamento, porém é imprescindível um trabalho multidisciplinar, pois não basta atacar apenas o transtorno e seus mecanismos físicos.

Em outras palavras, não basta apenas emagrecer, se não dermos ênfases às causas psicológicas implicadas nesse dilema, teremos apenas efeitos momentâneos. Nos primeiros obstáculos na efetivação do tratamento orientado pelo profissional, tudo pode cair por terra. Isso normalmente acontece por causa do sentimento de frustração que emerge da queda dos objetivos. Para isso, o sujeito tem que está estabilizado psiquicamente ou voltará a utilizar as guloseimas para suportar esses momentos de angústia.

A prática psicanalítica tem nos mostrado a importância do sujeito nomear seu sofrimento pondo em causa, questões implicadas nesse processo angustiante, no qual o ato de comer se tornou o objeto único no tratamento de seu mal-estar. Quando o paciente não se coloca em evidência não há responsabilização nesse processo aguardando do outro ( médico, nutricionista etc.), a solução para os seus impasses.

Quando ele se permite a adentrar nessa dinâmica de responsabilização, se tornará mais autônomo e enxergará os reais motivos do seu sobrepeso. Logo, o que irá acontecer será a retirada do alimento como objeto principal e consequentemente, a busca de novas vias para rever suas instabilidades emocionais. Isso pode ser colocado em prática no processo analítico, tendo em vista que o papel da clínica psicanalítica é ampliar o campo de subjetivação de modo que o paciente possa operar na busca de novas significações a cerca do seu sofrimento.


Welton André Nascimento da Silva

Psicólogo CRP 03/10520 


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