O artificial que nos torna superficial
Venho do mundo da tecnologia. Já trabalhava com algoritmos muito antes da inteligência artificial se democratizar e testemunhei os avanços que ocorreram nos últimos 20 anos. Porém, ao mesmo tempo em que vejo esses progressos com admiração, carrego reservas sobre como serão os próximos 20 anos. Lembrando que o problema não é a tecnologia em si, mas sim o uso que fazemos dela.
Vivemos em um mundo onde a tecnologia avança a passos largos. Inovações como a inteligência artificial, que antes pareciam sair das páginas de ficção científica, hoje estão entrelaçadas ao nosso cotidiano, transformando a maneira como trabalhamos, nos comunicamos e até mesmo como tomamos decisões. A inteligência artificial promete revolucionar setores inteiros, trazendo eficiência, velocidade e precisão. No entanto, é essencial questionar: esse avanço tecnológico está realmente tornando a vida humana melhor?
Temos a tecnologia para mudar o mundo, mas não estamos criando seres humanos melhores. Avançamos em inúmeras frentes, mas vemos também uma crescente deterioração em certos aspectos essenciais do ser humano. De um lado, estamos desenvolvendo algoritmos capazes de aprender e evoluir, diagnosticando doenças com precisão e realizando tarefas com eficiência inimaginável. Do outro lado, as taxas de ansiedade, depressão e isolamento social aumentam de forma alarmante. Parece haver uma contradição em curso pois, à medida que a tecnologia evolui, a condição humana parece regredir em aspectos tão fundamentais.
O filósofo estoico Sêneca certa vez disse: "É parte da cura o desejo de ser curado". Em nosso contexto moderno, parece que esse desejo de cura está mais focado nas soluções tecnológicas do que na evolução pessoal. O avanço da inteligência artificial e de outras tecnologias tornou-se quase uma obsessão, enquanto habilidades humanas básicas como empatia, paciência e autocontrole são deixadas de lado. Em muitos casos, a tecnologia que deveria servir para aproximar e enriquecer as relações humanas, tem criado um efeito oposto, alimentando comparações, inseguranças e o desejo por validação instantânea.
Vejamos o exemplo das redes sociais, impulsionadas por algoritmos que determinam o que vemos e como nos sentimos. Essas plataformas, criadas para conectar, muitas vezes fomentam a superficialidade, a polarização e a insatisfação. Elas exploram a necessidade humana de aceitação, gerando um ciclo vicioso de busca por aprovação e prazer instantâneo. Toda vez que recebemos uma notificação, a dopamina é liberada no cérebro, criando uma sensação temporária de satisfação. Mas, ao invés de preencher um vazio, isso frequentemente gera um desejo incessante por mais, tornando-nos escravos de um ciclo que nunca sacia plenamente.
A tecnologia pode nos dar o que desejamos rapidamente, mas ela também pode nos afastar daquilo que realmente importa. Temos assistentes de voz que respondem às nossas perguntas instantaneamente, mas muitas vezes nos tornamos impacientes em conversas reais. Usamos ferramentas para nos tornarmos mais produtivos, mas, paradoxalmente, nos sentimos cada vez mais sobrecarregados e incapazes de nos concentrar. Temos tecnologia que promete liberdade, mas que muitas vezes nos aprisiona em uma busca incessante por mais conexões, mais notificações, mais reconhecimento.
Recomendados pelo LinkedIn
Epicteto ensinava que “nenhum homem é livre se não puder controlar a si mesmo.” No entanto, em um mundo onde a tecnologia está em toda parte, como exercemos esse controle? Como podemos evitar que as ferramentas que deveriam servir ao nosso crescimento nos tornem mais superficiais e menos conectados com nossa própria essência?
A inteligência artificial é apenas uma das muitas faces do progresso tecnológico, mas ela simboliza bem essa dicotomia. Por um lado, ela tem o potencial de transformar vidas para melhor, desde o diagnóstico precoce de doenças até a automação de tarefas repetitivas, liberando tempo para atividades mais importantes. Por outro lado, se não for utilizada de maneira consciente e ética, ela pode amplificar nossos piores impulsos e fragilidades, tornando-nos dependentes e superficiais, em vez de mais humanos e plenos.
O estoicismo, uma filosofia que enfatiza a virtude, o autocontrole e a busca por uma vida guiada pela razão, oferece uma visão contrária ao uso desenfreado da tecnologia para a satisfação imediata. Ele nos convida a focar no que realmente importa: não em ter mais, mas em ser mais; não em buscar recompensas externas, mas em cultivar virtudes internas. Nesse sentido, o estoicismo nos lembra de que o progresso real vem de dentro, e não de fora.
É claro que a tecnologia, inclusive a inteligência artificial, pode ser uma aliada em nossa busca por um mundo melhor, mas apenas se não perdermos de vista o que realmente nos torna humanos. Precisamos usá-la como uma ferramenta para ampliar nosso potencial, para promover conexões reais e para resolver problemas genuínos, sem esquecer que a verdadeira evolução é aquela que acontece dentro de cada um de nós.
Como Marco Aurelio afirmou em suas "Meditações": "Você tem poder sobre sua mente, não sobre eventos externos. Perceba isso, e você encontrará força." Temos a tecnologia para mudar o mundo, mas é fundamental lembrar que nenhum avanço tecnológico substituirá a necessidade de cultivarmos a empatia, a compaixão, a paciência e a sabedoria. Em um mundo que avança tecnologicamente, não devemos esquecer que a verdadeira revolução começa dentro de cada um de nós.
Precisamos de um balanço cuidadoso entre o uso de ferramentas tecnológicas e o cultivo de nossas capacidades humanas. O caminho para um futuro verdadeiramente próspero não está apenas em criar máquinas mais inteligentes, mas seres humanos melhores.
Sou planejador financeiro pessoal, CEO e sócio fundador da plataforma de saúde financeira SuperRico.
Consultor Independente
3 mInsightful! Ótimo incentivo à reflexão, também aos mais propensos ao „deixa a vida me levar“… É o uso (consciente) que fazemos de qualquer conhecimento ou invento, que determina sua utilidade, e se veio para o bem ou para o mal.
"Volta teu rosto em direção a luz e a escuridão não existirá!" Sonhe, acredite e faça acontecer!"
3 mNão basta apenas pensar no futuro, é necessário pensar também em quem estamos deixando para o futuro. Podemos criar um monte perfeito hoje, mas se não educamos nossos filhos para pensarem também no futuro, tudo se perde.
Especialista em Desenvolvimento de Negócios | Corporate | B2B | Channel | Sales Evangelist | Presidente Comitê Executivo | Project and Service Specialist | Conselheiro | Mentor | Palestrante | Professional Coach
3 mCarlos Castro, CFP® memorável e oportuno artigo. Como admirador da filosofia estóica moderna, faço minha suas palavras: "Temos a tecnologia para mudar o mundo, mas não estamos criando seres humanos melhores". Somos seres sociais, onde a conexão humana é insubstituível, a inteligência artificial, realidade virtual, aumentada e aí vai... gera conteúdos, experiências, sensações ... mas não substitui o "calor" humano! #umEternoAprendiz #LifelongLearning #filosofiaEstóica #desenvolvimentoHumano #savoring
Gerente Geral de Agência | Líder |Administração de Empresas | Vendas | Comercial | MBA Liderança e Coaching na Gestão de Pessoas | Pós Graduação Mercado Financeiro e Banking | ANBIMA CPA-20 | PCA -10 Consórcios
3 mCompartilho do mesmo pensamento e sentimento descrito no seu artigo Carlos Castro. A tecnologia avança e a humanidade parece retroceder em sabedoria, empatia, compaixão, humildade. Até quando ? Como mudar esse cenário ?
at ITERANEX
3 mO diagnóstico está correto. O tratamento precisa ser aperfeiçoado. Vem através de uma evolução espiritual. Estamos no caminho certo? Vejo crianças neste caminho. Vejo adolescentes perdendo o rumo. Vejo adultos perdidos. Esta transição precisa ser revista.