O atual cenário Político e Econômico do Brasil evidencia a obrigatoriedade da gestão pelo caixa em processos de recuperação judicial
No início de 2017, as expectativas do Banco Central do Brasil para o desempenho da economia no ano corrente, mostravam uma retomada lenta com manutenção do desemprego, inflação recrudescendo e Real levemente desvalorizado.
Após um trimestre, observamos um quadro melhor, sinalizado pelo índice de difusão do Banco Central IBC-BR que já capta esta evolução (alta de 1,31% contra queda de 0,76% no período anterior), mas com um desemprego assustador - cerca de 14,1 milhões de desempregados. Os dados de venda de veículos e vendas no varejo sinalizam aquecimento, mas a retomada continua tímida
Para 2017 temos as seguintes expectativas:
· IPCA 2017: 4,06% / 12 Meses à Frente: 4,59%
· PIB 2017: 0,40%
· PIB 2018: 2,50%
· Produção Industrial 2017: 1,26%
· Produção Industrial 2018: 2,26%
Em suma temos (e teremos) um 2017 e 2018 com muito trabalho e quem tem impactado de sobremaneira a operação e a recuperação de empresas em dificuldade.
Há cerca de dez anos cuidamos de companhias que precisam de ajuda em seus processos de reestruturação. A estrutura tributária, jurídica e operacional do Brasil não é voltada para o estímulo produtivo, mas sim para permitir a interferência (e ineficiência) do estado no processo produtivo. Sob esta visão, destacamos (e discorremos) sobre os principais pontos de impacto na recuperação e gestão de empresas no Brasil:
1. Falta de um gerencial verdadeiro – calcados no caixa e não em balanços entregues apenas para satisfazer as necessidades do fisco. Afinal, para que servem indicadores baseados em números errados? Não é melhor olhar para a realidade daquilo que se paga, que se compra ou que efetivamente se recebe?
Passamos por um período extremamente crítico, conduzido pela irresponsabilidade fiscal de um governo populista. Isso é fato e que acabou por acarretar uma série de problemas no dia a dia, mas sejamos realistas, esta também é a principal desculpa quando a assunto é justificar a ineficiência das empresas no Brasil.
Grande parte das companhias brasileiras, compra um sistema gerencial, porque a legislação obriga tal movimento, mas não faz a mínima idéia de como operá-lo e sequer investe qualquer valor na capacitação de seu time e em seus controles internos para que não haja erros de inserção de dados, captura de informações ou gestão de suas operações. As coisas simplesmente vão acontecendo.
Ao capturar dados de forma errada (e aleatória) comprometem-se a contabilidade, a controladoria e por fim vamos necessitar de uma auditoria, que vai apontar erros, mas vai ser paga exatamente por quem está errando.
Grande parte das empresas que entram em um processo de recuperação judicial, faz este movimento buscando apenas prazo e sem um correto diagnóstico de sua real capacidade de pagamento. É um erro é fatal, visto que em grande parte dos casos de recuperação judicial, o management – que foi responsável pelo momento atual, em conjunto com as adversidades da economia – continua com as mesmas práticas e se baseando em informações errôneas. Pode ser uma opinião dura, mas o processo de recuperação judicial, tem que ter uma ancoragem financeira, desenhada em conjunto com credores e financiadores. Este tripé cria um plano robusto, efetivo e que vai embasar o trabalho da equipe jurídica e facilitar a aprovação do plano pela assembleia de credores.
A lei 11.101 tem lá suas falhas, mas tem seus acertos. Utilizar este instrumento apenas para ganhar tempo é jogar dinheiro fora.
O momento econômico é de retomada, ainda que lento, e permite que boas negociações sejam realizadas, baseadas em um conceito real – de disponibilidade de recursos – e não em orçamentos, controles ou modelos que na esmagadora maioria dos casos estão baseados em números errados e que vão trazer sérios erros de execução.
Em suma o grande ponto que o controlador tem de discutir é: Em cima de minhas disponibilidades reais, consigo liquidar as despesas do mês e pagar minha recuperação ou não? Por um momento, encare seu problema de frente: esqueça fórmulas milagrosas, distorções contábeis que a lei permite, e chicanas jurídicas com credores. Em nossa experiência, nas recuperações judiciais bem sucedidas, os credores tem de ser honrados porque eles vão continuar a fornecer.
Muitos confundem o administrador judicial, como o responsável pela condução de reestruturação, mas o dia a dia não funciona deste modo. É fundamental que a companhia esteja disposta a mudar, eliminando vícios, mudando quadros de colaboradores e em especial contratando uma equipe externa que venha com uma nova mentalidade de finanças e processos. Não há saída é imperativo mudar e trabalhar em equipe.
2. Custos são como unhas. Apenas cortar resolve?
Não. Basta observar o movimento da BRF, sob o comando de Abílio de Diniz que tentou “Ambevizar” a operação de suas fábricas e parou de ouvir clientes e fornecedores, cortou custos demais, travou a cadeia produtiva e acabou tendo prejuízo e perdendo share.
O discurso de que “sempre cortamos custos” é apenas retórica. Reduzir por reduzir não leva empresa nenhuma a lugar algum. É necessário entender o contexto, criar um pano estratégico que compreenda, caixa, custo, orçamentos e principalmente inteligência de vendas.
3. Dificuldade do empresário brasileiro em delegar, ter uma postura aberta e em especial profissionalizar sua operação.
Em 2015, conduzimos uma pesquisa de propósito de valor junto com o pessoal da “Baita” uma aceleradora de startups formada por professores da Unicamp para entender como o empresário de middle market, conduz seus negócios.
O resultado foi assustador, porque todos tinham problema de gestão financeira, erros em indicadores por falhas de input de dados e principalmente falta de entendimento na gestão do fluxo de caixa. Gerir o caixa não é consultar o extrato e ver o saldo.
O brasileiro é conservador, oligárquico com uma dificuldade enorme em delegar funções e assumir a realidade, afinal não é elegante ter de explicar a um terceiro aonde o empresário gasta seu próprio dinheiro. Sem dúvida este é um ponto complexo e delicado e obriga uma mudança de postura pelo controlador que tem de entender que o processo de reestruturação trata da sobrevivência e fortalecimento das organizações e não, apenas observar os descaminhos da operação.
4. Excesso de encargos e viva a terceirização!
Impostos em cascata, falta de uma política industrial (e de estímulo geral as empresas) fazem o cenário cada vez mais inóspito para quem tem uma empresa no Brasil.
Não somos um celeiro de empreendedores, o momento econômico atual, a falta de valor atribuída ao profissional com mais de 40 anos (!) obriga milhares de pessoas a tentar um vôo solo não planejado. Some-se a isto os encargos trabalhistas, que criam uma série de entraves para novas contratações, tiram a competitividade do produto brasileiro, mas são ferozmente defendidos pelos funcionários, que não percebem que com menos encargos estes teriam mais recursos à disposição e com menor interferência do estado.
Nos casos mais profundos de reestruturação que conduzimos, somos sempre (sempre) obrigados a demitir por conta dos altos custos trabalhistas. Empregos poderiam ser preservados, mais dinheiro poderia circular na economia e menos companhias estariam em dificuldades. Afinal, precisamos de colaboradores para vender produtos, operar máquinas e etc. Pouquíssimos países tem uma estrutura tão pesada – do ponto de vista trabalhista – como o Brasil. A lei de terceirização, que causou tanta discussão, é um passo correto no sentido de modernizar uma legislação com mais de 70 anos.
5. Falta de políticas públicas que estimulem a produção e a exportação
Nos anos de administração petista, observamos no ciclo Lula a manutenção dos pilares do Plano Real – que possibilitou o crescimento do país de forma inercial. Não houve melhora da estrutural. Nos anos seguintes, os governantes imaginaram que tudo ficaria exatamente como estava, já que as nações desenvolvidas estavam em crise e portanto para que o pais não sofresse bastava irrigar a economia com crédito. Foi o começo do desastre atual.
Mesmo nos anos de PSDB, o país nunca teve uma política de estímulo à produção ou empreendedorismo, houve sim sensível aumento da carga de tributos para financiar um estado deficitário, com impostos em cascata o que acabou em insolvência de vários estados da federação.
Ao seguir um caminho populista, o PT imaginou que bastava manter o crédito para que a economia continuasse girando e arrecadando, mas alguém esqueceu de combinar com as empresas, os consumidores e com o cenário externo.
6. Cenário político extremamente desfavorável e fortemente impactado por pagamentos de subornos ao agente público. Finalmente, apareceu a Lava Jato
A operação Lava-Jato veio mudar de sobremaneira a condução dos negócios no país. Vai “passar o país à limpo” e mudar o jeito de operar no Brasil. Como este texto trata de empresas em recuperação judicial, cabe um destaque extremamente preocupante e negativo: grande parte das corporações nacionais que observou crescimento vertiginoso nos últimos anos, tinha relação com o governo e portanto sujeita ao pagamento de vantagens indevidas, complicando ainda mais a vida do empresário que quer apenas tocar seu negócio, já que não basta apenas cumprir seus contratos de forma correta. Fica claro que em um cenário tão hostil a capacidade de gestão e de clareza de informações é preponderante, sob pena de não haver continuidade nos negócios.
Por fim o objetivo deste texto é sinalizar que temos que evoluir, simplificar e mudar. Grande parte dos instrumentos financeiros que funcionam no Brasil, são desnecessários no resto do mundo, dada a complexidade que qualquer tipo de empresa encontra aqui.
Aos empresários que cuidam da sobrevivência de suas empresas fica a mensagem que teremos um 2017/2018 de muito trabalho e de recuperação. Os custos vão impactar de sobremaneira as operações e o momento é de mudar, olhe a realidade, observe a disponibilidade – isto demanda tempo, trabalho e dedicação, mas é a única saída para resolver os problemas de gestão do dia a dia.
A velha crença de que basta apenas vender, ou a clássica pergunta: - aonde foi parar o meu dinheiro - tem de ser suplantadas. Dado a velocidade da mudança e a dificuldade do momento, os negócios no Brasil tem que ter especial atenção para o aspecto financeiro, sob pena de naufragarem no médio prazo sejam empresas em recuperação judicial ou não.