O burnout é uma condição invisível?
Há dez anos deixei uma carreira na educação para me dedicar ao trabalho de comunicação corporativa em grandes organizações. Ao longo desse período, pude exercitar meu conhecimento em línguas estrangeiras trabalhando em multinacionais; estruturei dezenas de estratégias de comunicação; preparei executivos de todos os níveis hierárquicos para eventos, entrevistas, palestras, apresentações; participei de eventos incríveis e organizei tantos outros – algo que sempre me deixou imensamente realizada. Fiz amigos para a vida toda; conheci meu parceiro com quem comecei a formar família; tive a oportunidade de aprender com mentores que sigo admirando até hoje e pude também contribuir com a formação de profissionais que estão trilhando carreiras brilhantes.
Foi também no mundo corporativo que por muitas vezes me senti desvalorizada, lutando bravamente para ser ouvida em ambientes majoritariamente masculinos sem ser designada como “a mocinha” da reunião, aposto muitas vezes utilizado em substituição ao meu nome. Tenho duas graduações, uma das quais fiz um período no exterior, sou pós-graduada e falo quatro línguas, mas por vezes sentia que isso ainda não era suficiente para romper algumas barreiras impostas pelo ambiente. Imagine passar de 10 a 12 horas por dia imersa nessa luta. Até que um dia meu corpo parou.
O burnout é uma condição invisível. Com o diagnóstico vem o afastamento do trabalho e os sintomas muitas vezes também nos afastam das pessoas, das atividades cotidianas e da vida “normal” – o que quer que isso seja. Quase ninguém vê o dia a dia de quem está lidando com isso. Li recentemente em uma matéria da Folha que os millenials são uma geração que praticamente vem como burnout de fábrica e fiquei me perguntando o que isso significa. De quem é a culpa? Podemos falar em culpa? Eu por muitas vezes senti culpa por não conseguir responder um e-mail ou mensagem de WhatsApp, ainda que fosse de um amigo. Senti culpa por durante meu primeiro mês de afastamento médico do trabalho com um quadro de ansiedade generalizada não conseguir fazer absolutamente nada que não fosse dormir ou ficar rolando a tela do meu celular sem nenhum propósito.
Foram dois meses brigando com o sono e comigo mesma. A sensação era de que meu cérebro era um balde cheio d’água e que apenas uma gota a mais faria tudo transbordar. A cada hora do dia que eu via passar pensava: “hoje eu vou tentar fazer apenas uma coisa. Só uma. Até que eu consiga fazer duas, três, quatro...”. Ainda não cheguei lá!
Como uma boa rata de biblioteca, passei a ler muito sobre o tema e em muitos desses textos eu encontrava relatos de pessoas que ressignificaram toda uma vida e tiveram o famoso “clique”. Mudaram alimentação, começaram a praticar atividade física todos os dias, se encontraram em outra atividade profissional e magicamente ressurgiram das cinzas como uma fênix. Ao entrar em contato com esses relatos, minha mente ansiosa passou a desejar o tal clique. Mas em que momento ele vem? Quando é que essa chave vira e, como em um filme, retomamos nossa energia vital? “Hoje eu vou tentar fazer uma coisa. Apenas uma. Até que eu consiga fazer duas, três, quatro...”.
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Não é novidade para ninguém que a pandemia escancarou uma questão importante a respeito das relações de trabalho que precisa urgentemente ser discutida. Não vou entrar nesse mérito porque não sou especialista no tema e há muita gente gabaritada falando sobre isso em diversos lugares, porém minha experiência me mostrou que é preciso parar e recalcular a rota. Isso vale para os profissionais e para as organizações. Há um post no Instagram do Lucas Schuch que resume bem o tema. Nele, é dito que não se cura um burnout com dias de folga e que as empresas precisam entender que essa condição – a síndrome do esgotamento profissional – é ativada pelo ambiente e por situações de trabalho desgastante. É, portanto, necessário realizar mudanças completas e que as lideranças se preocupem em investigar as razões pelas quais isso acontece. Será que as organizações estão preparadas para ouvir? E as pessoas? Será que estão preparadas para falar sem medo de colocar em risco aquilo que garante boletos pagos no final do mês?
De todos os aprendizados que tenho tido nesse processo de me restabelecer, o principal deles é que ninguém tem que nada e podemos sim encontrar equilíbrio exercendo uma atividade que faça sentido. Além disso, o burnout não precisa te tornar invisível, basta ter coragem de falar e buscar apoio nas pessoas. Elas estão lá!
Ainda tenho mais perguntas do que respostas e sinto que ainda estou longe do clique. Contudo, tenho confiança de que um dia serei a fênix que com muito esforço – e não magicamente – ainda vai rir de tudo isso.
Esse relato é TÃO necessário! Ainda mais por uma pessoa que eu tanto admiro desde que os nossos caminhos se cruzaram, há uns dez anos. Só tenho a te agradecer por ter dividido isso comigo no momento em que eu mais precisava, e por agora ter tido coragem de escrever sobre a tua experiência, dividir com muito mais gente e amplificar essa mensagem tão urgente. Coragem, sim, pois eu sei o quanto é difícil falar sobre burnout, assim como depressão, ansiedade e pânico, que são os males da nossa geração e que não são culpa nossa, de jeito nenhum. Você é gigante! Talentosa, dedicada, além de uma pessoa incrível, brilhante, que eu admiro em tantos aspectos. É um privilégio ter você na minha vida e eu espero que esse texto desperte a muitas outras pessoas que precisam dessa força.
Comunicação Corporativa | Marketing | Produção de Conteúdo | Comunicação Interna | Mídias Sociais
3 aMeu Deus, Carol. Vim pelo comentário da querida Diandra Arbia e como estou assustada em ver que, em sua maioria, esse relato se repete com os profissionais de Comunicação Corporativa. É de parar para pensar nas condições desumanas nas quais somos submetidas diariamente. Desejo tudo de melhor para você e agradeço demais por ter vindo à público falar sobre um assunto tão importante em uma rede onde tanto se enaltece a produtividade tóxica.
Marketing & Communications
3 aQue belo texto, Carol. Obrigada por compartilhar sua experiencia. Com certeza servira de inspiracao para muita gente.
Jornalismo | Assessoria de Imprensa | Comunicação Corporativa | PR
3 avocê, sempre inspiradora e necessária! fica bem e estou por aqui se precisar <3
Freelance English Teacher (all levels); Tutor for TOEIC, IELTS, FCE, CAE; Phonetics coach
3 aMinha empatia ! Voce descreveu tao bem sua condicao de burn-out. ja eh parte do processo de cura. Parabens! Sugiro duas coisas: 1. Tente a crescer emocionalmente. Para isso, voce precisa fazer decisoes (baseadas nao so na Amygdala mas tambem no pre-frontal cortex) e tomar responsibilidade pelas suas decisoes. 2. Adquirirum work-life balance