O Papel das Universidades Modernas - Parte 2

O Papel das Universidades Modernas - Parte 2

Numa das minhas discussões, em que inicialmente tinha tudo para ser um promissor debate construtivo, logo percebi que estava a se transformar em uma discussão fútil e emocional. Com base em minha experiência em debates e discussões, decidi encerrar a conversa, pois muitos expressavam opiniões puramente emocionais, sem embasamento em dados ou análises. Isso me levou a concluir que estava a debater contra o vento.

Há quase 10 anos, ao concluir o ensino médio, percebi a ausência de verdadeiras universidades em Angola. Essa perceção foi formada com base em fatos, não em sentimentos, e mantenho essa abordagem em meu posicionamento. Quando afirmo que não existem universidades, refiro-me ao fato de que as instituições de ensino superior presentes não atendem aos critérios de uma universidade, ou o que se espera de uma universidade, sendo rotuladas como tal apenas por mera conveniência. É inaceitável afirmar que Angola possui universidades, dada a situação educacional precária dos últimos 40 anos.

Por exemplo, sabe-se que atualmente Angola investe uma fração de apenas 7,7%, diferente de 6,6 de 2022, daquilo que ficou previsto nos compromissos de Dakar de 2000, onde o país assumiu atribuir pelo menos 20% da despesa total para o setor educacional. E segundo outro relatório da UNICEF, em 2023, diferente dos anos anteriores, o Governo dedicou apenas 1% do OGE da educação ao ensino pré-escolar, um investimento bastante inferior à do ensino secundário. Portanto, podemos dizer que o país ainda está distante de cumprir totalmente as metas estabelecidas nas Declarações de Dakar e de Incheon de 2000 e 2015 respetivamente.

O Governo de Angola tem mantido esse investimento médio de 7% do OGE da educação, o que equivale a apenas 2% do PIB, ficando consideravelmente abaixo dos mínimos recomendados de 15% e 4%, respetivamente. Todavia, urge assim uma revisão na alocação de recursos para este setor, uma vez que a educação desempenha um papel crucial na formação do capital humano necessário para impulsionar o desenvolvimento do país.

No atual cenário educacional, a alocação de recursos para o ensino superior tem sido objeto de análise e debate, especialmente diante do modesto aumento de 4% na despesa em relação ao ano anterior, totalizando 305.188 milhões de Kz. Este aumento, embora represente um crescimento, em 2024 a despesa com ensino superior representou uma desaceleração em relação aos anos anteriores, face das expectativas e das necessidades do setor. Embora que o foco principal e prioritário desses investimentos por parte do governo, que se refletem através da alocação de recursos, seja a gradução que de certa forma ressalta a importância dada à formação básica e à ampliação do acesso ao Ensino Superior, pode resultar em uma falta de investimento nas etapas educacionais mais avançadas, como a de pós-graduação (mestrados e doutoramentos), necessários para a formação de recursos humanos altamente qualificados. Como é óbvio, esse aumento de 4% na despesa não é suficiente para cobrir as necessidades crescentes, especialmente quando consideramos a inflação e a volatilidade da taxa da moeda nacional em relação às estrangeiras, pondo assim as instituições em uma situação de incerteza e dificuldades financeiras.

Por outro lado, o aumento significativo nos investimentos em pesquisa educacional, um crescimento de 17%, demonstra o compromisso do governo em impulsionar a produção científica e alinhá-la às demandas do setor privado e aos objetivos de diversificação económica. Mas não podemos sequer dar-nos ao luxo de falar sobre este ponto, sendo que a dependência do OGE como principal fonte de financiamento do ensino público não garantem uma educação de qualidade e sustentável. Na minha análise, entendo que as limitações impostas pelo Ministério das Finanças quanto à capacidade das universidades públicas de gerar receitas próprias podem dificultar a autonomia financeira das instituições e limitar sua capacidade de resolver problemas e investir em melhorias.

Com investimentos tão baixos, é irreal considerar a existência de universidades no país. O que existe na verdade são empresas ou escolas que oferecem cursos superiores como parte de esquemas económicos, explorando a demanda por educação, e usando a necessidade do proletariado de se formar, tornando o ensino superior a sua esperança, a sua religião que promete salvação, sem garantir a eles verdadeira educação, competência e aprendizado. Para depois disso confundir obtenção de grau com educação, diploma com competência, ensino com aprendizado e por aí fora. Convido à discussão sobre como deveria ser uma verdadeira universidade, algo que, surpreendentemente, nunca foi abordado ao longo desses anos, ao invés disso, minha crítica é frequentemente interpretada como ódio ou inveja, quando na verdade é apenas preocupação.

Fazendo também uma comparação do OGE de 2023 com anos anteriores, os registos mostram um aumento consistente nos gastos com educação nos últimos anos, tendo mais que dobrado em um período de cinco anos, atingido cerca de 1,56 biliões de Kwanzas. Ao dividirmos esse montante pela população do país, o investimento per capita na educação será aproximadamente na ordem de 46 mil Kwanzas por ano. E o mesmo documento da UNICEF fez saber ainda que Angola investe menos na educação comparado a países como África do Sul (20,4% do OGE), Moçambique (16,4% do OGE), Cabo Verde (14,7% do OGE), Gana (13,0% do OGE), Nigéria (8,2% do OGE).

Olhando também atentamente para o balanço de execução do OGE da despesa com educação, notamos uma tendência nos últimos cinco anos, de que, em mil milhões de Kwanzas autorizados para investimento na educação, apenas 85% do valor são realmente usados, e com isso surge uma pergunta: o que é feito com os restantes 15% de mil milhões de Kwanzas?

Como já afirmei inicialmente, e volto a repetir, muitas instituições de ensino são apenas meios económicos para tornar seus donos cada vez mais ricos. Sou da opinião que se devia atribuir o papel de escola a instituições que em si não são universidades, mas que de facto promovem melhor o ensino e aprendizado. A verdade é que, nossa sociedade confia de forma excessiva nos diplomas emitidos por essas instituições de ensino superior, muitas vezes sem se verificar se o diploma satisfaz os créditos exigidos para a obtenção do referido grau. Além disso, é comum não se questionar previamente se a própria universidade é detentora de reconhecimento e respeito académico. Esta falta de escrutínio pode levar a situações onde diplomas são concedidos sem a devida qualidade educacional, minando assim a confiança na validade e relevância dos títulos obtidos. É crucial que a sociedade e os empregadores adotem uma postura mais crítica em relação aos diplomas, valorizando não apenas o papel, mas também a reputação e a excelência académica das instituições de ensino superior.

Encontro-me agora a frequentar um semestre numa faculdade de Economia, e me surpreende ver que todas as semanas há pelo menos mais de 10 estudantes de áreas diferentes a receberem suas graduações. Essa alta taxa de graduação pode ser interpretada de várias maneiras. Por um lado, pode indicar um alto nível de dedicação dos estudantes e eficiência do sistema educacional que garante que eles completem seus estudos dentro do prazo previsto. Por outro lado, e o mais provável que aconteça, pode levantar questões sobre a qualidade e rigor dos programas académicos, sugerindo que os requisitos para obtenção do diploma podem não ser tão desafiadores quanto o esperado. Essa situação pode suscitar reflexões sobre a importância de garantir que as graduações sejam conquistadas com base em um verdadeiro domínio dos conteúdos e habilidades necessárias para o sucesso profissional, em vez de simplesmente cumprir requisitos formais. Portanto, é essencial que as instituições de ensino avaliem constantemente a eficácia de seus programas académicos e implementem medidas para garantir a excelência educacional e a preparação adequada dos alunos para os desafios do mercado de trabalho.

Nasolino Miranda

Sócio proprietário na PAM DE TERRA- Industria e Transformação, Serviços e Turismo Lda LopesMiranda&Amigos.Lda

10 m

Gostei

Alberto Segunda Da Costa

Engenheiro Eletrônico | Entusiasta em Tecnologias | Aficionado por Literatura e Escrita | TI

10 m

Bem argumentado. Precisa-se claramente de melhorias num dos setores mais importante para o desenvolvimento. Ao que parece, a educação é só mais um pacote dos vários existentes na cabeça daqueles que "decidem". Quando eu vejo notícias sobre os números de formados em várias "universidades" do país, o que me vem à cabeça é: mais números. E não quero de maneira alguma afirmar que todos os formados fazem parte destes "mais números", nada disso, estou afirmando que devido a deficiência do ensino em nosso país, acabamos por ter muitos números e poucos resultados.

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