O preço do "amanhã eu faço"
Se você se dispôs a ler este artigo, significa que a sua luta contra a procrastinação já começou.
A quantidade gigantesca de atividades cotidianas vem provocando a sensação de encurtamento dos dias, deixando a tarefa de gerir o próprio tempo e manter o senso de urgência em alerta para priorizar as tarefas que precisam de maior atenção cada vez mais difícil. Com isso, é quase certo que se a gestão do tempo não é feita à risca, algumas das tarefas acabam sendo deixadas para depois (ou esquecidas). Devido a alta quantidade de coisas para se fazer, isso pode ser considerado normal, desde que não se estenda por muito tempo e/ou você não adie algo essencial/indispensável. O primeiro problema nasce quando transformamos a procrastinação num hábito.
No sentido literal da palavra, procrastinar é adiar, deixar para depois, postergar, delongar, etc.
A primeira lei de Newton explica que um corpo tende a permanecer em seu estado natural se nenhuma força é exercida sobre ele. O que isso tem a ver com procrastinação? Fazendo uma analogia nada científica com o estudo feito por Isaac Newton, nosso cérebro tende a procurar as soluções mais fáceis buscando sempre fazer o mínimo de esforço possível, para que haja economia de energia e ganho de tempo, a fim de que uma vez que possamos fazer cada vez mais coisas que nos trazem prazer e satisfação pessoal. Agindo assim, o cérebro instintivamente age intencionando beneficiar você, buscando atalhos na execução das obrigações, adiando-as e te deixando apenas com a “parte boa”, a qual não possui responsabilidades. Assim, pode-se dizer que ele está programado para mantê-lo no estado natural de toda a matéria, que neste caso, é a inércia. E é por isso que a mudança de hábitos é tão difícil.
Com isso, quando nos deparamos com alguma tarefa difícil ou que não temos todas as informações e ferramentas disponíveis no momento, quase que imediatamente o nosso cérebro entra no modo "deixar para depois", adiando aquela tarefa para outro momento, muitas vezes não atrelado à urgência que a mesma deveria ter.
O segundo problema se apresenta conforme o seguinte exemplo: Maria possui 10 atividades para hoje na sua lista de tarefas. Dessas 10, ela concluiu 7 de prioridade baixa/média e adiou 3 de prioridade média/alta. Com isso, pode-se concluir que 70% das suas atividades foram concluídas e ela teve um dia altamente produtivo, certo?
Errado. A ideia de você se sentir produtivo mesmo postergando tarefas constantemente também é conhecida como autossabotagem.
A autossabotagem é a consequência da procrastinação. É tida como um modo de defesa, onde rapidamente você encontra no seu arsenal de desculpas um argumento perfeito que se encaixa no fato de ter adiado algum compromisso ou perdido o deadline. Muitas pessoas, inclusive, se sentem orgulhosas quando são confrontadas com alguma pendência que já deveria ter sido resolvida e seu estoque de desculpas ainda permanece cheio, cada uma mais bem elaborada que a outra. O cérebro já está tão viciado em gastar energia fabricando respostas para os possíveis questionamentos acerca da procrastinação que nem percebe que poderia utilizar a mesma energia na execução da tarefa, há quem diga que até menos.
Existem dois tipos de autossabotagem, sendo elas:
- Um comportamento negativo, onde seu subconsciente joga contra você, criando limitações e barreiras que muitas vezes não existem, te impedindo de realizar algo; e
- quando seu cérebro te engana, fazendo acreditar que algo está melhor do que realmente está, criando o senso de satisfação com um resultado medíocre.
Neste caso, a segunda opção se encaixa perfeitamente no contexto. Comumente acreditamos que somos pessoas produtivas pela quantidade de tarefas que concluímos, sem levar em conta as que são adiadas. A união desses dois fenômenos é altamente prejudicial à nossa vida, já que o relógio não tem freio e o tempo não nos dá uma trégua apenas porque precisamos. O simples fato de adiar compromissos e tarefas faz com que nossos planos, sonhos e objetivos sigam a mesma tendência, uma vez que estamos muito ocupados para realizá-los e estamos acostumados a lidar com o adiamento, descartando seus prejuízos.
É preciso entender a necessidade de quebrar esse círculo vicioso da procrastinação e autossabotagem para que a sua vida comece a fluir e apresente resultados positivos. Para romper essas barreiras, é preciso saber lidar com os seguintes passos:
- Acorde!
O primeiro passo é despertar deste encantamento criado pelo seu cérebro. Algumas pessoas esperam a segunda-feira para mudar de vida, não faça isso! Comece a partir de agora, ao término da leitura, a mudança que você tanto precisa para ser mais produtivo. Seja crítico, não tenha medo de rejeitar seus velhos hábitos e tenha a humildade de assumir que você tem falhado consigo mesmo até então. Trata-se da sua vida, é o seu tempo que está sendo jogado fora e seus planos que vem sendo adiados.
- Calcule o prejuízo
Anote tudo que foi adiado e tenha o cuidado de observar essas tarefas juntamente com as que estão em andamento e as que estão por vir, para que você não se embole e acabe se complicando ainda mais. Faça a avaliação do tempo perdido e dos prejuízos por ter protelado a realização de tais atividades. Gosto de anotar todas as consequências da minha procrastinação (por exemplo: não assistir o jogo do meu time no fim de semana por estar ocupado fazendo algo que já deveria ter feito; não poder sair com meus amigos por ter uma entrega a fazer, etc.). Sempre que reflito acerca disso quando penso em adiar uma tarefa, inconscientemente me vem à mente algo que deixarei de fazer por consequência e, quase sempre, acabo fazendo na hora para não ter que me punir depois.
- Trace novas metas
Faça de forma diferente. Elenque suas tarefas diárias, semanais e mensais, mas separe um dia da semana para revisar tudo. Distribua-as de acordo com as prioridades, definindo quais DEVEM ser feitas até o prazo e quais PODEM deixar de ser feitas, caso você não tenha escolha. Seja esperto (a), leve sua mão apenas até onde você consegue alcançar. Não caia na besteira de deixar dias e semanas com muitas tarefas, querendo fazer tudo o mais rápido possível. Caminhe a seu tempo, preocupando-se em resolver da melhor forma possível. Lembre-se: há momentos que a qualidade é infinitamente melhor que a quantidade. Como dito por Albert Einstein,
"Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes".
- Crie hábitos
Como dito anteriormente, é importantíssimo para você que seja feita a revisão das tarefas ao menos uma vez por semana. Quando você decide, de forma geral, tudo que deve ser feito num determinado espaço de tempo, não conta que surgirão outras coisas para serem feitas no meio do caminho. Portanto, escolha um dia da semana e um horário que você pode se dedicar integralmente a isso e revise tudo o que foi feito e o que ainda está pendente. Respeite seus horários, tenha compromisso consigo mesmo. Saiba que seu cérebro pode ser educado como os músculos do seu corpo, e quanto mais você o treina com boas práticas, mais informação acerca do treinamento ele irá absorver. Faça cumprir essa rotina independentemente de qualquer compromisso que você tenha, pois respeitar os hábitos é a chave para o sucesso da produtividade.
- Escolha ferramentas para lhe auxiliar
Você não precisa guardar tudo na memória. Utilize seu smartphone de maneira inteligente e busque alternativas de gerir seu tempo e suas tarefas. Existem inúmeras ferramentas que foram criadas exclusivamente para isso, seu celular não serve apenas para redes sociais e jogos, abuse de aplicativos produtivos. Calendários, ferramentas de gestão de tempo, gestão de tarefas, gestão financeira, podcasts, etc. Todos eles te auxiliarão a se tornar uma pessoa mais produtiva e empenhada em sempre aprender mais.
- Valorize o ócio criativo
Tire momentos no seu dia para relaxar. É interessante a cada 4 horas você respirar por 10 minutos, e a cada 8 horas você tirar 30 minutos para descansar sua mente. Saia do celular e observe as coisas ao seu redor. Leia algumas páginas de um livro. Seu cérebro precisa de um descanso periodicamente e a melhor forma de fazer isso é se desligando do mundo. A inspiração vem das coisas simples, certamente será momento que você poderá se descobrir uma pessoa altamente criativa!
- Se recompense
Não é só de trabalho que vivemos! Você pode colocar pequenas (ou grandes, dependendo da situação) recompensas no final de cada período ou projetos. Por exemplo: caso consiga fechar a semana com todas as tarefas concluídas, ganha o direito de curtir um happy hour no fim de semana. Você deve estar pensando “É sério isso? Mas eu já teria meu happy hour de qualquer jeito!”. Mude essa mentalidade. Comece a educar seu cérebro com a ideia de que ele terá recompensas por agir da forma certa e, inconscientemente, você fará um esforço maior ainda para concluir suas tarefas.
- Tenha conversas produtivas
Encontre pessoas que você enxerga como produtivas e troque dicas. Certamente ela terá muito que te ensinar e você a ela. Ninguém é detentor de todo conhecimento e o método que o outro usa talvez seja até mais produtivo que o seu. Não paga nada para trocar boas experiências!
- Inspire outras pessoas
Procure auxiliar outras pessoas no processo de libertação da procrastinação e autossabotagem. O grande líder é aquele que transforma a vida de outras pessoas, tornando-as, se possível, melhores do que ele. O ideal é com o seu próprio exemplo, pois aprendemos mais quando vemos a coisa acontecer na prática, e nada melhor que alguém que acabou de passar por isso! Não guarde algo que te faz bem só para si, seja o guru de alguém, pois as chances de você se manter nesse caminho quando é o espelho de alguém são muito maiores!
- Faça um apanhado geral no fim do mês
Reveja tudo que foi feito, veja o tempo que demorou e as dificuldades que encontrou para concluir as tarefas ao longo do mês, principalmente as tarefas mais complexas e de maior prioridade. Estude melhores métodos para otimizar o tempo dedicado nas tarefas que mais teve dificuldade o que mais atrapalhou de ter sido mais produtivo nelas (terminar num prazo menor, gastar menos recursos e energia, etc.). Certamente isso te ajudará nas próximas vezes que se deparar com situações parecidas.
PARA ILUSTRAR
Tim Urban, um palestrante americano da TED (Technology, Entertainment, Design) – uma organização sem fins lucrativos que tem como lema a divulgação de ideias que precisam ser compartilhadas – sugere que todos os procrastinadores possuem um mecanismo irracional dentro da mente, que o denominou (comicamente) de Macaco da Gratificação Instantânea, o qual ignora o senso de urgência, o passado e o futuro, se preocupando apenas com duas coisas: comodidade e diversão. Segundo ele, esse instinto irracional encontrado nos animais (que apenas dormem, se alimentam, se propagam e se divertem) ignora o fato de sermos seres racionais e nos trata como se fôssemos apenas outra classe de animais, os quais anseiam apenas por essas quatro tarefas na vida. Provavelmente isso funcionava muito bem na idade média, mas nos dias atuais é inadmissível.
Para ele, precisamos ser um tomador de decisões racional, levando em consideração todas as variáveis envolvidas e não apenas nossos desejos momentâneos de prazer e preguiça. Isso porque, segundo ele, existem dois tipos de procrastinação:
- Procrastinação que envolve prazos e entregas: é a mais simples de lidar, pois quanto mais se aproxima do prazo de entrega, maiores as chances de você abandonar o estado de inércia e se dedicar ao trabalho.
- Procrastinação que não envolve prazos e entregas: essa é a mais perigosa, pois quando se trata de algo que não envolve prazos (como dedicação à carreira, dedicação aos estudos, abandono/melhoria de um relacionamento prejudicial, etc.), isso pode te envolver de tamanha forma que seja muito mais difícil sair depois de certo tempo. Com isso, você se consome ao passar dos anos, se enterrando numa tristeza e frustração que não pode ser medida, e o pior disso tudo é que o tempo não quer saber se isso é prejudicial ou não para você, ele simplesmente passa.
Um exemplo claro disso, podemos ver no filme Ted (coincidência, não?), onde o personagem John (Mark Wahlberg) tem uma relação de perdição e loucuras com um urso de pelúcia, o qual ganhou vida enquanto ele ainda era uma criança. Com isso, John se entrega a essa relação e vive de maneira irresponsável e vulgar, ano após ano, e de repente se vê num beco sem saída, onde seu namoro está ao ponto de acabar, já que está acomodado no seu sub-emprego e não mede os problemas que aquela relação entre ele e Ted causam.
Certa vez, numa conversa entre os dois, John culpa Ted pelas suas mazelas e o diálogo é mais ou menos assim:
Ted: Você tá me culpando por uma coisa que fez sozinho. A Lori tinha razão, você não pode assumir a responsabilidade por nada que acontece na sua vida?
John: Ah, e você pode?
Ted: Eu não preciso, sou um urso de pelúcia! Olha só, eu não te amarrei e te arrastei para aquela festa tá, eu queria que você fosse porque você é meu melhor amigo!
John: Você não pode chegar e dizer que nunca viu a Lori como uma ameaça à nossa amizade, porque é tão melhor para você quando a gente fica chapado no sofá até às 9 da manhã, não é?
Ted: Olha você falando! Quem sou eu? O imperador Ming controlando sua mente? Foi escolha sua, John, e botando a culpa em mim você fica parecendo um covarde!
Portanto, quando não assumimos a responsabilidades por nossos atos, tarefas e obrigações, acabamos dedicando nosso tempo a outras coisas não tão importantes ou com menor prioridade (provavelmente voltadas para a comodidade e a diversão). Com isso, acabamos por nos frustrar quando percebemos o quão prejudicial para nós foi isso, e a tendência é procurarmos culpados para aquilo que somos covardes por assumir - um traço fortíssimo da autossabotagem, pois quando encontramos algum "culpado", relativizamos as perdas e seguimos acreditando que a culpa não é nossa, mas do outro.
É sabido o quão difícil é assumir a culpa pelos próprios erros, principalmente por erros que dizem a respeito da nossa vida profissional, pessoal e espiritual. Todavia, somos adultos! É necessário que você se posicione como tal, tomando as rédeas da sua vida e abraçando-a como seu bem mais precioso, porque ao cometer os delitos da procrastinação e autossabotagem, sua vida – no que tange a felicidade e realizações –, pagará o preço.
Por Breno Anderson.
Gerente de Atendimento - CPA 20
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