O preço do racismo
Toda semana, escrevo aqui artigos que tratam de temáticas como diversidade e inclusão. Nos últimos anos, tenho procurado destacar pontos importantes que fazem os leitores refletir a respeito desses temas na prática do dia a dia.
Também dou dicas que visam provocar e auxiliar pessoas que, em geral, não enfrentam olhares de preconceito, racismo e discriminação, fazendo com que compreendam o quanto esses problemas incomodam e, infelizmente, são vivenciados por mais da metade da população brasileira.
É muito difícil para pessoas “não negras” sentirem exatamente o que pessoas negras passam cotidianamente, seja no trabalho, no lazer e em relações sociais em geral.
São situações que acontecem em diversos aspectos da vida de uma pessoa preta. Muitas vezes, a discriminação aparece na compra de um serviço/produto, em idas a restaurantes “finos” ou até mesmo em uma situação em que um homem preto vestido de terno e gravata acaba sendo confundido com o segurança local ou com guardadores de carro.
Outras formas de discriminação sutis são quando mulheres pretas recebem elogios de seus cabelos e escutam frases típicas como essa: “nossa, seu cabelo é lindo, mas é seu mesmo?”
Citei aqui algumas situações, mas existem dezenas delas que fazem parte do triste quadro das relações raciais que ainda permeiam a vida de milhões de pessoas neste país, que, em números absolutos, tem o maior contingente de habitantes negros fora da África.
Essas são relações interpessoais e sociais, do ponto de vista privado, em situações lamentáveis, tristes e desgastantes, em que não dá para mensurar os prejuízos psicológicos e físicos que essas circunstâncias podem causar.
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O problema é quando essa cultura racista é levada ao extremo, e também está incorporada em agentes públicos, dando vazão ao racismo institucional e levando isso para dentro das estruturas do Estado, que deveria ser agente protetor de todos os cidadãos. Essas práticas discriminatórias, com cidadãos que pagam seus impostos, são inadmissíveis.
Um fato recente e bastante relevante que viralizou nas mídias sociais e também nos veículos de imprensa ilustra bastante o que estou narrando. O inusitado ocorreu com um trabalhador negro que, ao se ver ameaçado por uma faca de um homem branco em Porto Alegre, fez o que qualquer cidadão no total gozo de sua cidadania faria: chamou uma autoridade policial para prender o seu agressor.
Para a sua surpresa, quando a viatura policial chegou, o trabalhador negro, que já havia sido ameaçado com uma faca, foi agredido pelos policiais e levado preso na viatura policial. Ou seja, uma dupla agressão: primeiro, pelo agressor branco; depois, pelos agentes policiais.
O que fazer em um caso desses? Qual a indenização que o Estado, responsável por garantir a segurança de seus cidadãos, deve pagar pela agressão física e psicológica de negros e negras que têm sua dignidade ferida apenas por sua cor?
Esta é uma conta que ninguém quer fazer ou se responsabilizar, e muitos não se dão ao trabalho de discutir o assunto. Porém, é algo que, em um país onde as leis geralmente só são obedecidas quando batem no bolso, deveria ser matéria obrigatória nos nossos debates: o preço psicológico, físico e, muitas vezes, letal do racismo.
Artigo publicado originalmente no site da CNN Brasil
Coordenador de Negócios
9 mMauricio Pestana obrigado pelo seu trabalho a favor do nossa "nação". Ressalto aqui o senso de nação, como sendo o senso de pertencimento e sentimento de um povo que percebe a união entre si. Visto isso, gostaria de extrair um trecho do artigo sobre ser "muito difícil" pessoas "não negras" perceberem ou receberem os impactos do trato no quotidiano. Eu diria que é "extremamente difícil" essa percepção por não negros, quase impossível, e após começar acompanhar seu trabalho, tenho aguçado a minha observação quanto a nossa incapacidade de compreender os mecanismos de combate ao racismo na nossa estrutura social. A análise limitada de que, por crianças negras, ou não, fazerem parte da mesma posição social-econômica, terão as mesmas oportunidades ao longo de toda a vida. Isso não é verdade em função privilégio natural que hoje existe, privilégio este incompreendido e negado por falta de conhecimento ou negação propriamente dita: "eu vim da mesma base, morava no mesmo bairro, tive as mesmas oportunidades" Sabemos que essas afirmações são limitadas e olhadas de dentro da caixa. Para enxergar a real situação, precisamos sair da caixa e olhar a "dor do outro", como versado em outro artigo seu. Mais uma vez, obrigado e sucesso!