O Processo de Relacionamento com Fornecedores - parte 1 - Concepção
Para entender e manter um relacionamento produtivo com fornecedores é preciso que a empresa previamente entenda os interesses que motivam cada um dos lados, ou seja, entender o que interessa a quem demanda, mas também entender quais os interesses de quem fornece. Ao mesmo tempo é preciso observar o contexto, ou seja, a influência dos fenômenos mercadológicos a que as empresas estão expostas.
Meus últimos vinte anos de atividade profissional eu dediquei, quase que integralmente, a esse entendimento. Arrisco-me a considerar que durante os primeiros dez anos desse tempo tive vivências sob a ótica de demandantes, enquanto executivo de uma grande multinacional. Depois, como consultor de negócios, o tempo passou a ser dividido entre viver o fornecedor e ensiná-los a melhorar a relação com seus clientes. Durante os tantos projetos sobre desenvolvimento territorial e programas de alavancagem da gestão, foi-me transparecendo a natureza dos interesses comuns e conflitantes entre as duas partes. É obvio que este posicionamento trata-se de atuação predominante, já que dentro das cadeias de fornecimento por vezes somos clientes, quando não fornecedores.
Uma experiência pontual nesse tipo de relação foi observar o processo de relacionamento tendo o governo como cliente. Nesse caso, arrisco-me a dizer que o conceito não muda. Entretanto, é preciso considerar que a autonomia dos gestores fica sensivelmente limitada em quase todos os aspectos do processo de relacionamento, muito em razão das restrições impostas pela legislação específica sobre contratações públicas. Esta variante do processo em questão resulta em diferentes fenômenos mercadológicos e merece discussão à parte.
Historicamente, o relacionamento com fornecedores tem sido marcado pela cultura do “ganha-perde”, ou seja, a cultura da competição em negociação comercial, em busca de resultados financeiros, sempre empoderada pela retenção de informações de mercado privilegiadas e pelo poder de barganha.
Um dos grandes achados nessa trilha, em relação à cultura do “ganha-perde”, foi a constatação de um efeito colateral importante que equivale à moral do conto da “galinha dos ovos de ouro”. O que ocorre é que quando o mercado fornecedor é abundante, ou seja, há muita concorrência, e a função comercial do cliente é agressiva, a margem de lucro do fornecedor tende a cair. Nos casos de empresas fornecedoras menos experientes essa margem chega a ser anulada, ou invertida, pela absorção de perdas e retrabalhos em garantia originados de falhas durante a execução dos contratos. Dessa forma, empresas fornecedoras “quebram” aleatoriamente, reduzindo o tamanho do mercado, o que não resulta em vantagem para qualquer das partes, inclusive para o fisco. Corroborando com esta situação ainda é preciso apontar o elevado grau de dependência financeira de muitos fornecedores, que concentram seu faturamento em determinado cliente sem que haja qualquer garantia de continuidade do fornecimento.
Então, passemos a entender o contraponto dessa cultura predominante, examinando o conceito de "parceria" na relação de fornecimento, ou seja, a cultura do “ganha-ganha”. Na prática, podemos convencionar que “parceria” deve ser sinônimo de partilha de resultados, mas também de esforços que, naturalmente, tendem a ser proporcionais às condições ou capacidade de cada parte.
Por outro lado, a relação de parceria é tão provável quanto consistente for a relação de confiança entre as partes. Se isso é verdade, como é possível fazer parcerias com os novos fornecedores? Primeiro é preciso diferenciar “novos fornecedores” de “fornecedores novos”. Nesse contexto, conceituamos fornecedores novos como aquele grupo de empresas com pouca experiência de gestão no segmento de fornecimento a que se propõe, onde costumam estar as empresas recém-criadas. Os novos fornecedores são empresas com gestão já reconhecida no segmento de mercado em que atuam, mas que ainda não figuram no cadastro do cliente ou apenas iniciaram o fornecimento. Os novos fornecedores podem ser equiparados aos fornecedores tradicionais (com histórico de fornecimento no cliente) se utilizarmos suas referências de mercado. Por exemplo, um fornecedor credenciado em clientes reconhecidamente exigentes ou aqueles certificados por normas de garantia da qualidade. Dessa forma, novos ou antigos fornecedores podem ser considerados para integrar uma relação de parceria, dependendo dos interesses bilaterais. Já os fornecedores novos estão para a cadeia produtiva assim como estagiários estão para a carreira profissional, ou seja, eles precisam iniciar sua experiência de fornecimento de forma assistida, quando serão considerados em “estágio de desenvolvimento”, podendo ter elevada sua relação de confiança com o cliente e aumentar os benefícios dessa relação.
Na parte 2 deste artigo (Estruturação), discorremos sobre as propostas de como implementar tais conceitos na prática, com base na experiência de algumas empresas clientes regionais que validaram tais conceitos e implementaram melhorias, reconhecendo o valor agregado ao seu negócio.