O que mudou nos processos seletivos
Oi, pessoal! Tudo bem?
No outro post falei um pouco sobre uma enquete que fiz aqui, que apontou que somente 13% dos profissionais de recrutamento receberam treinamento formal para exercer essa função.
Todos nós sabemos da importância da formação continuada (e futuramente falaremos mais sobre isso), mas hoje quero focar especificamente no impacto que a falta de treinamento de qualidade traz para os processos seletivos, para a aderência dos candidatos e, consequentemente, para o sucesso das organizações.
O mundo, como um todo, já vem mudando há algum tempo. Os anúncios no jornal e as plaquinhas na fachada, indicando que há vagas, foram quase que inteiramente substituídos por etapas online e plataformas de seleção de candidatos. Em muitas delas, pelo menos uma parte dos processos é feita por inteligência artificial.
Por outro lado, o que ainda se vê são profissionais de RH que continuam conduzindo processos seletivos como se estivéssemos nos anos 80. Desde a procura por bons perfis até as entrevistas em si.
Vou contar, rapidamente, a minha experiência com Recrutamento aqui. A primeira vez que fiz uma entrevista como recrutadora foi em uma grande consultoria. Estávamos criando uma célula de Gestão de Mudanças para atender a um projeto no Maranhão, em uma das maiores mineradoras do mundo. Precisávamos de mais e consultores.
Gestão de Mudanças não era um assunto tão difundido na época como é hoje, então essa expertise era escassa. Acompanhei a recrutadora da consultoria na prática, mas não fiz perguntas - meu papel era o de ouvinte.
Passada esta experiência, já trabalhando em uma Big 4, eu estava em um projeto de criação de uma célula nova na mesma mineradora. O projeto consistia em criar esta célula do zero, inclusive propondo uma estrutura de cargos, que era algo em que eu tinha pouca experiência.
Fiquei observando as recrutadoras, fiz várias perguntas, pedi ajuda com os descritivos de cargos e competências e fui atrás da melhor maneira de fazer a entrega. Fizemos.
Mais tarde, já ocupando uma cadeira de RH propriamente dita, fiz a minha primeira entrevista formal, somente eu e um candidato em uma sala. Foi muito tranquilo, mas eu fazia perguntas apenas com base no que havia lido no CV, e ainda não conseguia, naquela época, fazer perguntas baseadas nas respostas do candidato.
Assim, a entrevista era apenas uma sequência de perguntas, como um checklist. E, gente, vocês sabem o que é pior? Tem gente fazendo isso até hoje! Sim, tem sim. Em empresa pequena, empresa grande, consultoria americana, inglesa, marciana... Os recrutadores ainda estão na década de 80.
Semana passada mesmo eu fui abordada por uma gigante do Recrutamento de forma totalmente inadequada, arcaica e desestimulante. Qual a dúvida de que esta recrutadora não vai fechar esta vaga de maneira eficaz?
Ela me lembrou até a personagem Roz, do filme Monstros S.A., aquela tesoureira mal encarada, com óculos de gatinho, que fica em uma sala com armários de arquivos de ferro, cheia de pilhas de papéis para todos os lados, agindo de forma totalmente burocrática, somente para cumprir tabela. Sabemos que a Roz tem um papel importante naquele desenho, mas vamos nos ater à imagem de uma profissional obsoleta, tudo bem?
O que acontece é que os recrutadores fazem um esforço imenso para atrair dezenas de candidatos, que levam a pilhas de currículos para analisar, dinâmicas de grupo sem fim, duas ou três entrevistas improdutivas com cada um… e, muitas vezes, escolhem um profissional que não passa nem um ano na empresa. É muito desperdício, não é? Isso tem um custo, e bem alto por sinal. Este tema já está anotado e será falado aqui.
Hoje eu criei um método próprio, com um olhar apurado que desenvolvi com base em cerca de 3000 profissionais abordados e centenas de contratações de sucesso ao longo da minha carreira. Não foi fácil, mas saber que posso mudar o rumo da vida das pessoas e das empresas me motiva a ser cada vez mais técnica e assertiva em meus processos.
Para mudar essa realidade de “cara-crachá” e engrenar um processo seletivo de sucesso atrás do outro, só com treinamento e aprendizagem mesmo, não tem outro jeito. E a melhor maneira de iniciar essa mudança é observar atentamente o que vem sendo praticado por um grande número de companhias. Vamos fazer isso agora.
Uso de Inteligência Artificial
Os antigos testes psicotécnicos evoluíram, e muito. Atualmente é possível avaliar muito mais do que os conhecimentos gerais, em matemática básica e o raciocínio lógico dos candidatos, por exemplo.
Com a apresentação de problemas reais e uma configuração robusta dos testes, a maneira como um candidato se comporta em uma determinada situação fictícia indica como ele vai conduzir a interação com seus pares, subordinados e superiores na vida real. Mas há um limite nisso: não pode facilitar para o RH e virar um estorvo para o candidato.
As competências socioemocionais também não ficam de lado, já que nem só de técnica vive um profissional. Hoje, muitas empresas até preferem contratar com base nestas competências, optando por um profissional com menos experiência que pode se desenvolver mais tecnicamente depois da contratação, por exemplo.
Por meio de testes que analisam profundamente seus traços de personalidade, é possível ter indicativos precisos da capacidade de lidar com situações imprevistas e conflituosas, o que é imprescindível em qualquer função.
Automação de processos
O investimento em softwares que executam automaticamente determinadas partes de um processo seletivo, como a organização e o agendamento de entrevistas, e a solicitação de documentos, economizam tempo e energia de profissionais de RH, que podem se dedicar ao que realmente importa: o elemento humano e as decisões estratégicas.
Processos seletivos remotos
Com a pandemia, o interesse por vagas remotas ou híbridas aumentou muito. Na verdade, muitas empresas vêm enfrentando dificuldade para completar seus quadros, especialmente em áreas ligadas à tecnologia, porque os candidatos entenderam que é possível trabalhar de casa e não querem renunciar a isso.
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Mesmo nos casos em que a atuação será totalmente presencial, os processos seletivos remotos podem dar mais agilidade e gerar economia para as empresas, tanto de tempo quanto de deslocamento, por exemplo.
Em muitas plataformas de ATS (Applicant Tracking System), onde os candidatos aplicam nas vagas das empresas, é possível automatizar as etapas iniciais e até mesmo filtrar os candidatos que são mais aderentes à sua oferta de acordo com o perfil. Sem dúvidas, há várias controvérsias sobre o uso desse tipo de ferramenta e suas muitas (!!!) etapas, então vamos retomar esse assunto em outro momento, prometo!
É preciso olhar para dentro
Para começar, o primeiro lugar para se procurar pelo profissional mais adequado ao preenchimento de uma vaga é dentro da própria empresa. Afinal, pelo menos na teoria esse profissional já possui algo muito valioso, que é a identificação com a cultura, também chamado de fit cultural.
Não adianta trazer o cara mais descolado do mercado se ele não tiver afinidade com a cultura da sua empresa, pelo menos. Já vi casos de a empresa optar por um profissional mais caro, mais parrudo e não dar certo por incompatibilidade de valores. Sabe aquela lista de missão, visão e valores? Não existe à toa. Um bom recrutador mantém esta bússola.
Uso de Big Data
A análise de grandes conjuntos de dados para compreender melhor as atividades relacionadas a uma determinada função e o que é necessário para preenchê-la com excelência pode ajudar muito na atração e na seleção do profissional mais indicado para o papel.
Nesse sentido, a tecnologia se torna uma aliada fundamental, tanto para o armazenamento das informações que servirão de insumo dessa análise, quanto para escolher a melhor maneira de divulgar vagas em aberto, por exemplo, selecionando com precisão os melhores termos para atrair os candidatos certos. Cada palavra importa!
Benefícios flexíveis
Se os profissionais são diferentes, porque todos deveriam receber os mesmos benefícios? As organizações estão cada vez mais compreendendo isso e investindo nos benefícios flexíveis, capazes de atender a diferentes perfis de colaboradores.
Mas, lembrem-se: quanto mais opções se dá, mais opções se pede. Tenha equilíbrio. Você, como recrutador, pode e deve ser estratégico e ajudar a empresa a identificar os melhores benefícios do mercado, mas oferecer uma lista com 100 opções não vai ser produtivo. Avalie o que está sendo ofertado por outras empresas e sendo admirado pelos candidatos, pois isso vai te ajudar nesta análise competitiva.
Diversidade
Essa, provavelmente, é a mudança mais significativa e positiva em termos de processo seletivo. A compreensão de que é preciso contratar profissionais diversos, e da força que reside nessa diversidade, vem fazendo com que empresas de todos os setores promovam vagas afirmativas, ou seja, específicas para um grupo.
Assim, as contratações focadas em pessoas negras e indígenas, mulheres, mães, pessoas da comunidade LGBTQIA+, imigrantes, pessoas com deficiência e profissionais com mais de 40 anos de idade mudam para melhor a maneira como as empresas funcionam e interpretam seu lugar no mundo.
Vejo muitos CEOs resistentes a esta prática por considerarem que é excludente. O argumento é: como vamos achar o melhor profissional se estamos restringindo o público? Bola dentro para quem está fazendo o mundo um lugar melhor!
No entanto, lembre-se de que não adianta contratar pensando na diversidade se a cabeça da empresa está na “era medieval”. Não vai dar certo e pode haver problemas de reputação com a empresa. Vai por mim.
Como tudo isso impacta nos processos seletivos
Todas essas mudanças já podem ser vistas no dia a dia de trabalho dos profissionais de RH como um todo. A questão é que muitos ainda não sabem de que maneira isso afeta as etapas que são olho no olho, que é justamente onde a “mágica” acontece (ainda que online).
Os recrutadores precisam e sempre precisarão entender de gente, de pessoas e suas expectativas, de como mudar a vida de um candidato colocando a pessoa certa no lugar certo. E de como melhorar a performance de uma empresa contratando o melhor talento possível.
Não adianta fazer um checklist do CV, com perguntas rasas e checagem de datas, nada disso realmente importa. O CV está na sua frente, é a ponta do iceberg, mas você precisa ir para águas mais profundas para potencializar as chances de contratação dos melhores profissionais.
As entrevistas são fundamentais e determinantes nos processos seletivos de sucesso. Como já disse anteriormente, a construção de um bom storytelling ajuda a atrair os melhores candidatos, mas somente com as técnicas e ferramentas mais eficazes você vai conseguir encontrar o match perfeito para suas vagas, ter assertividade, organização e produtividade. E, acredite: sem precisar de 100 currículos, 200 entrevistas e toneladas de frustrações.
Não podemos esquecer dos feedbacks negativos, pelo amor de Deus! Você está protelando? Se sim, no próximo post eu vou trazer uma dica infalível para você não deixar seus candidatos no vácuo!
Fique por aqui para acompanhar, a partir desta semana, sempre às quartas, um novo assunto relacionado ao universo do RH. Na próxima edição da newsletter O Novo RH, vou falar sobre como conduzir suas entrevistas, o que fazer e o que não fazer e que resultados você pode esperar depois dessas mudanças. Até breve!
Fundadora da RSRH Consultoria ajudando empresas a aumentarem resultados através de talentos.
2 aMuito bacana seus textos. Tem sido enriquecedor pra mim! =)