O que são subgrupos racionais e sua influência no controle e melhoria de processos
Introdução
Existem diversos conceitos e fundamentos que devem ser respeitados/aplicados para que o controle estatístico do processo possa ser aplicado de modo adequado aos processos que queremos estudar e melhorar. No último artigo abordamos a razão de Walter Shewhart ter utilizado limites 3 sigma simétricos como uma melhor aposta para a separação de causas comuns e causas especiais de variação.
Agora precisamos abordar um conceito fundamental para a construção correta destes limites, por meio de uma estimativa diferenciada do desvio-padrão. Falaremos dos subgrupos racionais.
Variação de Curto Prazo e de Longo Prazo
As cartas de controle Shewhart baseiam-se no princípio de que, em um processo estável, as variações de curto e de longo prazos são equivalentes. Ou seja, supomos que temos um processo em que a variação hora a hora seja considerada de curto prazo e a variação dia a dia seja considerada de longo prazo. O processo seria considerado estável ou em controle estatístico se nada acontecesse de um dia para o outro que tornasse o processo mais variável do que ele já é hora a hora (Nelson, 1988).
Como a escolha adequada dos subgrupos (amostras) tem influência decisiva sobre a estimativa da variação a curto prazo, podemos entender sua importância na correta aplicação das cartas de controle.
Os Subgrupos Racionais
Uma forma mais simples de entendermos do que se trata a variação de longo prazo é saber que ela deve incluir as chamadas causas especiais e comuns de variação. Ou seja, quando fazemos um estudo de longo prazo, queremos que ele contemple as causas aleatórias ou comuns que estão presentes em qualquer processo e também as causas atribuíveis ou especiais de variação, que apresentam uma magnitude de variação maior e aparecem mais esporadicamente. Quando estamos estimando a variação a curto prazo, somete causas comuns deverão estar presentes nos subgrupos racionais, chamados desta forma porque, nestas amostras, só estarão contempladas as causas aleatórias ou comuns provenientes do sistema constante de causas aleatórias definido por Shewhart. Digamos que as amostras de um subgrupo racional são coletadas de modo que elas estejam submetidas às mesmas condições essenciais.
Os subgrupos devem ser tais que, se causas especiais ou atribuíveis estiverem presentes, elas aparecerão em forma de diferenças entre os subgrupos, ao invés de diferenças entre os membros de um subgrupo. Um subgrupo natural seria, por exemplo, o output de um determinado turno. Não faria sentido tomar como subgrupo o output de um período de tempo selecionado arbitrariamente, especialmente se ele englobasse dois ou mais turnos. Se tivéssemos uma causa especial causando uma diferença entre turnos, no segundo caso não teríamos como detectá-la.
Vamos ver alguns exemplos quantitativos sobre o que foi falado, utilizando uma carta de controle para médias e amplitudes.
Suponha que temos um Processo A, com média = 10,0094 e Sigma = 1,03073, composto de 300 observações passadas. Sabemos, por construção, que este processo pode ser considerado estável ou em controle estatístico. Se ele é estável, sabemos que sua variação em curto prazo é semelhante à sua variação em longo prazo. Mas como estimar cada uma delas?
Para a estimativa do chamado Sigma do Processo, ou Sigma de Curto Prazo, usamos, para subgrupos de até 9 amostras, a estimativa de sigma igual a Rbar/d2, onde Rbar = amplitude média dos subgrupos e d2 = constante de correção de viés (tabelada para diversos tamanhos de subgrupos). Esta constante é necessária porque estamos estimando o desvio-padrão por meio da amplitude R. Ao construirmos uma carta de controle para médias, os limites irão distar da média o valor 3*(Rbar/d2*(raiz(n))), onde n = tamanho do subgrupo.
Mas, não confunda, a estimativa do sigma do processo original (do qual recolhemos as amostras) é Rbar/d2. O uso de raiz(n) é necessário porque, por se tratar de uma carta de médias, o desvio-padrão das observações é menor do que o sigma original por uma razão igual a raiz(n) (Teorema Central do Limite).
Note pela figura 1 que coletamos 20 subgrupos racionais de mesmo tamanho (n = 4), a cada 10 observações, e concluímos que o Processo A está em controle. Os limites de controle e média obtidos na carta Xbar - R servirão como valores fixos para as próximas coletas de subgrupos.
Mas estamos interessados nas estimativas do Sigma do Processo. Pela carta obtida, vemos que o sigma de curto prazo ou sigma do processo = ((11,518 – 10,059)/3)*((4)^0,5) = 0,9725.
Fig. 1. Carta de médias e amplitudes para o Processo A.
O valor do sigma de curto prazo é similar ao valor do sigma de longo prazo, que é o tradicional desvio-padrão global (raiz quadrada da variância) dos dados dos subgrupos racionais. Este valor é 1,0317.
Isto acontece porque o processo é estável e a variação de curto prazo e a variação de longo prazo são semelhantes.
Vemos, então, que os subgrupos forneceram uma estimativa da variação de curto prazo do Processo A, que também pode ser usada a longo prazo. A carta Xbar-R foi construída corretamente.
Agora vamos supor uma outra configuração do processo.
Fig. 2. Organização do output de um processo de fabricação.
A figura acima mostra os pontos de saída de um processo de fabricação, onde cada saída A, B e C, refere-se por exemplo, a um elemento esférico que acaba de ser fabricado e disposto em uma esteira que dá vazão à produção. Os processos que escoam em A, B e C são “supostos iguais”, e decidiu-se monitorar o processo por meio de uma carta de controle. A variável escolhida é o peso da unidade fabricada. Esperamos unidades esféricas com o mesmo peso médio em A, B e C, e dentro das especificações. Os dados estão na figura 3.
Uma primeira escolha é tomar uma observação de cada saída e trabalhar com um subgrupo de n = 3. Podemos criar uma carta de controle Xbar-R com o formato de amostragem que vamos usar. Por exemplo, o primeiro subgrupo será composto de 9,530, 10,830 e 12,261 (unidades de peso). O segundo subgrupo será 9,411, 11,586 e 12,591. E assim por diante.
Fig. 3. Dados para o exemplo dos 3 bocais.
A carta de controle resultante para esta escola de subgrupos está abaixo.
Fig. 4. Carta Xbar-R para a configuração de amostragem definida.
Você acha que há algo errado com esta carta? Os limites de controle estariam muito largos?
Note que, ao definirmos os subgrupos, partimos da hipótese que os processos “iguais” fornecem amostras que podem compor subgrupos “racionais”, sujeitos somente a causas comuns de variação e coletados dentro das mesmas condições essenciais. Mas, ao realizarmos rápidas análises nos processos A, B e C, notamos que as naturezas das variações são diferentes. Desta forma, nós superestimamos a variação de curto prazo do processo, gerando limites de controle muito afastados um do outro.
A construção inadequada da carta de controle pode ser facilmente vista se substituirmos, por exemplo, o valor 9,354 por 17,000 no processo A. A carta do esquema de amostragem escolhido não sinaliza uma causa especial variação, o que acontece na carta Xbar-R (n = 4) construída separadamente para o processo A.
Fig. 5. Dois esquemas de amostragens diferentes para o exemplo proposto.
Assim, ao criarmos um controle por processo neste exemplo, usamos o conceito de subgrupos racionais. Quando usamos dados dos três processos diferentes, a estimativa do sigma do processo fica superdimensionada, acarretando uma carta de controle pouco sensível às mudanças.
O que mostramos agora pode ser estendido a diversos cenários. Criar subgrupos que envolvam dados provenientes de fontes, equipamentos, plantas industriais diferentes, não resultará em uma carta de controle que possa nos fazer chegar a conclusões proveitosas sobre os processos, ou mesmo que sejam sensíveis a mudanças.
Um Outro Tipo Carta de Controle
Quando tratamos de produtos fabricados em bateladas, uma escolha natural de subgrupos são os valores medidos de uma característica da qualidade por meio de amostras da batelada. Ou seja, pode ocorrer uma situação em que a variação entre bateladas seja, naturalmente, maior que a variação dentro da batelada, sem que o processo esteja fora de controle estatístico.
Isto ocorre, por exemplo, em indústria de óleo e gás, com a variação das medições dentro de uma batelada sendo um estimador muito rigoroso para a variação em longo prazo (entre bateladas). Outros exemplos são comuns na indústria de fabricação, como, por exemplo, medições de características da qualidade provenientes de lotes diferentes.
O exemplo abaixo (dados fictícios na figura 8) procura ilustrar uma coleta de amostras (n = 4) de lotes diferentes, com os resultados das medições na coluna “Observações”. São 20 lotes sequenciais.
Caso usemos uma carta de médias e amplitudes tradicional, obteremos:
Fig. 6. Carta Xbar-R para os dados do exemplo.
Observe como a variação dentro do subgrupo é uma estimativa muito rigorosa para a variação entre os lotes. Não significa que o processo esteja fora de controle estatístico, mas sim que há variação a ser medida entre os lotes. Certamente, é importante conhecer esta variação, em busca de melhorias junto ao fornecedor.
Isto é possível com a chamada carta de controle I-AM-R/S (entre/dentro) (figura 7). As médias dos subgrupos serão plotadas na primeira das três cartas, que é uma carta de controle para individuais. As amplitudes móveis destas médias estão na segunda carta. E, na terceira carta, estarão as amplitudes dos subgrupos.
Note que a variação entre as bateladas está estável, porém será benéfico reduzi-la, se possível.
Fig. 7. Carta I-AM-R/S para os dados do exemplo.
Considerações Finais
Esperamos que tenha ficado clara a importância da definição de subgrupos adequados para o uso correto do controle estatístico do processo. É fundamental que o praticante esteja consciente da diferença entre variação a curto prazo e variação a longo prazo quando estiver trabalhando com controle e melhoria de processos.
Subgrupos serão “racionais” quando as observações forem coletadas em condições similares, não englobarem causas especiais de variação e representarem, em curto prazo, a natureza da variação a longo prazo do processo.
Fig. 8. Dados para o exemplo da diferença entre lotes.
Referências
Nelson, L. S. (1988) Control Charts: Rational Subgroups and Effective Applications, Journal of Quality Technology.
Master Black Belt - Head of EmPower Continuous Improvement @ Serasa Experian | LSS MASTER BLACK BELT | Melhoria contínua
3 aExcelente conceito e ficou claro de como subgrupos mal definidos, podem apresentar conclusões incorretas.