O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA: NECESSIDADE DE “CONSTÂNCIA” NAS DECISÕES EMANADAS PELA CORTE.

O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA: NECESSIDADE DE “CONSTÂNCIA” NAS DECISÕES EMANADAS PELA CORTE.

É de conhecimento geral que o Supremo Tribunal Federal vem sofrendo severas críticas em função do que se denomina comumente de “ativismo judicial”[1]. Sem dúvida alguma pode-se até cogitar um certo “exacerbamento” no desempenho da função jurisdicional, mas não se pode esquecer que a interpretação é elemento indissociável de tal atividade, inclusive para dar ordem e unidade ao sistema jurídico, alcançando o princípio maior da segurança jurídica.

A validade da norma vincula-se não só ao fato da mesma emanar do poder competente para editá-la, mas de seu respeito as metanormas que lhe afetam, sendo que cabe ao Poder Judiciário, utilizando-se da interpretação, verificar esta consonância.

Assim, é razoável sustentar, mormente neste processo interpretativo, que o Supremo Tribunal Federal venha a guardar coerência em suas deliberações, em especial quanto às questões relativas ao conhecimento de recursos que lhe sejam endereçados. Não se quer dizer, com isso, que o Supremo Tribunal Federal esteja “engessado” em posição outrora adotada sob as circunstâncias temporais/factuais e valorativas diversas. A sociedade é a vida são elementos dinâmicos e assim o devem ser a ordem jurídica e o seu guardião maior, o Supremo Tribunal Federal.

Mas, mesmo para que isto ocorra (mudança de posicionamento), deve o Supremo Tribunal Federal, parcimoniosamente, justificar o porquê desta alteração em seu posicionamento e suas circunstâncias, sob pena de temas ontologicamente idênticos suportarem consequências diferentes.

[1] “É certo que o protagonismo do Judiciário tem levantado inquietações pertinentes36, fundadas na desconfiança dos juízes e em clássicas advertências, como de EDUARDO LAMBERT37, a respeito do governo de juízes (gouvernement des juges) ante a identificação dos magistrados com elementos antidemocráticos e conservadores, a ponto de utilizar o tratamento pejorativo de “aristocracia da toga” (l’aristocratie de la robe), e de RENÉ MARCIC38, que identificava a transformação do Estado de Direito em Estado de Juízes (Vom Gesestzesstaat zum Richeterstaat). Fuck, Luciano Felício, in “Estado Fiscal e Supremo Tribunal Federal”, págs. 40/41

Aliás, revela-se clara a possibilidade de utilização do mecanismo da modulação dos efeitos de determinado entendimento encampado pelo Supremo Tribunal Federal, vis-à-vis de outro diverso adotado anteriormente.

Realizadas estas breves considerações, oportuno demonstrar o quão importante papel desempenha o Supremo Tribunal Federal para o cumprimento do postulado da segurança jurídica. Para tal fim, verifiquemos a situação, no que concerne à admissibilidade do recurso extraordinário, da atuação do Supremo Tribunal Federal como “legislador negativo”.

Visando a contribuir exemplificativamente, vejam-se as seguintes decisões:

 RE 205399 ED / PR - PARANÁ

EMB.DECL.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO | Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA

Julgamento: 22/05/2001          Órgão Julgador: Segunda Turma

Publicação

DJ 18-06-2001 PP-00012 EMENT VOL-02035-03 PP-00424

Parte(s)

EMBTE.   : UNIÃO FEDERAL

ADV.     : PFN - SILVIA MARIA CARNEIRO RIBEIRO

EMBDO.   : TRANSBELO - TRANSPORTADORA BELO LTDA E OUTRO

ADV.     : ANTÔNIO CARLOS LOVATO E OUTRO

Ementa

EMENTA: - Recurso Extraordinário. FINSOCIAL. Decreto-lei n.º 1940/1982. Lei Complementar n.º 70/91 2. No Recurso Extraordinário n.º 150755-1, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 28 da Lei 7738/89, que inclui as empresas prestadoras de serviço no âmbito de incidência da contribuição para o FINSOCIAL. 3. O Plenário do STF, chamado a apreciar a divergência das Turmas, quanto a estarem sujeitas a idêntica alíquota para o FINSOCIAL as empresas locadoras de serviço e as vendedoras de mercadorias, especificamente, diante do que ficou assentado no julgamento do RE n.º 150.764-PE, decidiu, por maioria de votos, nos Embargos de Divergência no RE 187.436-8, declarar a constitucionalidade dos dispositivos concernentes à majoração de alíquotas para o FINSOCIAL (Leis nºs 7787, art. 7º; 7894, art. 1º; 8147, art. 1º), no que concerne às empresas exclusivamente prestadoras de serviço. 4. Obrigação da empresa recorrente de recolher as contribuições para o FINSOCIAL, nos termos das leis aludidas. 5. Embargos de declaração rejeitados.

DECISÃO

Por unanimidade, a Turma rejeitou os embargos de declaração. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Celso de Mello. 2ª. Turma, 22.05.2001.

De outra sorte, mesmo em uma equiparação indevida, o Supremo Tribunal Federal faz injunções que levam a possibilidade de interpretações como “legislador positivo”. Veja – se:

RE 203920 AgR / RJ - RIO DE JANEIRO

AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO

Julgamento: 15/09/1998          Órgão Julgador: Segunda Turma

Publicação

DJ 05-02-1999 PP-00023 EMENT VOL-01937-05 PP-00878

Parte(s)

AGTE. : P PIMENTEL SISTEMAS CONTABEIS E AUDITORIA S/C

ADVDO.: LUIZ EDMUNDO CARDOSO BARBOSA E OUTROS

AGDO. : UNIÃO FEDERAL

ADVDO.: PFN - SIDINY GARCIA F

Ementa

FINSOCIAL - PRESTADORA DE SERVIÇOS - ARTIGO 56 DO ADCT. O artigo 56 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias não abrange a situação das prestadoras de serviços. Daí a valia constitucional dos diplomas que implicaram a elevação da alíquota do que por elas devido a partir do disposto no artigo 28 da Lei nº 7.738/89.

Decisão

Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Presidente e Maurício Corrêa. Presidiu, este julgamento, o Senhor Ministro Carlos Velloso. 2ª Turma, 15.09.98.

De maneira diversa, o Supremo Tribunal Federal vem rechaçando a possibilidade de conhecimento do recurso extraordinário nos seguintes termos:

ARE 963455 AgR / SP - SÃO PAULO

AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

Relator(a): Min. ROSA WEBER

Julgamento: 18/12/2017          Órgão Julgador: Primeira Turma

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO

DJe-022 DIVULG 06-02-2018 PUBLIC 07-02-2018

Parte(s)

AGTE.(S) : BANCO J. P. MORGAN S.A. E OUTRO(A/S)

ADV.(A/S) : RUBENS JOSE NOVAKOSKI FERNANDES VELLOZA

ADV.(A/S) : LUIZ EDUARDO DE CASTILHO GIROTTO

AGDO.(A/S) : UNIÃO

PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

Ementa

EMENTA DIREITO TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ISONOMIA. ALÍQUOTA DIFERENCIADA. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA. CONSONÂNCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE ENTRE O CASO E O PARADIGMA DA REPERCUSSÃO GERAL INDICADO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 5º, CAPUT, 145, § 1º, 150, II, 153, III, E 195, § 9º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AGRAVO MANEJADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/2015. 1. O entendimento assinalado na decisão agravada não diverge da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal. Compreensão diversa demandaria a reelaboração da moldura fática delineada no acórdão de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa à Constituição, insuscetível, como tal, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. 2. As razões do agravo não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere à ausência de ofensa a preceito da Constituição da República. 3. Agravo interno conhecido e não provido.

DECISÃO

A Turma, por maioria, conheceu do agravo e negou-lhe provimento, nos termos do voto da Relatora, vencido o Ministro Marco Aurélio. Primeira Turma, Sessão Virtual de 8.12.2017 a 15.12.2017.

Poder-se-ia enumerar outros casos em que o Supremo Tribunal Federal rechaçou a possibilidade do jurisdicionado, legitimamente, ter conhecido e percutido no mérito uma questão absolutamente idêntica:  reduzir, o texto da lei, proporcionando uma alíquota menos gravosa, em face dos princípios da capacidade contributiva e da isonomia. Qual razão para distinguir situações absolutamente iguais?

Ora, qual a distinção entre as situações anteriormente reproduzidas? Ambas enveredaram sobre uma majoração de alíquota, mas, em um caso, houve o enfrentamento do mérito da questão e, em outro, não se conheceu do recurso por haver ofensa reflexa o Tribunal alienando agir como legislador positivo.

Diga-se, que está inconstância não é percebida somente em matéria tributária, mas inclusive e, infelizmente, no que tange ao direito penal. Contribui o Supremo Tribunal Federal com esta instabilidade? Obviamente não!






Parabéns! Excelente artigo!

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