O tempo na Recuperação Judicial

No clima da aprovação do Projeto de Lei (PL) que trata de Recuperação Judicial (RJ), pelo Senado Federal, escrevo um artigo para dizer que está em tramitação no Congresso Nacional, o PL da Recuperação Judicial que suscita bons debates sobre a viabilidade legal deste instituto. Antes de mais nada, importante destacar que Recuperação Judicial não caracteriza falência, SE (veja bem) SE, a empresa: fizer o pedido dentro do prazo; souber o nível de endividamento; e saber se o caixa disponível compactua com o pedido de RJ ou por si só decreta falência.

Você deve estar se perguntando, e que "tempo" é esse? Para responder essa pergunta gostaria que olhasse este gráfico abaixo:


 

Não foi fornecido texto alternativo para esta imagem

 

 Slide da professora Márcia Yagui do curso de Recuperação Judicial no INSPER. Fevereiro/2020.

 

 

Nesse artigo vamos tratar do “tempo”, a razão dos pedidos de RJ de acontecerem de forma tardia, o porquê do pedido tardio, não apenas do ponto de vista de análise financeira, mas sim vista de gestão. Afinal, a crise de uma empresa não é vista somente no âmbito financeiro, mas também na condução de uma má gestão.

No balanço patrimonial é possível analisar os sinais da evolução da crise, e isso cabe ao Administrador Judicial. Por exemplo, saber identificar a perda de liquidez financeira da empresa, através do balanço, com a perda de capital circulante e um fluxo de caixa negativo. Esses sinais da crise podem ser iniciais ou avançados, mas a causa MAIOR das crises é a má gestão.

Voltando ao gráfico, devemos analisar a curva desse gráfico, logo no início da queda, destacada em vermelho, fica caracterizada a necessidade de fazer um realinhamento do negócio, inclusive com os credores por exemplo, o que chamamos de early turnaround. Dessa forma, para que um pedido de Recuperação Judicial tenha a possibilidade de êxito, este deverá iniciar acima da linha do tempo – early turnaround. O tempo é aliado no negócio.

No entanto, a realidade no Brasil é outra. O que vemos por aqui é que muitas empresas entram em RJ quando já é caso de insolvência. Por que disso? Para esclarecer um pouco essa dúvida, vamos a uma matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo, a partir do levantamento da consultoria Corporate Consulting e do escritório de advocacia Moraes Salles, em 14 de fevereiro de 2013. Porque apenas 1% das empresas sai da recuperação judicial?

São vários fatores que fazem essa manchete ter destaque, tais como, questões burocráticas e econômicas, pendências judiciais que impedem o encerramento da recuperação, e há também, casos de companhias que recorreram ao instituto tardiamente, praticamente à beira da falência.

Na matéria fica claro que muitas empresas pedem RJ, mas na hora errada, pois já é caso para falência. De novo, reforço e pergunto, por que disso? Para isso vou contar uma experiência que tive no início do ano (aqui vale um parêntese, que esse curso aconteceu em fevereiro de 2020 e que ainda não existia pandemia do Covid-19 no Brasil), onde fiz um curso de Recuperação Judicial (RJ) na INSPER, e experiências foram compartilhadas.

O brasileiro tem uma cultura de ser muito “arraigado” com o pedido de RJ. O exemplo citado por um grupo de colegas foi de empresas da região nordeste, quando ocorreu o pedido de RJ (simultâneo) de sete usinas do estado de Alagoas, no ano de 2017, situação de crise que já se arrastava há algum tempo.

Em muitos casos, para os donos dessas empresas, existe uma mácula em pedir RJ, pois o vizinho de porta é o credor, e isso gera uma resistência muito grande. A percepção no Brasil, e por parte dos credores, ainda é a de associar o pedido de RJ com calote e posterior falência da empresa. E boa parte do que promove o agravamento da crise é o desgaste com os credores. Além disso, se mal assessorada, uma empresa pode acabar pedindo recuperação judicial porque acredita que parte da sua dívida será perdoada. O que não é correto afirmar!

Por outro lado, um bom exemplo do uso do “tempo” na análise da restruturação, foi o sucesso do pedido de RJ do BTG pactual, uma combinação de um early turnaraund e boa gestão. O management é essencial para contornar a CRISE.

Dito tudo isso, e com a aprovação do PL de Recuperação Judicial, esperamos que as empresas tenham muito bem definido em seu escopo a hora certa de ingressar com o pedido de RJ. Por isso é preciso olhar estrategicamente o negócio, saber a liquidez do ativo e daí tomar a decisão correta, não exclusivamente com o foco no financeiro. Para os advogados que não conhecem a realidade da empresa, é importante mapear o seu diagnóstico através de uma assessoria financeira confiável e, principalmente, ter uma visão geral da recuperação judicial como um processo. Recuperação Judicial não pode ser sinônimo de calote institucionalizado.

Entre para ver ou adicionar um comentário

Outros artigos de Renata Caixeta

Outras pessoas também visualizaram

Conferir tópicos