O Terceiro Setor e a sobrevivência em tempos de pandemia
Glória Branco
Para Rafael Ferreira, diretor da ONG Mirante Cultural, a pandemia tem desafiado o terceiro setor globalmente. Além das causas existentes devido a desigualdade social, o cenário mundial pede assistência extra para mitigar os efeitos negativos do isolamento social e da quarentena. E é aí que as organizações da sociedade civil encontram obstáculos pungentes.
Segundo a pesquisa Impacto do Coronavírus no Terceiro Setor, realizada em 2020 pela Agência do Bem, 67% tiveram queda de arrecadação de suas receitas acima de 50% após o início da pandemia, e 83% previam riscos concretos de fecharem suas portas no curto prazo ou terem de reduzir substancialmente suas atividades caso a situação atual não se revertesse rapidamente.
As organizações consultadas em geral são das áreas de assistência e educação. É o caso do Mirante Cultural localizado na periferia de Pirituba, zona noroeste de São Paulo. Trabalhando com educação, arte e cultura há oito anos, a organização tem enfrentado dificuldades para manter suas atividades em ação. O baixo fluxo de doações aliado aos atrasos na disponibilização de verbas governamentais conquistadas através de editais coloca a área de captação de recursos a trabalhar incessantemente.
“Tivemos que repensar nossas estratégias de arrecadação para impulsionar ainda mais nossos recursos e buscar maior aporte financeiro junto a empresas do segundo setor”, declara Rafael, diretor da ONG de Pirituba.
No caso da pandemia, as doações de alimentos e itens de higiene pessoal reforçou ainda mais a importância dessas organizações. Grande parte das doações recebidas foram de alimentos e cestas básicas para 45% das organizações entrevistadas pela pesquisa; produtos relacionados à prevenção da Covid-19 foram 28%; produtos de higiene pessoal, 25%; e contribuições financeiras, 21%.
Mesmo com todas as doações indicadas acima, 59% das ONGs deixaram de atender mais pessoas na pandemia por falta de ajuda, já que a grande maioria teve um aumento nos gastos em 2020. Um desses aumentos é com investimentos em estrutura para trabalho remoto.
Em outra pesquisa promovida pelo Datafolha para a fabricante de bebidas Ambev, 41% das empresas do terceiro setor temem não ter apoio financeiro no curto e médio prazo. Entre elas, estão as organizações do nordeste com 51%, do centro-oeste e do norte com 42%, e no sudeste e sul 36% e 35%, respectivamente, disseram antever problemas.
Tanto nesse momento como na pós-pandemia, o que as ONGs sabem é que unir forças entre sociedade e voluntários será o caminho para atravessar um período difícil. Com o envolvimento do governo, comunidade e empresas, o trabalho realizado pelo terceiro setor terá ainda mais impacto positivo, principalmente na conjuntura atual.
Diante do isolamento social, atividades como eventos, bingos e jantares - organizadas por ongs para arrecadação de fundos - foram suspensas para conter o contágio. A salvação está nos financiamentos coletivos online em plataformas como Benfeitoria, Vakinha e Kickante.
A queda econômica e as incertezas da pandemia têm fechado as mãos do mercado e as vaquinhas coletivas têm se mostrado uma alternativa para ONGs pagarem funcionários e custos mensais. As doações estão todas direcionadas para a Covid-19, nada mais correto para o cenário presente.
Outro fator que preocupa as ONGs é de que, até o momento, não houve inclusão pelo Banco Central nas medidas criadas para apoiar pequenas e médias empresas durante a crise do coronavírus. São 780 mil entidades do terceiro setor que estão sem gerar renda, com dificuldades para arcar com as despesas e com o pagamento dos funcionários.
Apesar de tudo, a esperança se mantém e a missão não deixa o desanimo abater. Mais do que nunca os mais vulneráveis precisam de apoio e lidar com crises é a razão de todas as ONGs existirem.
“Não perdemos a razão de trabalhar, na verdade ganhamos ainda mais motivos para continuar mantendo o Mirante Cultural em atividade”, garante Rafael. Entretanto, ainda nos questionamos sobre quem vai ajudar aqueles que ajudam a não falir?