Os loucos estavam é do lado de fora
Livro escrito por Daniela Arbex

Os loucos estavam é do lado de fora

Recentemente li o livro Holocausto Brasileiro. Sou compulsivo por livro e raramente leio introduções, prefácios ou reviews. Gosto de comprar o que me atrai logo de cara.

O livro é um tapa na cara do início ao fim. Chegando no final a autora, Daniela Arbex (trabalho genial!) resolve aliviar um pouco a mão porém a tensão nunca deixa de estar presente.

Confesso que quando li o título achava que se tratava de algum acontecimento nas épocas das grandes guerras ou até durante a ditadura.

Para minha surpresa o livro retrata a história dos mais de 100 anos de existência do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena. Mais conhecido como Hospital Colônia.

Desde sua fundação, em 1903, estima-se que aproximadamente 60.000 pessoas tenham morrido.

Não você não leu errado. Em épocas mais frias chegavam a morrer 16 internos por dia!


Já que o título faz uma direta referência ao genocídio da segunda guerra, foi impossível não concluir que o caso aqui, trata-se de um evento mais demoníaco ainda.

No caso do Hospital Colônia, não existia nenhum tipo de ideologia, cultura ou doutrina por trás.

Era simplesmente a ausência total de humanidade por parte dos dirigentes, funcionários, classe política e, principalmente familiares.

Você não deve ter ainda captado a magnitude do absurdo. Registros mostram que cerca de 70% dos internos não tinham nenhum histórico ou diagnóstico de problemas mentais.

Estamos falando de crianças tímidas ou encrenqueiras, amantes que engravidavam e precisavam ser limadas da face da terra por maridos poderosos.

Estamos falando de alcoólatras e pequenos infratores que policiais em vez de prender resolviam colocar no trem dos doidos.

Sim, naquela época diversas ferrovias passavam por Barbacena. Então famílias em diversas cidades e Estados poderiam com muita facilidade, simplesmente pegar seu “problema”, pentear o cabelo e comprar uma passagem somente de ida para o trem dos doidos.

As pessoas chegavam lá, tinham cabelos raspados e depois de 10, 20, 30 anos de privação externa e convívio como lixo humanoperdiam sua sanidade, seu passado, seu futuro, sua identidade.

Pavilhões com capacidade para 200 internos comportavam 2.000. Para ajudar no espaço, tiravam as camas e forravam tudo com palha. Então dormiam pessoas, roedores e todos os tipos de insetos.

Comida escassa geravam corpos moribundos e como roupa era artigo de luxo as fotos dos pátios retratavam multidões de mortos vivos sem roupas sem nenhum tipo de divisão, crianças mulheres, adultos.


Como morria muita gente, que tal o Hospital Colônia lucrar um pouquinho vendendo corpos para as universidades locais?

No início conseguiram lucrar, mas ganância foi tanta que o preço do cadáver despencou já que a oferta era maior do que a demanda. Sim tiveram que dar outro destino para os corpos e muitas vezes não era o tradicional.

Mesmo após inúmeras denúncias e escândalos tudo só começou a mudar na década de 80. O italiano Franco Basaglia, um renomado psiquiatra veio ao Brasil e ao visitar o local reportou para a grande mídia que tínhamos um campo de concentração em pleno Estado mineiro.

Mudaram-se procedimentos, formas de tratar, ensinar, leis foram criadas e hoje em dia alguns poucos internos continuam no local porém com tratamento adequado.

Leitura pesada, porém importante para vermos o quanto, as vezes lemos e conhecemos estórias de muitos lugares no mundo mas pouco conhecemos o que se passa aqui em nosso próprio País.

Como falei no título, a única loucura retratada no livro é a dos doidos que ficavam aqui fora.

Ao conversar sobre o livro descobri pessoas próximas que tiveram ligação com o Hospital Colônia, tanto como internos como dirigentes.

O que mais impacta ao se ler o Holocausto Brasileiro é a reflexão que ele causa.

Alguns exemplos de pessoas que eram enviadas para o Hospital Colônia e depois recebiam visita de parentes. Porém essas visitas nunca se repetiam afinal o que viam lá era assustador ao ponto de fazer com que nunca mais repetissem.

O que faz o ser humano escolher se desfazer do problema no lugar de tratar o problema?

Não tenho formação em áreas da saúde. Isto é um depoimento sobre uma obra literária.

Conhece alguém que presenciou esta estória? Não importa em qual dos lados, me conta, vamos debater pontos de vista.

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