Os Novos Biocombustíveis e Expansão da Produção Sustentável de Oleaginosas no Brasil
Bruno Galvêas Laviola
Engenheiro Agrônomo e Doutor em Produção Vegetal; Chefe Adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento na Embrapa Agroenergia ; Representante da Embrapa na Câmara Setorial de Oleaginosas e Biodiesel (CSOB/MAPA), Bolsista de Produtividade em Pesquisa pelo CNPq (PQ1C).
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3008972872111623
O Brasil pode ser considerado um dos países mais privilegiados em termos de vocação agrícola no mundo. O País possui localização estratégica na região tropical, com alta incidência de energia solar, regime pluviométrico adequado e conta com grandes reservas de terras agricultáveis, o que permite planejar o uso agrícola em bases sustentáveis, sem comprometer os grandes biomas nacionais. A sinergia entre a agricultura de alimentos e de energia é um aspecto notável e estratégico. A vasta extensão territorial e a diversidade de climas permitem que o país cultive simultaneamente culturas para alimentação e para produção de bioenergia, sem que haja uma competição por espaço ou recursos. Além disso, a adoção de práticas agrícolas sustentáveis e integradas potencializa essa sinergia. Por exemplo, a rotação de culturas pode ser utilizada para alternar entre cultivos alimentares e oleaginosas destinadas à produção de biocombustíveis, enriquecendo o solo e aumentando sua produtividade. A integração de cultivos com a pecuária em sistemas de ILPF (Integração Lavoura-Pecuária-Floresta) não só otimiza o uso da terra, mas também contribui para a recuperação de pastagens degradadas. Essas práticas permitem que a produção de alimentos e energia avance de mãos dadas, reforçando a posição do Brasil como um líder global tanto na produção agrícola quanto na bioenergia. Este modelo de desenvolvimento agrícola sustentável e integrado não só atende às necessidades internas, mas também coloca o Brasil em uma posição privilegiada no mercado internacional, como um fornecedor confiável e responsável de alimentos e bioenergia, principalmente, biocombustíveis.
A indústria de biocombustíveis está em constante evolução, e o Brasil desempenha um papel crucial nesse cenário global. Com a crescente demanda por óleos vegetais impulsionada pelo aumento da utilização de biodiesel e a introdução de novos biocombustíveis, como o Diesel Verde, SAF (Combustível de Aviação Sustentável), Hidrogênio Renovável e combustíveis marítimos, o Brasil se encontra diante de oportunidades e desafios igualmente significativos. Embora os novos biocombustíveis possam ser produzidos a partir de diversas matérias-primas, incluindo sacarinas, amiláceas e lignocelulósicas, este artigo se concentrará nas matérias-primas oleaginosas.
Existe no Brasil muitas espécies nativas e exóticas que produzem óleo em frutos e grãos, com diferentes potencialidades e adaptações naturais a distintas condições de clima e solo do País. Os desafios quanto ao uso das matérias-primas oleaginosas e as estratégias do desenvolvimento da cadeia de produção de biocombustíveis no Brasil passam por gargalos técnico-científicos-políticos relativos à sua produção, seu processamento industrial e à sua integração com cadeias produtivas regionalizadas.
Dentre as oleaginosas cultivadas, a soja se destaca atualmente como a principal candidata a fonte de matéria-prima oleaginosa para a produção de biocombustíveis a curto prazo, já que é a única entre todas que atende na totalidade a quatro critérios ou parâmetros básicos e essenciais: o primeiro parâmetro refere-se ao domínio tecnológico, em que o Brasil é a referência mundial no desenvolvimento de tecnologias para a produção de soja em áreas tropicais e subtropicais, praticamente sem o uso de adubos nitrogenados (fixação biológica de nitrogênio); o segundo parâmetro refere-se a escala de produção, sendo a soja a principal oleaginosa produzida no Brasil, com a semeadura de aproximadamente 45 milhões de ha; o terceiro critério refere-se à logística de distribuição espacial da matéria-prima ao longo do território nacional, sendo a soja uma das únicas matérias-primas com produção em todas as regiões do país; por fim, um quarto critério é o preço do óleo no mercado, que deve ser compatível com o custo de produção dos biocombustíveis.
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Embora quatro critérios façam da soja, em curto prazo, a principal candidata a fonte de matéria-prima para produção dos novos biocombustíveis, e considerando ainda que a soja é atualmente a principal fonte de matéria-prima para produção de biodiesel, é importante ponderar que não é estratégico para o País depender apenas de uma única fonte de matéria-prima. Neste sentido, torna-se necessária a busca e o desenvolvimento contínuo de outras oleaginosas para aumentar o adensamento energético e que atendam a critérios relacionados à diversificação e a regionalização.
Das oleaginosas disponíveis para diversificar a produção em médio prazo, pode-se considerar as opções como o dendê (palma-de-óleo), algodão, girassol, canola, entre outras. Estas oleaginosas possuem domínio tecnológico (cultivares, sistema de cultivo, ...), porém carecem de ações para ampliar a escala de produção, considerando a regionalização da produção. Muitas destas oleaginosas são opções interessantes para diversificar a produção regional, mas a área cultivada e a produção ainda são consideradas baixas para atender a demanda de biocombustíveis.
Neste contexto, a canola se destaca como uma opção promissora para a diversificação da produção de óleo e proteína vegetal no Brasil. A expansão sustentável do cultivo de canola tem o potencial de posicionar o Brasil como um dos maiores produtores globais dessa oleaginosa, aproveitando áreas de safrinha que normalmente ficam ociosas. Estudos apontam que até 20% da área atualmente dedicada à soja poderiam ser utilizadas para o cultivo da canola na safrinha. Isso representaria cerca de 9 milhões de hectares e poderia atender até 90% da demanda de óleo, por exemplo, que foi utilizada na produção de biodiesel em 2022, reduzindo a dependência de uma única cultura.
A longo prazo podemos considerar as oleaginosas perenes que estão domesticadas, em que se destaca a macaúba. Esta oleaginosa apresentam grande potencial para cultivo nas regiões centro-sul e nordeste do Brasil. Porém, para que seja opção segura e economicamente viável há a necessidade de pesquisas para o desenvolvimento de cultivares e de sistemas de cultivo buscando-se produtividade de 4.000 kg/ha de óleo em bases sustentáveis.
A certificação da produção de oleaginosas e a produção em bases sustentáveis é algo que vem ganhando importância no setor dos biocombustíveis. Neste contexto, a sustentabilidade dos cultivos de oleaginosas poderá ser ampliada com o uso de bioinsumos, como biofertilizantes, bioestimulantes e biopesticidas. Esses produtos contribuirão para uma produção mais ecológica, reduzindo a dependência de insumos químicos, promovendo a saúde do solo e minimizando os impactos ambientais, tornando os cultivos ainda mais vantajosos para o Brasil.
Em resumo, o papel dos biocombustíveis está se expandindo na matriz energética do Brasil e globalmente. A diversificação de matérias-primas e o avanço tecnológico são vitais para integrá-las de forma sustentável na matriz energética. Investimentos contínuos em pesquisa e desenvolvimento são imprescindíveis para que o Brasil mantenha sua liderança e promova alternativas energéticas sustentáveis em resposta às mudanças socioambientais globais.
Empreendedor -MINOICOS CONSULTORIA E MERCADO
1 aAc
Head de negócios / Diretor comercial / B2B executivo / Inovação
1 aBruno Laviola: parabéns pelo trabalho. A diversificação da fonte de matéria prima para o biocombustiveis talvez seja o nosso grande desafio no curto prazo.
Carinata & Canola Manager - BR/PY at Nuseed
1 aParabéns pelo artigo, O Brasil é o país das oportunidades, e a Canola está se mostrando cada vez mais versátil e uma carta na manga para toda demanda de biocobustíveis a nível global. Uma outra brassica que tem tudo para avançar é a Carinata ("irmã" da canola) uma pouco mais selvagem que segue como mais uma candidata.