Papo de Botequim

Tenho conversado com muita gente nestes dias. Conversado mesmo, daquelas conversas em que o celular fica fora da mesa e a gente tem tempo para ouvir, refletir e responder, enxergando aquele que está à sua frente e tomando café sem pressa, sem qualquer pressa, porque o compromisso mais importante do dia é aquele daquele momento.

Exatamente como mandam os treinamentos de liderança, o RH, os livros de gestão e de auto-ajuda, mas sem o comprometimento com o resultado, ou com as análises, ou com o feedback. Apenas pessoas sendo pessoas, sem esperar nada em troca e sem que seja esperado retorno.

Muito esquisito.

Para uma pessoa voltada a resultados, com uma vida baseada na utilidade do tempo e na solução de problemas, esse tipo de exercício é a coisa mais inovadora que poderia fazer. Acho que os cursos de Design Thinking deveriam incluir a “contemplação” e “conversa sem resultado objetivo” como matérias obrigatórias, porque é muito, mas muito, fora da caixa. E, em tese, é justamente daí que deveriam nascer as grandes e melhores ideias para algum resultado ainda não conhecido e sabido.

Assim, essa coisa de “jogar conversa fora” tem sido uma grande prova. É necessária uma disposição infinita para estar presente a cada momento apenas para desfrutar o prazer de uma companhia, a qualquer tempo. Nunca soube fazer bem e não tem lição de casa, livro de exercícios ou curso para aprender. E não vale, nessa conversa, fofoca ou novela. Dificuldade nível hard.

Outro desafio destes tempos de ócio criativo, além de aprender o bom e velho "papo de botequim", é a superação e julgamento sobre a minha competência.

Sim, porque também faz parte do momento, na procura de novas ideias, o olhar sobre vida alheia (shame on me), e a constatação de todos os cursos que eu não fiz, mas todo mundo fez, todos os cargos acumulados que todos tem, mas eu não, e por aí vai, com a sessão de tortura geralmente terminando com um grito em alto e bom tom:

- Incompetente!

Nessas horas, tendo em vista que o “grito em alto e bom tom” foi dentro da minha cabeça, os neurônios entram em combustão instantânea e por alguns segundos uma angustia absoluta toma conta de mim - parece que desperdicei o valioso tempo e não cumpri com o to do list das competências necessárias para ser top.

Um horror.

Para isso, desenvolvi algumas soluções (a mania de querer resolver todos os problemas ainda está tatuada), que achei por bem compartilhar, porque... bom, porque acho que não devo ser única a passar por isso e pode ser útil para alguém. Aqui vão:

1)   Ir correr. Não há pensamento idiota que resista a uma corrida, e gaste tempo apenas para constatar o pensamento (tão cruel) e colocar um tênis.

2)   Desapegar dos conceitos que temos sobre nós mesmos. Como diz o Pedrinho Salomão, ele e eu, pelo menos, somos burros - aceitar esse fato, que é oposto do que mamãe sempre disse e eu sempre acreditei, é libertador. Dói o ego, mas daquele tipo de machucado que “quando casar, sara”.

3)   Lembrar que há mais pessoas na mesma situação. Isso dá uma sensação de pertencimento (ao contrário do isolamento característico de pensamentos mais sombrios). #tamojunto.

E mais que tudo, como disse o Sadhguru, no vídeo que o Teori Zavascki compartilhou com seus familiares antes do acidente fatídico, o mais importante neste momento é que você está vivo, e porque você está vivo, sua família se tornou importante, seu dinheiro e seu país se tornaram importantes e, porque você existe, o universo se tornou importante! Só tem um item sobre o qual todos nós somos inegavelmente competentes, mas essa competência não precisa de treino! Veja aqui o vídeo.

E segue o jogo.

OBS: Como prometido no último post, o programa grátis da semana é o CINUSP. O “CINUSP Paulo Emílio é uma sala de cinema gratuita e aberta ao público em geral, localizada na Cidade Universitária. A programação é variada, contando com mostras temáticas produzidas por professores e alunos da universidade, seminários, debates, cursos, pré-estréias e parcerias com festivais de cinema”. Tem filmes clássicos todos os dias. Vai lá.