Planos de saúde e “home care”: contratação segura e eficiente
Utilizado muitas vezes com alternativa a internação hospitalar, o atendimento domiciliar a saúde ("home care") tem também transformado as relações entre familiares que necessitam de atenção especial a um de seus membros, criando novos problemas a serem solucionados nesse campo.
As particularidades dos serviços de atendimento domiciliar à saúde ainda impõem a equalização entre qualidade, a viabilidade econômica e jurídica de forma bem peculiar. Alguns desafios podem ser ressaltados, perpassando necessidades tanto dos profissionais da saúde, quanto operadoras, prestadoras de serviços, familiares e pacientes. Dentre vários outros, pode-se destacar:
· Trata-se de um serviço cuja demanda oscila, tendendo especialmente a transitoriedade dos serviços prestados especialmente por técnicos, enfermeiros e cuidadores – sem descartar fisioterapeutas, fonoaudiólogos, médicos, nutricionistas, etc;
· Tal perfil tende a ineficiência econômica da contratação desses profissionais sob regime de trabalho empregado/subordinado, considerando os custos de admissão e demissão de funcionários para realização desses serviços transitórios;
· A gestão e subordinação dessa mão de obra por operadoras de planos de saúde desfoca a atividade da operadora e impõe novos custos de transação;
· A família não tem, em regra, interlocutor com capacidade técnica de compreender as particularidades do atendimento clínico. A necessidade de fiscalização técnica do atendimento tende a ser uma necessidade a ser suprida também por terceiros;
· Também em regra, a família do paciente não tem condições de gerenciar escalas de plantões e contratações dos vários profissionais necessários ao atendimento. Mesmo em casos de menor complexidade, onde o atendimento possa ser realizado por cuidadores, considerados empregados domésticos pela legislação, trata-se de um esforço tremendo.
Entretanto, boa parte das tentativas de responder aos desafios desse segmento tende à insegurança jurídica e/ou à ineficiência econômica. Dentre elas, são alguns modelos constatados:
1° modelo: Contratação de empresas que subcontratam serviços de cooperativas, com os seguintes impactos:
o Tributação sucessiva pelo mesmo serviço. Cooperativa cobra à empresa de “home care”, sendo tributada. Esta empresa, por sua vez, também fatura pelo mesmo serviço contratado pelas operadoras, sendo igualmente tributada em parte pelo mesmo serviço, tornando desnecessariamente mais oneroso o serviço.
o Com os custos da operação, reduz-se a capacidade de melhor remuneração dos serviços aos profissionais da área, acarretando litígios decorrentes da alegação de precarização da categoria;
o Insegurança jurídica decorrente da compreensão de setores fiscalizatórios como terceirização ilícita (ou quarteirização, conforme alguns compreendem) e estabelecimento de vínculo com empresas de “home care” e responsabilidade subsidiária ou solidária com as operadoras – estas tem sido consideradas pela Coordenação de Combate à Frauda às Relações de Trabalho com responsável pela adequada relação de trabalho estabelecida entre sua rede credenciada e profissionais do setor. Sobre esse ponto, vale dizer que a reforma trabalhista, ao deixar clara a possibilidade de terceirização de atividade fim, por outro lado não alterou os elementos que caracterizam o regime de emprego. Assim, se a terceirização da atividade evidenciar na prática esses elementos – especialmente a subordinação – permanece o risco;
o Tendo cooperativas e prestadoras objeto social análogo, os instrumentos contratuais habitualmente utilizados confessam esse tipo de terceirização e, não raro, evidenciam traços de subordinação entre cooperados e empresa contratante.
2° modelo: Contratação de profissionais como profissionais autônomos pelas operadoras:
o Novamente, custos de transação elevados, necessidade de gestão logística da mão de obra no foco da operadora ou empresa preposta;
o Risco de estabelecimento de regime de emprego com os supostos autônomo em razão da continuidade e potencial subordinação;
o Muitas vezes, esses profissionais são transferidos para cooperativas ou empresas não cooperativas para integrarem a rede credenciada da mesma operadora, acrescentando o risco de configuração da pessoalidade nessas relações.
3° modelo: Contratação direta de cooperativas de trabalho:
o Os parâmetros para esse modelo produzir tanto a eficiência e economicidade, quanto da segurança jurídica para todos os interesses envolvidos não têm sido observados em alguns aspectos;
o Nota-se que os contratantes em geral ainda desconhecem as exigências que podem ser feitas para segurança dessas contratações, com base na Lei federal n° 12.690/2012 - documentos e práticas;
o As cooperativas adequadas à lei especial de cooperativas de trabalho, entretanto, submetidas a maiores custos de transação pela condição de regularidade e cumprimento das exigências legais, perdem em competitividade contra as cooperativas irregulares, que não incorporam em suas atividades os custos de funcionamento e, em especial, os de tutela de direitos sociais exigidos.
Por vezes, como dito, detecta-se que as operadoras indicam os profissionais que deverão ser admitidos nas cooperativas ou nas empresas de “home care”, agravando riscos de vínculo decorrentes da continuidade e, especialmente, da pessoalidade do trabalho prestado;
Entretanto, frise-se, o modelo cooperativista de serviços pode se mostrar vocacionado para suprir necessidades e problemas no interesse de todos os atores envolvidos neste mercado (trabalhadores, famílias, operadoras médicas), sobretudo após a lei 12.690/2012. Considerando as incertezas sobre a reforma trabalhista e as particularidades do trabalho em cooperativas essa a opção tem se mostrado mais vantajosa e segura, desde que bem contratada. Comumente, a prepotente desculpa de que cooperativas de trabalho “são sempre fraudulentas” esconde o puro desconhecimento e incapacidade das partes interessadas em saber contratar e fiscalizar de forma adequada essas atividades. O resultado é a adoção de modelos mais caro e mais arriscados.
Ainda assim, o atual modelo de atendimento domiciliar por cooperativas é aquele que tem maior potencial de resposta eficiente ao problema.
· Por congregarem distintos contratantes (famílias, e operadoras), as cooperativas têm maior condição de manter a ocupação destes profissionais, reduzindo - também por esse motivo, mas não somente – a incidência de reclamações trabalhistas;
· As cooperativas adequadas à lei especial gozam de novas presunções legais de inexistência de vínculo de emprego. A lei, ademais, reconhece e declara a natureza jurídica própria do trabalho cooperativista;
· As cooperativas atualmente tendem a remunerar os profissionais a ela associados em patamares superiores a média de mercado ou ao piso da categoria;
· A legislação atual oferece uma séria de parâmetros para a segurança e fiscalização da contratação.
Para tanto, é fundamental a correta contratação, dentro dos parâmetros legais especialmente hoje vigentes para as cooperativas de trabalho, com especial destaque para a observância de requisitos exigidos na Lei Federal n° 12.690/2012.
Naturalmente, devem ser contratadas cooperativas que efetivamente façam a gestão do trabalho e tenham estrutura profissionalizada de atuação; assim como é necessário exigir e contratar conforme os instrumentos legais novos e parâmetros condizentes.
Entre eles, apenas a título de exemplo, exigir o registro da cooperativa na Organização das Cooperativas do Brasil garante à operadora que a cooperativa foi constituída ou adaptada à lei de 2012. Importa contratar cooperativas que tenha atividade delimitada ao serviço de atendimento domiciliar à saúde, ao invés de cooperativas, assegurando a especialização e capacidade de gestão dos serviços. Também é necessário exigir prova de eleição dos coordenadores de equipe, na forma da legislação. Sem isso, presume-se subordinação e fraude. Exigir garantias de que a remuneração desses profissionais será, NO MÍNIMO, proporcional ao piso da categoria; que exista aprovada em assembleia um programa de saúde e segurança do trabalho, que haja programação de férias remuneradas; que os plantões considerados noturnos sejam melhor remunerados que os diurnos, que a cooperativa tenha realizado e cumprido anualmente a pauta da Assembleia Geral Especial, que aborda inúmeros pontos fundamentais para o adequado funcionamento dessas cooperativas.
A fiscalização desses serviços não deve ser feita através de interposição de empresa de "home care", figurando como com contratada da operadora e subcontratante de cooperativa. É possível que a operadora contrate empresa especializada para fiscalizar e acompanhar o cumprimento adequado dessas contratações.
Há uma série de outras práticas, compromissos e garantias que podem e devem ser contratadas e outras que, a despeito de pretenderem segurança e prevenção de responsabilização das contratantes, habitualmente fazem o oposto.
Ronaldo Gaudio: gaudio@gn.adv.br